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13 janeiro 2007

Uma lágrima para Paulo Perdigão

O pessoal da nova geração talvez não tenha ouvido falar de Paulo Perdigão, crítico cinematográfico, ensaísta brilhante, tradutor, que pontificou nas páginas dos jornais e revistas nos anos 60 e 70. Ficou célebre a sua paixão por Shane (Os brutos também amam, 1953), de George Stevens, western clássico, que Perdigão viu quase uma centena de vezes. Chegou, inclusive, a 'entrar' no filme, quando uma montagem em VHS assim possibilitou, proporcionando a Perdigão se ver 'dentro' de Shane. Na segunda metade da década de 60, viajou aos Estados Unidos e realizou um sonho antigo: entrevistar e conversar com o diretor de Shane, George Stevens, cujo resultado saiu nas páginas da desaparecida revista Filme/Cultura, editada pelo INC (Instituto Nacional do Cinema). Stevens, a princípio, não queria falar muito, reservado, diante do jovem jornalista. Mas quando este começou a descrever as mudanças sutis de iluminação no rosto de Brandon De Wilde, Stevens começou a ficar impressionado. Após a entrevista, disse a Perdigão que ele conhecia melhor o filme do que seu proprio realizador. Perdigão trouxe ao Rio um punhado de terra colhida nas locações onde Shane fora filmado, além de pedras, guardando tudo no seu apartamento.
Comecei a ler Paulo Perdigão no Correio da Manhã, quando, neste, pontificava Antonio Moniz Vianna, o crítico severo e suas 'crias', por assim dizer. Perdigão, Sérgio Augusto, Valério Andrade, entre outros, eram 'crias' de Moniz. O termo aqui não está empregado em sentido pejorativo, mas vamos trocá-lo por discípulos. Fica melhor. Perdigão tinha um estilo muito pessoal e era uma enciclopédia ambulante. Foi programador de filmes da Globo e conseguiu introduzir na grade da Vênus Platinada clássicos importantes, ainda que dublados, às quartas. Numa época em que a Globo não passava filme nacional, Perdigão conseguiu a façanha de inserir, numa quarta, O bandido da luz vermelha, de Rogério Sganzerla, uma das obras-primas do cinema nacional.
Conhecia muito filosofia, principalmente Sartre. Sua tradução de O ser e o nada, deste, é primorosa. Entre outros, escreveu Anatomia de uma derrota, sobre a derrota do Brasil na Copa de 1950, que Perdigão, de calças curtas, presenciou das arquibancadas do Maracanã. Foi feito um curta, Barbosa, baseado em seu livro, com direção, se não há engano, de Jorge Furtado. E não se pode deixar de citar o ensaio sobre Shane.
Morreu quando 2006 morria.