Seguidores

14 março 2009

Um colírio para os olhos

Sim, é ela mesma: Nicole Kidman, como veio ao mundo, nos planos iniciais de De olhos bem fechados (Eyes Wide Shut, 1999), derradeiro opus de Stanley Kubrick, que, semana passada, completou uma década de desaparecido. Fala-se que morreu dormindo, um enfarte surdo o matou ainda nos braços de Morfeu. O cinema perdeu um grande cineasta. Mas o que importa é contemplar, agora, esta imagem.

12 março 2009

Obra leoneana ainda assombra pela beleza

O DVD de Era uma vez no Oeste, de Sergio Leone, lançamento em edição especial, cheia de extras, que estava, há pouco tempo, no saldão de conhecida loja de departamentos, é, simplesmente, uma beleza. O filme, com o passar do tempo – é de 1968, ficou ainda melhor, não perdendo em nada do seu impacto inicial, quando o vi pela primeira vez na gigantesca tela do cinema Tupy em cópia de 70mm. Ainda que a dimensão da tela doméstica não possua o mesmo poder de envolvimento e êxtase – sim, é a palavra correta em se tratando de uma obra-prima como essa, momento, sem exagero, de rara inspiração em toda a história da arte do filme, vejo Era uma vez no Oeste como se fosse uma sinfonia, como se uma música de imagens. A partitura do maestro Ennio Morricone está tão entrosada no filme que faz parte dele, e, neste caso, poderia dizer que Morricone é uma espécie assim de co-autor da obra da mesma maneira como Michel Legrand o é de Os guarda-chuvas do amor, de Jacques Demy. Morricone, com sua extraordinária musicalidade, exerce, aqui, em ‘Era uma vez no Oeste’, não apenas uma complementação da narrativa, mas uma mise-en-musique. E Leone é um esteta, um mestre absoluto, que sintetiza neste ‘western sui generis’ toda a sua primeira fase constituída de obras que ‘rascunham’ esta belíssima reflexão sobre a estética westerniana num prisma novo e insinuante, apátrida, singular e original. Quem viu Por uns dólares a mais, Por um punhado de dólares e O bom, o mau e o feio – também conhecido por Três homens em conflito – pode testemunhar que estes filmes são uma ‘anunciação’ de ‘Era uma vez no Oeste’. A sua revisão comprova a magnificência de Sergio Leone que, nos anos 80, com seu canto de cisne, Era uma vez na América, traumatizou toda uma década, realizando uma das maiores obras de toda a história do cinema. Pena que a morte prematura – ia fazer 60 anos – o tenha levado embora.

Morricone compôs quatro temas fundamentais destinados a cada um dos personagens principais: Claudia Cardinale, Jason Robards, Charles Bronson e Henry Fonda – magnífico no papel de vilão, cínico, cruel, frio, super-maquiado, super-estilizado, capaz de matar até criancinhas com irrepreensível sangue frio. Quando os personagens se cruzam, as partituras também entram em rodízio com um resultado impressionante em se tratando da relação música e imagem. A seqüência inicial, de abertura, é uma obra-prima à parte, que mostra a espera, por três pistoleiros, em uma velha e encardida estação, da chegada do trem. Morricone chegou a compor um tema, mas desistiu e, influenciado por John Cage – para quem todo ruído num concerto é música, fez dos ruídos uma espécie de ‘sinfonia’. Assim, o estalar dos dedos de um dos pistoleiros, a gota d’água que cai modorrenta no chapéu de Woody Strode, a mosca que fica zoando no rosto de Jack Élan, o ranger do moinho, a chegada estrepitosa do trem, etc, formam uma tensão inusitada.

Claudia Cardinale agita a paixão dos homens e, neste filme, encontra-se no auge da beleza. A mulher é aqui objeto do desejo de três homens rudes e sedentos: Henry Fonda, Jason Robards Jr, Charles Bronson. Com a perda do marido, um fazendeiro, em dia de festa, que é assassinato cruelmente pelo bando de Henry Fonda, resta a ela, sozinha, enfrentar uma vida nova, recomeçar de novo. A tomada que apresenta a sua entrada na cidade e que mostra, em grua, a sair da estação, o movimento da cidade, é imensamente bela e impactante. Dá-se no momento em que Claudia sai do trem e entra na cidade, que, movimentada, encontra-se, somente na aparência, indiferente à sua beleza.

Leone tem um sentido de duração que difere da maioria dos cineastas, aproximando-se mais, na utilização do tempo cinematográfico, dos realizadores japoneses. Gosta de alternar extremos ‘close ups’ com planos gerais de grande amplitude, provocando, com isso, um contraste nos códigos perceptivos. Mas, para Leone, o rosto humano não é uma face oculta, mas, e principalmente, também uma paisagem. Seus closes demoram na tela, enchendo-a, para perscrutar a alma humana, para adentrar na interioridade dos seres. Tudo é muito estilizado e rigoroso sem perder, contudo, o caráter de introspecção.

Não resta dúvida que o melhor filme dos anos 80 foi um Leone, e, aliás, o seu derradeiro, que lembra a segunda parte do monumental O poderoso chefão (The godfather, 1974), de Francis Ford Coppola. Mas o que assombra em Era uma vez na América, assim como em Era uma vez no Oeste, é a fascinante, envolvente, ‘mise-em-scène’ leonina.

O argumento de C’era una volta in West/Once upon a time in West foi escrito a seis mãos: as de Bernardo Bertolucci, o consagrado cineasta de O último tango em Paris, as de Dario Argento, diretor ‘cult’ de terroríficos e crítico afamado, e as de Sergio Donati, que ficou responsável pela decupagem, além, é claro, da participação de Leone em todas as fases do processo de criação cinematográfica.

O DVD é especial mesmo e tem muitos extras, inclusive um documentário precioso com depoimentos de Tonino Delli Colli, o fotógrafo, Alex Cox, Gabrielle Ferzetti, Bertolucci, Claudia Cardinale, Henry Fonda, entre outros. Para assistir de joelhos.
Transcrito da coluna de André Setaro (Tribuna da Bahia).

10 março 2009

Faits divers

1) Morreu Sidney Chaplin, filho de Charles Chaplin e Lita Grey, aos 83 anos (1926/2009), de complicações, parece, devido a um acidente automobilístico. Nunca foi um bom ator ou, melhor, nunca teve boas oportunidades na vida, apesar de ter trabalhado em muitos filmes de terceira classe (westerns-spaghettis, thrillers de espionagem, etc). Sua primeira aparição no cinema foi justamente em Luzes da ribalta (Limilight, 1952), o belíssimo melodrama de Chaplin no no perigeu de sua carreira. Sidney já tinha trinta e tantos anos e faz o namorado de Claire Bloom. Mas segundo o que conta Marlon Brando em sua autobiografia, Charles Chaplin era muito autoritário com o filho. Brando sabe do relacionamento dos Chaplins, pai e filho, porque Sidney também trabalhou em A condessa de Hong Kong e presenciou cenas dramáticas entre o velho Carlitos e seu primogênito. Sidney deve ter tido algum trauma devido à autoridade paterna e nunca, por causa disso, teve chances de se revelar um bom intérprete. Mas não dispensava trabalhos como em Se incontri Sartana prega per la tua morte (1968), de Gianfranco Parolini, com Klaus Kinsky, Troppo per vivere... poco per morire, 1967, de Michele Lupo, com Daniella Bianchi, Tem uma filmografia bem extensa como ator de seriados de tv americanos. Uma vez, nos idos dos 70, Sidney esteve no Rio de Janeiro, muito simpático, muito agradável, e deu, na ocasião, uma divertida entrevista a O Pasquim.

2) Realmente, não compreendo como uma pessoa possa gostar de Quem quer ser um milionário? (Slumdog millionaire), de Danny Boyle, o grande vencedor do Oscar 2009. Mas o filme tem seus defensores acirrados, como Luiz Carlos Merten do Estado de S; Paulo, que chega a dizer que algumas cenas lhe fazem chorar como criancinha. Mas também tem quem lhe jogue as pedras, como o criterioso Inácio Araújo da Folha de S. Paulo, que, por sinal, está de blog novo (http://inacio-a.blog.uol.com.br/). O nome do blog: Cinema de boca em boca.

3) Genialidade, acabei de ver agora em O mocinho encrenqueiro (The errand boy, 1961), de Jerry Lewis, seu segundo filme como autor. O início já é demonstrativo da graça, do non sense e da non chalance, além do aspecto desmistificante: em tomadas aéreas, vê-se os estúdios de Hollywoood, enquanto um locutor, em narrativa em off, vai observando o que se está a ver. Até que aparece o estúdio da Paramuntual (uma alusão clara e evidente à Paramount, produtora do filme) e a câmara baixa de sua altura para mostrar Jerry Lewis a colocar um cartaz imenso com seu nome. As tomadas aéreas são intercaladas de momentos desmistificadores da magia ilusionista do cinema hollywoodiano: um mocinho de farwest, que tem medo de cavalo, está montado numa engenhoca, a pedra imensa, que cai no desfiladeiro, é uma pedra de papelão, a pobre moça que toma várias bofetadas no rosto é, na verdade, um campeão musculoso com a cara cheia de músculos, e o casal apaixonado, nos intervalos da filmagens, por serem marido e mulher, brigam o tempo todo, mas, ao menor sinal, do início da tomada, ficam loucamente apaixonados. A estrutura narrativa de The errand boy, é, assim como a de The bell boy, toda feita em sketches, não havendo, propriamente, uma progressão dramática.

4) Na revisão, vejo agora o monumento que é Monsieur Verdoux, de Charles Chaplin. Que obra-prima!

5) Desabafo de Carlos Reichenbach tirado de seu reduto:

"Devo realmente estar ficando velho...
Hoje, revendo LA LUNA, de Bertolucci, depois de tantos anos, me bateu uma tristeza imensa.
O que está acontecendo com o cinema? Porque não se filma mais com tanta ousadia, dignidade, elegância e beleza?
Perto da "eficiência" rítmica (leia-se, esquizofrênica e vira-lata) de Danny Boyle e a pretensiosa geleira de um Gus Van Sant (esse "artista" nunca me enganou), os mais insignificantes dos travellings operísticos de LA LUNA são petardos nos cornos da mediocridade.
Em clima de afasia, não troco nenhum dos filmes safados de Joe D´Amato filmados na República Dominicana (que, pelo menos, me divertem à valer e despertam tesão) por nenhum dos concorrentes ao Oscar 2008 em cartaz. Certo, o Independent Spirit Awards acabou fazendo justiça ao premiar os dois melhores filmes americanos do ano: O LUTADOR (The Westler) e RIO CONGELADO (Frozen River). Mesmo assim, esses dois bons filmes são obras que ficam aquém da nossa relutante espectativa.
Sei não, rever o cinema dilacerado, mas pulsante e vigoroso, dos anos 60 e 70 faz mal à esperança!"

08 março 2009

Dia Internacional da Mulher

Hoje, domingo, 8 de março, Dia Internacional da Mulher. O blog presta uma homenagem através da imagem de Marilyn Monroe. A luta pelos direitos da mulher tem se afirmado cada vez mais e elas estão a conquistar direitos antes reservados somente aos homens. Talvez Marylin não seja a mais indicada para se fazer uma homenagem, e mais correto seria a colocação de uma foto de uma feminista militante. Sou a favor da luta que as mulheres promoveram através das últimas décadas. Um absurdo, por exemplo, que a mulher, pelo mesmo trabalho executado, ganhe menos do que os homens. O poder de sedução da mulher é imenso e, segundo Thomas Hardy, em Judas, o obscuro, elas são capazes de destruir os homens. O que, de certa forma, também acha Somerset Maugham em Servidão humana (Of human bondage). Um amigo sempre me dizia que, apesar de apreciar as mulheres bonitas e sensuais, somente casaria com uma feia. E foi o que aconteceu. Sua esposa é um mandú desgraçado. Ciúmes, ciúmes. Há um filme de Claude Chabrol que retrata bem a paranóia do ciúme. Jece Valadão, machista convicto, dizia que as mulheres estavam no mundo para atender aos homens e somente poderiam obedecê-los nas três clássicas perguntas: "Venha cá!", "Meu almoço está na mesa?", "Venha logo se deitar!". Um absurdo, mas, também, uma brincadeira. O fato é que sem as mulheres os homens seriam mais infelizes.

Viva as mulheres!