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14 março 2009
Um colírio para os olhos
12 março 2009
Obra leoneana ainda assombra pela beleza
Morricone compôs quatro temas fundamentais destinados a cada um dos personagens principais: Claudia Cardinale, Jason Robards, Charles Bronson e Henry Fonda – magnífico no papel de vilão, cínico, cruel, frio, super-maquiado, super-estilizado, capaz de matar até criancinhas com irrepreensível sangue frio. Quando os personagens se cruzam, as partituras também entram em rodízio com um resultado impressionante em se tratando da relação música e imagem. A seqüência inicial, de abertura, é uma obra-prima à parte, que mostra a espera, por três pistoleiros, em uma velha e encardida estação, da chegada do trem. Morricone chegou a compor um tema, mas desistiu e, influenciado por John Cage – para quem todo ruído num concerto é música, fez dos ruídos uma espécie de ‘sinfonia’. Assim, o estalar dos dedos de um dos pistoleiros, a gota d’água que cai modorrenta no chapéu de Woody Strode, a mosca que fica zoando no rosto de Jack Élan, o ranger do moinho, a chegada estrepitosa do trem, etc, formam uma tensão inusitada.
Claudia Cardinale agita a paixão dos homens e, neste filme, encontra-se no auge da beleza. A mulher é aqui objeto do desejo de três homens rudes e sedentos: Henry Fonda, Jason Robards Jr, Charles Bronson. Com a perda do marido, um fazendeiro, em dia de festa, que é assassinato cruelmente pelo bando de Henry Fonda, resta a ela, sozinha, enfrentar uma vida nova, recomeçar de novo. A tomada que apresenta a sua entrada na cidade e que mostra, em grua, a sair da estação, o movimento da cidade, é imensamente bela e impactante. Dá-se no momento em que Claudia sai do trem e entra na cidade, que, movimentada, encontra-se, somente na aparência, indiferente à sua beleza.
Leone tem um sentido de duração que difere da maioria dos cineastas, aproximando-se mais, na utilização do tempo cinematográfico, dos realizadores japoneses. Gosta de alternar extremos ‘close ups’ com planos gerais de grande amplitude, provocando, com isso, um contraste nos códigos perceptivos. Mas, para Leone, o rosto humano não é uma face oculta, mas, e principalmente, também uma paisagem. Seus closes demoram na tela, enchendo-a, para perscrutar a alma humana, para adentrar na interioridade dos seres. Tudo é muito estilizado e rigoroso sem perder, contudo, o caráter de introspecção.
Não resta dúvida que o melhor filme dos anos 80 foi um Leone, e, aliás, o seu derradeiro, que lembra a segunda parte do monumental O poderoso chefão (The godfather, 1974), de Francis Ford Coppola. Mas o que assombra em Era uma vez na América, assim como em Era uma vez no Oeste, é a fascinante, envolvente, ‘mise-em-scène’ leonina.
O argumento de C’era una volta in West/Once upon a time in West foi escrito a seis mãos: as de Bernardo Bertolucci, o consagrado cineasta de O último tango em Paris, as de Dario Argento, diretor ‘cult’ de terroríficos e crítico afamado, e as de Sergio Donati, que ficou responsável pela decupagem, além, é claro, da participação de Leone em todas as fases do processo de criação cinematográfica.
O DVD é especial mesmo e tem muitos extras, inclusive um documentário precioso com depoimentos de Tonino Delli Colli, o fotógrafo, Alex Cox, Gabrielle Ferzetti, Bertolucci, Claudia Cardinale, Henry Fonda, entre outros. Para assistir de joelhos.
10 março 2009
Faits divers
2) Realmente, não compreendo como uma pessoa possa gostar de Quem quer ser um milionário? (Slumdog millionaire), de Danny Boyle, o grande vencedor do Oscar 2009. Mas o filme tem seus defensores acirrados, como Luiz Carlos Merten do Estado de S; Paulo, que chega a dizer que algumas cenas lhe fazem chorar como criancinha. Mas também tem quem lhe jogue as pedras, como o criterioso Inácio Araújo da Folha de S. Paulo, que, por sinal, está de blog novo (http://inacio-a.blog.uol.com.br/). O nome do blog: Cinema de boca em boca.
3) Genialidade, acabei de ver agora em O mocinho encrenqueiro (The errand boy, 1961), de Jerry Lewis, seu segundo filme como autor. O início já é demonstrativo da graça, do non sense e da non chalance, além do aspecto desmistificante: em tomadas aéreas, vê-se os estúdios de Hollywoood, enquanto um locutor, em narrativa em off, vai observando o que se está a ver. Até que aparece o estúdio da Paramuntual (uma alusão clara e evidente à Paramount, produtora do filme) e a câmara baixa de sua altura para mostrar Jerry Lewis a colocar um cartaz imenso com seu nome. As tomadas aéreas são intercaladas de momentos desmistificadores da magia ilusionista do cinema hollywoodiano: um mocinho de farwest, que tem medo de cavalo, está montado numa engenhoca, a pedra imensa, que cai no desfiladeiro, é uma pedra de papelão, a pobre moça que toma várias bofetadas no rosto é, na verdade, um campeão musculoso com a cara cheia de músculos, e o casal apaixonado, nos intervalos da filmagens, por serem marido e mulher, brigam o tempo todo, mas, ao menor sinal, do início da tomada, ficam loucamente apaixonados. A estrutura narrativa de The errand boy, é, assim como a de The bell boy, toda feita em sketches, não havendo, propriamente, uma progressão dramática.
4) Na revisão, vejo agora o monumento que é Monsieur Verdoux, de Charles Chaplin. Que obra-prima!
5) Desabafo de Carlos Reichenbach tirado de seu reduto:
"Devo realmente estar ficando velho...
Hoje, revendo LA LUNA, de Bertolucci, depois de tantos anos, me bateu uma tristeza imensa.
O que está acontecendo com o cinema? Porque não se filma mais com tanta ousadia, dignidade, elegância e beleza?
Perto da "eficiência" rítmica (leia-se, esquizofrênica e vira-lata) de Danny Boyle e a pretensiosa geleira de um Gus Van Sant (esse "artista" nunca me enganou), os mais insignificantes dos travellings operísticos de LA LUNA são petardos nos cornos da mediocridade.
Em clima de afasia, não troco nenhum dos filmes safados de Joe D´Amato filmados na República Dominicana (que, pelo menos, me divertem à valer e despertam tesão) por nenhum dos concorrentes ao Oscar 2008 em cartaz. Certo, o Independent Spirit Awards acabou fazendo justiça ao premiar os dois melhores filmes americanos do ano: O LUTADOR (The Westler) e RIO CONGELADO (Frozen River). Mesmo assim, esses dois bons filmes são obras que ficam aquém da nossa relutante espectativa.
Sei não, rever o cinema dilacerado, mas pulsante e vigoroso, dos anos 60 e 70 faz mal à esperança!"
08 março 2009
Dia Internacional da Mulher
Viva as mulheres!