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15 março 2008

O mistério de "Barravento"



A observar o que está a acontecer a Revoada, de José Umberto, talvez seja preciso reescrever a história do cinema baiano no capítulo concernente às filmagens de Barravento. Pelo que se sabe, Luis Paulino dos Santos, que dirigia o filme na praia de Buraquinho em Salvador, estava a atrasar o cronograma porque, apaixonado por uma bela atriz, deixava-se levar pela sua beleza a insistir em intensos close ups nela. Diante da pachorra do andamento da rodagem, o produtor Rex Schindler interviu, dando a Glauber Rocha a direção de Barravento, aflito que estava o jovem crítico do Jornal da Bahia para estrear no longa metragem (anteriormente tinha feito dois curtas: O pátio e Cruz na Praça). Luis Paulino ficou com fama de negligente e o bom produtor deu um golpe pela integridade do filme baiano. Mas o que realmente aconteceu? Será mesmo que Paulino, pessoa séria, não poderia ter sido consultado no sentido de apressar as filmagens? Foi mesmo preciso o golpe de Rex/Glauber? Interessante uma pesquisa nesse sentido para o esclarecimento da verdade, pois a história é sempre contada pelos vencedores.

Segundo fontes fidedignas, Rex Schindler (que sempre me pareceu pessoa de lhano trato) já montou Revoada à revelia de seu autor, José Umberto, e está pronto para entregar o filme ao Ministério da Cultura.

Realiza-se em Salvador, no foyer do Teatro Castro Alves, ampla exposição do acervo glauberiano, com exibições na Sala do MAM e palestras na Biblioteca Central. Glauber, se vivo, completaria, ano que vem, 70 anos (nasceu em 1939). Como o tempo passa! Mas por que a homenagem neste ano? Não teria sido mais prudente a concentração de esforços para a comemoração quando da passagem das sete décadas glauberianas. Há angu neste caroço?
Na imagem, Glauber conversa com o grande Roberto Rossellini.

4 comentários:

Cassiano Mendes disse...

Rex Schindler é um 'coronel'. Pelo que se diz, desfigurou, com a cumplicidade de Walter Webb, a estética umbertiana em 'Revoada', projeto acalentado por muitos anos e que, quando teve a oportunidade de pô-lo nas imagens em movimento, encontra-se completamente estraçalhado pela montagem marginal. Não se pode dar narratividade a uma obra que se postula por uma estrutura audiovisual que não atende aos postulados do 'in crescendo' griffithiano. Conheci Zé no Colégio de Aplicação. Depois, a vida levou-nos a caminhos diferentes, eu engenheiro de minas, ele, cineasta, crítico, pesquisador, autor de um livro importante do ponto de vista linguístico e documento sociológico, que é, sem dúvida, 'Dadá'. Apesar de distante, acompanho o seu trabalho e agora, neste blog, suas aflições com o destino que estão a dar a seu sonho. Acredito que, mais cedo ou mais tarde, a justiça lhe dará, de volta, o sonho concretizado, com a 'desmontagem' de 'Revoada' e sua construção segundo a concepção de seu autor. Não desista, Zé. Prossiga. Com fé e esperança. Neste mundo globalizado e egoísta, ainda se pode ter alguma esperança, porque se esta é perdida nada nos restará.

Jonga Olivieri disse...

Glauber, quem diria... bom, os mitos desmoronam à medida que se vão revelando fatos da história -- oculta ou exposta -- de cada um.
Mas, não é ele quem está na berlinda, e sim Rex Schindler e a armadilha "escrota"(1) que armou contra o Zé. Como anteriormente já o havia feito com Luis Paulino dos Santos.

(1) desculpe a palavra chula, mas, chulo mesmo é o produtor sem escrúpulos que remonta um filme à revelia de seu diretor.

Juninho disse...

Quanto ao Glauber, claro que a verdade é sempre mais interessante, mas que seja devidamente fundamentada, pois o mesmo já não está entre nós para também parlamentar. Em todo o caso o seu brilho por Terra em Transe, Deus e o Diabo na Terra do Sol e outros não se ofusca com o fato.

O que agora acontece com REVOADA remonta por semelhança a BARRAVENTO, sobretudo pelo envolvimento direto em ambos do REX SCHINDLER, aliás me parece, que há praticamente um hiato na atuação dele com cinema justamente entre estas duas produções. Os dois eventos também indicam um "modus operandi" do Rex. Será?

Mas há peculiaridades, são outros tempos os de REVOADA.

Reza a lenda inclusive que numa época onde não havia subsídio governamental REX vendera bens pessoais para investir em produções como A Grande Feira, Tocaia no Alfalto e o próprio Barravento, o que é admirável, sem dúvida. É uma iniciativa de grande valor. Com Revoada, todavia, há uso do erário, o que aumenta as responsabilidades dos envolvidos e pelo que sei é este o argumento do produtor na questão da edição à revelia do autor.

Não vejo, porém, argumentos que justifiquem a violência que Zé Umberto vem sofrendo. Ora, não estava tudo previsto no edital que foi aprovado pelo MINC? Toda a proposta elaborada pelo Zé Umberto? Não se conseguiu uma equipe de abnegados que aceitaram fazer o trabalho sendo muito “mal” pagos? Não sei os técnicos, mas elenco garanto, aliás, ouvimos lá da produção, do pessoal do Rex, que estavam pagando muito ao elenco para uma produção como REVOADA. A pessoa em questão exemplificou que havia feito um filme com atores renomados do eixo Rio-São Paulo que filmaram sem nada receber. Muito bacana isso. Não sei em quais circunstâncias tal fato se deu, mas ser colocado naquele momento, naquele contexto, me pareceu uma fraqueza muito grande do sujeito. O que queria ele com tal comentário? Constrangimento? Ele até conseguiu isso. Ora, mesmo sendo uma produção de baixo-orçamento, não estava tudo lá previsto? Foi feito um cronograma, uma adequação de custos? Então! Acredito que tudo isso precisa também vir à tona. Me parece que Zé está questionando isso na justiça e, portanto, eu, enquanto cidadão, me sinto no direito de saber. Será mesmo que a proposta de edição que está em curso é apenas uma estratégia financeira para cobrir algum imprevisto? Talvez as contas tenham saído do controlo durante o processo de filmagem, sei que tais coisas acontecem e, até certo ponto, é normal. Tal proposta não pode ser para torná-lo mais comercial, mesmo porque esse, definitivamente, não é o perfil do filme, menos ainda do cineasta que o idealizou. Também acredito que não seja uma discordância entre conceitos estéticos, pois estes não cabem ao produtor julgar. Então o que há?

Por outro lado qualquer cidadão deve ter sua moral preservada até que provas em contrário lhes sejam imputadas.

Rogo ao Rex, pela história que ele tem com nosso cinema, que se manifeste, mas não com ataques, como têm feito outras pessoas ligadas à produção, nem buscando fragilizar a imagem do Zé enquanto profissional, artista e mesmo cidadão, nem dos que partem em sua defesa. Penso que defender Zé nesta questão é defender a liberdade artística. Zé enfrentou dificuldades já durante as gravações. Em que pesem as limitações financeiras de um baixo-orçamento, Zé sofreu certa resistência de membros da equipe, muitos pareciam estar imbuídos do objetivo de fragilizá-lo cada vez mais.

Mariana Paiva disse...

essa história ainda me deixa estarrecida. Mas em relação a Barravento, até onde sei, Luis Paulino ficou mesmo condenado a ser o negligente, enquanto Rex e Glauber, que tomaram a frente do filme, "ficaram para a história" de maneira positiva.

mais do que pensar em "Revoada" e "Barravento", essa é uma boa oportunidade para repensarmos tudo, inclusive o modo como se faz e se entra para a história. Será que estamos condenados a sobreviver através da memória de uns poucos? E se for uma memória que não nos represente? Terá sido justo?

um abraço,

Mariana Paiva