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22 novembro 2011

Quatro palavrinhas

1.) Na foto acima, Marlon Brando e Elizabeth Taylor (a última estrela da constelação de Hollywood) em Os pecados de todos nós (Reflection in a golden eye, 1967), de John Huston, que se baseou em livro de Carlson MacCullers. E uma obra de grande densidade psicológica e dotada de uma mise-en-scène irrepreensível, além de contar com um dos melhores desempenhos de Brando no cinema, que é acompanhado por um cast de primeira ordem: Elizabeth Taylor, carnal, possessa, mulher de têmpera, Brian Keith, Julie Harris (a namorada de James Dean em Vidas amargas, de Elia Kazan), Zorro David etc. Weldon Penderton (Marlon Brando) é um major em decadência. Seus problemas no trabalho influenciam sua vida matrimonial, encontrando-se em crise de identidade. Para piorar sua situação, um recruta está apaixonado por sua esposa Leonora (Elizabeth Taylor) e Brando, por sua vez, está apaixonado por ele. Homossexualismo platônico e tensão bem próxima das torrentes verbais de Tennessee Wiliams, Huston queria que uma matriz dourada tomasse conta de toda a imagem, mas os produtores recusaram e o filme acabou por tomar um banho de technicolor.
2.) O problema de Capitães de areia, de Cecília Amado, é a sua pressa narrativa. As cenas, por rápidas, não se concluem adequadamente. Falta-lhe um sentido do conceito de duração das tomadas, uma das características, aliás, do cinema brasileiro que se quer industrial na atualidade. A fotografia é caprichada, o décor aproveitado como ilustração, mas, também, a realidade dos capitães de areia do livro de Jorge Amado escrito em 1938 era outra completamente diferente. Há, na versão cinematográfica, uma romantização que não se ajusta à realidade atual dos capitães de areia dos dias que correm, viciados em crack e submersos na mais absoluta miséria. E ainda há uma imprecisão na localização do tempo. 
3.) Não vi ainda O jardim das folhas sagradas, de Pola Ribeiro. Mas vou ver amanhã, quarta, para escrever sobre o filme ainda nesta semana aqui no blog e em outros espaços que possuo para destilar os meus comentários. Em se tratando de filme baiano, seja ele qual for, a sua visão é obrigatória. E sexta que vem, dia 25, entra em cartaz Dawson - Ilha 10, de Miguel Littin, que tem, como um dos seus produtores, o baiano José Walter Pinto Lima, organizador e idealizador do Cine Futuro.
4.) Escrevi sobre Nicholas Ray no Terra Magazine. Quem se interessar pode ler o artigo acessando este link

20 novembro 2011

"Estranho acidente" ("Accident"), de Joseph Losey

Um dos melhores filmes (se não o melhor) de Joseph Losey, o fleumático diretor de tantas obras importantes (O criado, Eva, O mensageiro...), Estranho acidente (Accident, 1967) é um filme admiravelmente construído sobre um argumento que, reduzido às suas significações  mais simples, pretende contar a fantasia sexual vivida por dois professores balzaqueanos de Oxford. Sérgio Augusto, quando era um dos melhores críticos de cinema do país, e escrevia no Jornal do Brasil (o melhor jornal de sua época) disse numa exegese que saiu em 20 de junho de 1969: "Tendo como catalizador da fantasia uma jovem austríaca (Jacqueline Sassard), princesa, aluna e fille fatale, Losey, em Accident, procura exibir o vácuo existencial da aristocracia ou até mesmo fazer uma crítica de costumes com uma ligeira impostação de thriller psicológico. Para se gostar de Accident é preciso responder emocionalmente a toda essa pluralidade de intenção, ao enigmatismo (telúrico) de Rosanlind/Vivien Merchant, (abstrato de Francesca/Delphine Seyrig, (medíocre) de Anna/Jacqueline Sassard, , e desvendar nos seus intermitentes pontos de referência (o jardim e a escada do cottage de Stephen/Dirk Bogard, os carrilhões de Oxford, o sapato de Anna pisando o rosto de William/Michael York, uma das vias de acesso à compreensão de uma obra elaborada como um círculo, que se abre e fecha com um acidente invisível, começo e fim de uma nova experiência (ou pesadelo?) na vida do professor Stephen."

A fotografia é de um artista: Gerry Fischer.

"Sol sobre a lama", de Palma Neto/Alex Viany


Publicado originariamente na revista eletrônica TERRA MAGAZINE em 15/11/2011.
João Palma Neto, antigo feirante da Água de Meninos, sindicalista, marinheiro de longo curso, quando vê A grande feira (1961), de Roberto Pires, não gosta da maneira pela qual o filme aborda a questão da gigantesca feira e decide bancar um outro filme como resposta ou réplica. Com o dinheiro de sua poupança (naquela época não há a famigerada captação de recursos), alia-se a Walter Fernandes e Álvaro Queiroz para a produção de Sol sobre a lama. Com eles, funda a Guapira Filmes (Schindler se associa a Iglú, empresa que também faz um cine-jornal, A Bahia na Tela, para poder realizar os filmes da Escola Baiana de Cinema e há o surgimento, nesta época, de outras empresas - mas assunto para outro tópico). Corre o ano de 1962 e a idéia de Palma é que a fita seja colorida, e com recursos mais sofisticados. Escreve a história, baseada em suas experiências (diz-se que o personagem Valente, interpretado por Geraldo D'El Rey é ele próprio), e confia o roteiro ao carioca Alinor Azevedo (que tem a assinatura nos roteiros de alguns excelentes filmes como Assalto ao trem pagador, e Cidade ameaçada, ambos de Roberto Farias, Um ramo para Luísa, de J.B.Tanko, entre outros.) Alinor faz o screenplay de Sol sobre a lama com outro talentoso roteirista, Miguel Torres, que o cinema brasileiro perde, pois morre num desastre automobilístico. Ambicioso, pretensioso, João Palma Neto quer fazer o filme definitivo sobre a Feira de Água de Meninos (que, como numa premonição, é incendiada, um verdadeiro inferno na baixada, em 1964, e seus feirantes se mudam para a Feira de São Joaquim, acanhada, a princípio, embora hoje imensa.). Não vê, Palma Neto, nenhum diretor em Salvador capaz de desenvolver as imagens em movimento pré-visualizadas no roteiro de Alinor e Miguel. Também, neste ano, Roberto Pires está a lançar Tocaia no asfalto, e Glauber Rocha está já no Rio, a lançar o Cinema Novo e a preparar a produção de Deus e o diabo na terra do sol.
Palma chama o conceituado crítico carioca, e também cineasta (Rua sem sol,Agulha no palheiro) mediano, Alex Viany, que é, nos anos 40, correspondente da revista O Cruzeiro em Hollywood. De volta ao Brasil, adere de corpo e alma ao cinema nacional, a fazer filmes e a escrever nas páginas dos jornais. Um crítico, inclusive, chega a taxá-lo de "inimigo número 1 do cinema made in Hollywood", apesar de, nesta meca, ter permanecido por muito tempo a gozar de suas delícias. A maior obra de Alex Viany é, sem dúvida, a sua extenuante pesquisa que se transforma, em 1959, no livro Introdução ao Cinema Brasileiro, editado pelo Instituto Nacional do Livro (várias vezes reeditada, uma delas pela Alhambra). Mas como cineasta, apesar de Rua sem sol e Agulha no palheiroestejam sob a influência do neorrealismo italiano, possuindo um certo pioneirismo na abordagem da problemática social brasileira, é fraco, não sustenta bem uma narrativa. O fiasco total, e canto de cisne desesperado, está, muitos anos depois, em A noiva da cidade, cujo roteiro original é de autoria de Humberto Mauro. O filme, no entanto, um anti-musical, é indefensável.
Palma vê Rua sem sol e Agulha no palheiro e acha que Alex Viany é o realizador ideal para o desenvolvimento imagético de Sol sobre a lama. Quando chega a Salvador, Viany, homem genioso, está fascinado pelo cinema japonês, e tenta, no comando direcional, dar um tom nipônico do ponto de vista cinematográfico à baianidade que se requer de Sol sobre a lama. Realizado em 1963, mas somente lançado (em noite de festa) em novembro de 1964 no cine Guarany, o resultado final, contudo, não agrada Palma. A briga com Viany acaba na Justiça. Assim, há duas versões de Sol sobre a lama. A versão do diretor e a versão do produtor.
O argumento gira em torno da tentativa feita por burgueses gananciosos para acabar com a Feira de Água de Meninos. A complicar a situação, e, com isso, apressar o fim da feira, uma draga fecha o seu ancoradouro, a impedir qualquer abastecimento. Os feirantes, desesperados, lutam pela abertura do ancoradouro para fazer voltar o abastecimento. Dois líderes se apresentam para solucionar o problema. Um açougueiro (Roberto Ferreira/Zé Coió, em grande interpretação) propõe a ação violenta (uma espécie de Chico Diabo de A grande feira) dos feirantes para que invadam, na raça, o ancoradouro, reabrindo-o. Outro líder, no entanto, Valente (Geraldo D'El Rey, Rony, o marinheiro sueco de A grande feira, e o Manoel de Deus e o diabo na terra do sol), que vende material de construção, é a favor de acertos conciliatórios com poderosos políticos e a uma campanha na imprensa local em favor da volta à normalidade. Uma ação, portanto, junto aos poderes constituídos para a resolução do conflito.
Jean-Claude Bernardet, em seu clássico estudo sociológico sobre cinema brasileiro intitulado Brasil em tempo de cinema, ensaio que procura entender a sociedade através de alguns filmes nacionais representativos, dá importância na sua análise a Sol sobre a lama e escreve: "Em vez de malhado superficialmente, o filme deveria ter sido discutido mais abertamente, pois condensa toda uma tática errada, premissas sociológicas falsas e idealistas que caracterizam um longo período da vida da sociedade brasileira. Sol sobre a lama pode ser considerado como um dos mais significativos testemunhos de toda uma política que fracassou."
A fotografia é de Ruy Santos (que dois anos depois viria filmar, em Buraquinho, praia perto de Itapoã, Onde a terra começa, baseado em conto de Máximo Gorki, com Irmã Alvarez). No cast, Othon Bastos, Geraldo D'El Rey, Roberto Ferreira, Dilma Cunha, Milton Gaúcho, Gessy Gesse, Maria Lígia, Alair Liguori, Carlos Lima, Garibaldo Matos, Doris Monteiro (a cantora que trabalha com Viany em Agulha no palheiro e, na certa, chamada por ele), Jurema Penna, Carlos Petrovich, Antonio Pitanga, Tereza Racquel, Glauce Rocha, Lídio Silva. Com música de Pixinguinha e Vinicius de Morais. O teatrólogo João Augusto funciona como diretor da segunda unidade.

O primeiro filme pornô da história do cinema

Observando as estatísticas de meu blog, que já tem mais de 6 anos de existência, a postagem com o maior número de visitas, por incrível que pareça, é esta sobre o primeiro filme pornô da história do cinema. Bate, de longe, todas as outras. Quase trezentos mil (sim, isto mesmo, cem mil) visitas.


Pelo que se tem notícia, trata-se do primeiro filme verdadeiramente pornográfico da história do cinema. Uma raridade, portanto. A data, não a consegui localizar, mas, ao que parece, foi feito na primeira década do século passado.