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31 janeiro 2013

Downton Abbey

Deslumbrados ficamos, quando, ao vermos filmes ingleses, constatamos a beleza e a imensidão das dezenas e dezenas de castelos que existem no Reino Unido. São universos à parte do mundo real, segundo a nossa impressão. Filmes como Razão e sensibilidade, de Ang Lee, Desejo e reparação e Orgulho e preconceito, de Joe Wright, entre tantos outros, foram filmados em castelos autênticos. Mas para um maravilhamento castelar o mais indicado é a série inglesa Downton Abbey, cujas informações, copiadas da Wikipédia, publico abaixo:

"Downton Abbey é uma série de televisão britânica produzida pela companhia Carnival Films para o canal ITV. A série se passa em sua maior parte em uma propriedade fictícia, localizada em Yorkshire, chamada Downton Abbey e segue os Crawley, uma família aristocrática inglesa, e os seus criados, no início do século XX, a partir de 1912. Ela foi criada por Julian Fellowes, também seu principal escritor, e estreou em 26 de setembro de 2010. Em Portugal, passou a ser exibida em 10 de outubro de 2011 no canal Fox Life e na SIC em 25 de fevereiro de 2012, e começou a ser exibida no Brasil pelo Globosat HD em maio de 2012 com última exibição em 14 de julho de 2012.
A recepção ao programa tem sido predominantemente positiva; a audiência é considerada alta para uma série de época e recebeu diversos prêmios e indicações desde a sua primeira temporada. Tornou-se a série de época britânica de maior sucesso desde Brideshead Revisited, de 1981, e entrou no Livro Guinness dos Recordes de 2011 como o "programa de televisão em língua inglesa mais aclamado pela crítica" do ano, no qual também recebeu o título de melhor minissérie no Emmy. No ano seguinte, venceu na categoria melhor minissérie ou filme para televisão no Globo de Ouro.
A segunda temporada de Downton Abbey estreou no outono britânico de 2011 no ITV. Em novembro do mesmo ano, o canal confirmou que uma terceira temporada seria produzida, prevista para estrear no segundo semestre de 2012.
Para ver mais castelos maravilhosos, clique aqui: 

30 janeiro 2013

Da linguagem cinematográfica

A oportunista vidente Blanche Tyler (Barbara Harris) pisca para o espectador no derradeiro plano do mestre Hitchcock, que viria morrer  quatro anos depois: Trama macabra (Family plot, 1976).

A maioria das pessoas que vai ao cinema recebe uma avalanche de imagens e não se encontra apta a identificá-la enquanto uma linguagem. O que interessa, apenas, é a história, a intriga, o desdobramento das situações - aquilo que se chama de fábula. Assim, o espectador comum não percebe que o filme tem uma narrativa e é esta que, por assim dizer, puxa a fábula - isto é: a história. Por narrativa se entende a maneira pela qual o realizador cinematográfico manipula os elementos da linguagem fílmica. Ou seja: o conjunto das modalidades de língua e de estilo que caracterizam o discurso cinematográfico.

O que precisa ficar bem entendido é o seguinte: o que merece crédito na obra cinematográfica não é o que se "diz" no filme, mas, sim, "como"o filme diz. E este se expressa por meio de sua linguagem específica, assim como na literatura o escritor se expressa por um conjunto de palavras que formam frases, orações e períodos. A expressão daquele que escreve se dá através da sintaxe. E o cinema também tem uma sintaxe que se cristaliza pelo relacionamento dos planos, das cenas, das sequências. Assim, os elementos básicos da linguagem cinematográfica, os chamados elementos determinantes, podem ser assim considerados: a planificação (os diversos tipos de planos - geral, de conjunto, americano, médio, close up...), os movimentos de câmera (travelling, panorâmica, na mão...) e a angulação (plongée, contre-plongée...). E a montagem, existindo também os elementos componentes, mas não determinantes (fotografia, intérpretes, cenografia...).
É necessário, para uma melhor compreensão de um filme, aprender a reconhecer a linguagem do cinema e a captar qualquer mínima manifestação sua. Importa mais estar atento ao comportamento que a câmera adota em relação a determinado personagem do que seguir o seu comportamento na tela. É mais importante a verificação dos sinais efetuados pela câmera referente ao personagem do que tentar entender o que este está a fazer no desenvolvimento da história. A câmera dificilmente renuncia a uma opinião sua, mesmo quando parece estar silenciosa e perfeitamente alheada. Os modos que dispõe para "qualificar" a realidade são múltiplos e nem sempre imediatamente compreensíveis.
Outro exemplo está em Frenesi (Frenzy, 1972), penúltimo filme de Alfred Hitchcock, um cineasta inventor de fórmulas, um artista da mise-en-scène, cujos significados muitas vezes emergem do comportamento da câmera e, por extensão, do uso que faz da linguagem cinematográfica. Assim, em Frenzy, o movimento aparentemente vagabundo da câmera tem a função de indicar a atitude moral assumida pelo autor - no caso o mestre Hitch - relativamente à matéria tratada. Numa cena dessa obra exponencial, uma mulher (Anna Massey, a namorada do falso culpado Jon Finch) é assassinada em seu apartamento pelo hóspede (Barry Foster, o estrangulador que o espectador já conhece) ocasional que ela própria convidara confiando na sua extrema simpatia.
A câmera acompanha os dois quando se dirigem ao prédio onde ela mora - o público já pressente o pior, pois ciente de que o homem é um assassino perigoso, mas, entrando neste, a máquina de filmar abandona os dois "à sua própria sorte", pois começa a recuar lentamente, sai do edifício e se detém apenas quando o exterior deste fica enquadrado num plano geral. Todo o movimento se procede através de um movimento de câmera chamado travelling, a princípio "para frente" e, quando do recuo, "para trás". O grito da pobre moça é abafado pelos ruídos do bairro popular onde se localiza uma feira muito barulhenta. Que outra coisa pretende dizer Hitchcock com este travelling em derrière se não que o Mal está entre nós e que opera das maneiras mais insuspeitas? Trata-se, na verdade, de um caso em que a "metafísica" do autor recorre, para se manifestar, à "física" de uma óbvia escolha estilística.
Hitchcock procura também, com seu humor negro, "brincar" com o espectador, que sabe ser um sado-masoquista e adoraria, no caso, presenciar o estrangulamento da mulher pelo perverso homicida. A significação, por conseguinte, se faz pela linguagem, pelo "comportamento" da câmera em relação ao personagem. Se neste exemplo, a significação decorre de um movimento de câmera, em outro, desse mesmo filme, ela advém pela montagem na seqüência na qual o estrangulador procura, dentre muitos sacos cheios de batatas, aquele no qual se encontra o cadáver da mulher que matara no apartamento a fim de lhe tirar um broche de suas mãos, as quais, no momento da agonia, agarram o objeto. A manipulação de Hitch é tal que o espectador torce para que o brutal homicida encontre, tal a sua aflição - e a aflição provocada pela montagem, pela 'mise-en-scène', o broche que o denunciaria como criminoso.
Em O Açougueiro (Le Boucher, 1969), de Claude Chabrol - um discípulo de Hitchcock e autor, com Eric Rohmer, de um livro importante sobre o diretor de Vertigo -,há uma cena na qual o protagonista - um carniceiro que se sabe torturado pela mania homicida - confessa o seu afeto à ignara professora da aldeia - ele é Jean Yanne, ela, Stéphane Audran, naquela época companheira do diretor. A declaração tem lugar num bosque onde os dois se deslocaram para colher cogumelos. A atmosfera seria das mais tranquilizantes, não fora passar-se - durante o colóquio entre ambos - algo que não pode deixar de alarmar o espectador atento. E esse algo não se refere ao comportamento das personagens - que continuam a dialogar num cenário idílico - mas, precisamente, ao comportamento da câmera. Esta última, quase inadvertidamente, começa a deslocar-se lateralmente até o primeiro plano de um tronco de árvore se interpor entre ela - a câmera - e o par, escondendo o homem cujas palavras, contudo, continua-se a ouvir. A vista é desimpedida com a saída do tronco do campo da visão, mas pouco depois desaparece novamente quando o movimento se repete em sentido contrário, conduzindo a câmera à posição inicial. Eis um caso em que um simples travelling se encarrega de denunciar ao espectador a atitude reticente da personagem, 'encobrindo-a' da vista no momento em que 'se revela' ao ouvido. Denúncia essa dirigida ao público e não, infelizmente, à desventurada professora, que se manterá por um bom pedaço na ignorância das verdadeiras intenções do carniceiro degolador.

27 janeiro 2013

Da saudosa Geração Paissandu

Jean-Pierre Léaud em A Chinesa (1968), de Jean-Luc Godard, um dos grandes sucessos dos tempos do saudoso cine Paissandú.

Há alguns anos o fechamento do cinema Paissandu, no Rio de Janeiro, situado à rua Senador Vergueiro, no Flamengo, não registra apenas o fim de uma sala exibidora, mas há uma significação maior e mais abrangente como se, sinal dos tempos, pontuasse o fim de toda uma geração de cinéfilos. Aliás, a afluência verificada, principalmente nos anos 60, a esta casa de espetáculos, determinou a denominação de Geração Paissandu, tal o seu significado, a sua importância.

Apesar de soteropolitano, na segunda metade da década de 60 ia ao Rio (onde nasci em 1950), para passar uma temporada de um mês, duas vezes por ano e freqüentei, com bastante assiduidade, o cine Paissandu. Nesta sala, vi os principais filmes de Jean-Luc Godard, entre outros notáveis da Nouvelle Vague, a exemplo de François Truffaut, Claude Chabrol, Jacques Rivette (lembro-me da excitação quando do lançamento de A religiosa/La religieuse, baseado em Diderot, e dirigido por Jacques Rivette, com a musa de Godard, Anna Karina, filme que tinha sido proibido na França pelo ministro da Cultura André Malraux), Eric Rohmer, e os menos nouvellevaguistas como Alain Resnais (a cada filme deste, um acontecimento, um evento cultural, uma celebração ao cinema), Louis Malle, et caterva. Mas não somente o cinema francês. Tudo de bom e genial que se fazia (e não se faz mais) no cinema era apresentado na tela do Paissandu. Os filmes da incomunicabilidade de Ingmar Bergman, o cinema pausado de Michelangelo Antonioni, a estética viscontiana, a alegria circense das criaturas fellinianas, etc, etc, e etc.

Apenas quem viveu aquela época pôde sentir a efervescência de um período no qual a inteligência e o conhecimento davam as rédeas àquele que, por acaso, quisesse estar in com a vida e as circunstâncias. Ainda que alguns "pongassem" na alegria da descoberta, a dar um ar festivo à Geração Paissandu, o fato é que havia, nela, uma necessidade de conhecimento, de desbravar a arte em função não somente da celebração desta mas, e principalmente, de suas potencialidades de transformar o mundo.

A Geração Paissandu lia muito, e não somente jornais e revistas, mas livros (György Lukács, Marcuse, obras sobre a concepção dialética da história, marxismo...). O Jornal do Brasil e o Correio da Manhã pontuavam a orientação das discussões. Tanto em um quanto em outro, havia verdadeiros críticos de cinema que faziam análises copiosas e substantivas dos filmes apresentados. No Correio da Manhã, a crítica era liderada por Antonio Moniz Vianna, mordaz e irônico, que não gostava de Godard e, por isso mesmo, não era muito considerado pela Geração Paissandu. No Jornal do Brasil, Ely Azeredo e o seu antípoda: José Carlos Avellar, cada um à sua maneira, sérios e competentes. Mas também havia, toda sexta, no Jornal do Brasil, um Conselho de Cinema, que, página inteira, dava as cotações em estrelinhas (da bola preta às cinco estrelas) das películas em cartaz. Um filme era destacado, neste dia, para ser analisado pelos dez membros do conselho.

No lançamento de O dragão da maldade contra o santo guerreiro, em 1969, Ely Azeredo deu uma rotunda bola preta em contraste com as quatro e cinco estrelas de todos os demais. Havia muitos exegetas cinematográficos em atividade na imprensa e se corre o risco, assim de memória, de omissões importantes: Fernando Ferreira, Miguel Pereira (em O Globo), Sérgio Augusto, Paulo Perdigão, Ironildes Rodrigues, Alex Viany, Miriam Alencar, Salvyano Cavalcantti de Paiva, Valério Andrade, Maurício Gomes Leite, Alberto Shatovsky, Van Jaffa, Ronald F. Monteiro, Ruy Castro, José Lino Grünewald, Marcos Ribas de Farias, entre muitos outros.

Havia os godardianos (Maurício Gomes Leite, Sérgio Augusto, José Lino Grünewald...) e os que, por anti-godardianos (Moniz Viana, Valério Andrade...), não davam muita "bola" para a Geração Paissandu. O fato, inconteste, é que esta pontuou uma época, e o cinema Paissandu formou platéia e criou uma geração.

Mas se a Geração Paissandu se preocupava muito com a transformação do mundo pela evolução do cinema, por outro lado, havia um background cultural que enriquecia as análises dos filmes. Estes, porém, também eram vistos em sua singularidade específica, como estruturas audiovisuais. Assim, era corrente se ver discussões sobre um determinado travelling de Jean-Luc Godard ou uma panorâmica de 360 graus de certa ousadia na estrutura narrativa.

Nas calçadas do cinema, instalaram-se barzinhos e pizzarias e fazia parte do programa a "esticada" madrugada adentro nas discussões e nos chopps bem tirados (como só se toma no Rio de Janeiro). A intelectualidade da época tinha na boemia uma simbiose que com o bater-papo. Enunciavam-se pensamentos nas mesas dos bares e havia, nelas, uma interlocução de idéias (interlocução que parece desaparecida com os monossílabos dos orkuts e dos msns, nos quais o que menos existe é o enunciado de algum pensamento ou alguma idéia).

Houve algum Paissandu soteropolitano? De certa forma, sim, aos sábados pela manhã, quando o Clube de Cinema da Bahia fazia suas sessões semanais no cinema Guarany ao fim das quais os seus freqüentadores habituais iam tomar cervejas no célebre Restaurante Cacique, que ficava, assim como a sala exibidora, na Praça Castro Alves, bem perto do vespertino A Tarde.