Jorge Alfredo, o cineasta do premiado Samba Riachão, entrevista, aqui, outro colega, e também baiano, José Araripe Jr, o realizador de Esses moços, que ainda continua em cartaz no circuito.
- Como se faz para furar o cerco dos americanos e colocar um filme de baixo orçamento no circuitão?
Felizmente ainda existem distribuidores e exibidores preocupados com esse segmento. Mas furar esse cerco pode não significar nada. O que faz um filme brasileiro ser notado é o volume de publicidade investido nele. E isso também pode significar nada. Pois outros fatores são pré-requisitos ferozes: leia-se o mix de valores agregados: atores famosos, efeitos, sexo, violência...
E mesmo assim um filme pode naufragar, se o diretor for um desconhecido ou não agradar a crítica. Em meio a tantos lançamentos festejados é praticamente impossível obter espaço na mídia espontânea. De todos os filmes em cartaz no Brasil hoje, Esses Moços é o filme mais atípico. Nossa qualidade está em sermos diferentes e nesse quadro, só o boca a boca pode fazer o filme ter mais audiência.
- Existe espaço para a critica séria e inteligente no jornalismo brasileiro?
Sim, claro, mas cada vez menos. Infelizmente os formadores de opinião do jornalismo diário, podem condenar um filme à morte antes de sua primeira sessão. Você já observou que já na madrugada de sexta, antes da primeira sessão do filme, é possível ler as sentenças que reduzem um filme à cinzas? Essa é a mesma critica que adora dizer amém aos modismos de hollywood, esses fazem tanto mal ao cinema brasileiro quanto o monopólio dos Blockbusters.
- Esses Moços é uma vítima disso e você estava preparado para receber críticas?
Sim. Independente de falarem bem ou mal, que importa é que a crítica seja uma análise da obra, com alguma coerência ou método. Pois mesmo quando apontam lacunas, falhas e insatisfação demonstram sensibilidade e acuidade, e, naturalmente, é possível enxergar alguma inteligência por trás do teclado.
- Você se refere a que tipo de leitura crítica?
A crise de identidade da crítica se manifesta antes de tudo no gênero. Hoje se mistura tudo: artigo, reportagem, resenha, colunismo social, opinião, resenha... As mais preguiçosas ou preconceituosas normalmente não se sustentam, na maioria das vezes são conotadas por fatores extra fruição. O complicado é que esses escribas ganham autoridade num espaço de comunicação de massa e abusam do poder.
- E que mais lhe irritou na postura da crítica em relação a Esses Moços?
Na estréia do filme no festival do Recife, as mais de duas mil pessoas que lá estavam receberam o filme com muito carinho, interagindo e aplaudindo o filme em cena aberta diversas vezes. Mas, as matérias que se referiram a participação no festival, simplesmente omitiram esse fato. Por acasião do lançamento um mês atrás, fomos vítimas da superficialidade dos resenhistas de Folha, Reuters
e Veja. Criticas preguiçosas que induziam o espectador a não ver o filme. E o papel da crítica não é esse.
- Mas, como você fala, me parece que o filme, realmente não agradou à crítica?
Tivemos algumas críticas ruins, outras boas, onde há leituras que conseguem perceber o filme com sensibilidade, e apontam as qualidades da obra sem benevolência, e os defeitos, sem arrogância.
Por outro lado recebemos dezenas de depoimentos espontâneos via e-mail, ou blogs, de cinéfilos, cineastas e espectadores. Algumas dessas leituras se colocadas lado a lado com as opiniões que menosprezam o filme, no faz refletir de como há um divorcio real entre o olhar leviano da mídia ligeira e o olhar do espectador que apenas sente o que um filme denota.
- No panorama atual, onde predomina o realismo e o documentário social e biográfico, há espaço para um cinema de fábula como o seu?
Quem conhece meus filmes anteriores sabe que sou um fabulador. Meu cinema está mais para o primeiro cinema, para o teatro de variedades. É cinema, mas não é obcecado pela recriação da realidade. Nele há espaço pro cinema mudo, pro circo, pro teatro e para a poesia principalmente. E o que parece ingênuo é planejado. Isso incomoda quem está acostumado a tudo redondinho. E a carga de despojamento e lirismo que os personagens carregam ao mesmo tempo, não costuma freqüentar o realismo de cartilha.
- Para esse tipo de filme não faz falta um outro circuito?
É infelizmente falta. As salas de cinema no Brasil estão virando um gueto de elites. E não apenas da elite que pode pagar. Mas de uma elite de jovens, que desde a infnacia já alugaram o espaço de seus imaginários ao modelo de cinema serial, calcado apenas na velocidade, no superlativo e na pirotecnia. São dois tipos de cinema em conflito: o dominante dos super heróis e um outro: o cinema dos homens comuns. Para esses comuns sobram apenas 20% das salas, onde ainda é possível ver um tipo de cinema de qualidade, mas aí a concorrência é grande também, e a tendência é também o estrangeiro dominar o segmento. O cinema é uma indústria rica, e dedicada a quem tem poder aquisitivo. Faltam circuitos que deveriam levar a 80% da população, cinema com preços populares. Mas só a televisão e leis mais rígidas podem defender o produto brasileiro dessa lavagem cerebral, que é avassaladora. Essa dominação absoluta dos lançamentos estrangeiros, está apontando para se repensar não apenas as leis, mas o papel do jornalismo, que tem usar seu poder para ajudar a deter esse monopólio.
- O que você faria diferente na hora de lançar um filme?
Creio que temos um mercado ocupado e com alguns vícios recorrentes, que todos nós temos que enfrentar quando lançamos um filme. Há os lançamentos de nomes consagrados e há os filmes mais populares, na atualidade quase sempre ligados às majors e a Globo Filmes, que conseguem ser lançados com um bom número de cópias e uma boa divulgação, mas, em contrapartida, sofrem na sua grande maioria também, séria discriminação.
- Os festivais ajudam a carreira de um filme?
Os festivais, sejam eles nacionais ou internacionais, dão prestígio a um determinado tipo de filme e a crítica, em geral, se sente à vontade para recomendar esses filmes. Esses Moços é um exemplo de filme que não tem muito "o perfil para ganhar festival", é popular, e a crítica não sabe se comportar diante de um filme assim. Os festivais no exterior se tornam mais importantes ainda. Mas, é algo difícil para um filme fora do eixo, pois depende de ligações que exigem maior poder de fogo das produtoras. É claro que o filme independente brasileiro que consegue isso, imediatamente é recebido em seu país com outros olhares. Coisa de uma colonização arraigada, que sagra o filme pobre Iraniano e argentino, como cult e criativo, mas esnoba o igualmente criativo cinema brasileiro de baixo orçamento.
- Diante de uma ocupação abusiva dos blockbusters, que chega a um percentual inacreditável de 80% com apenas 3 filmes, está havendo uma reação das associações cinematográficas e de parte da crítica. É a Tela em Transe. O que pensa um cineasta que está lançando seu primeiro longa no circuito com um número ínfimo de cópias?
Só um mobilização ampla pode melhorar esse quadro.É fundamental também que se ocupe anualmente a mídia de massa – principalmente a TV, com campanhas institucionais trimestrais patrocinadas pela estatais, onde possa se juntar as belas imagens de nossos filmes para incentivar e estimular e incentivar o grande público a conhecer os muitos brasis, nosso talentos e nossas historias. Alem disso ampliar a cota de tela, taxar cópia a cópia, criar a cota de trailler e garantir espaço para o merschandesing nos foyers das salas.
- Em 2001, o cinema brasileiro levou um número considerável de público às salas de cinema como há muitos anos não vinha acontecendo. O que houve de lá pra cá, que não conseguimos manter esse avanço? Houve uma contra reação?
Principalmente falta de estratégia de comunicação. Os filmes estão sendo lançados sem apoio de pesquisas para definir a linha de criação da comunicação, e seus verdadeiros públicos alvos. Por outro lado está cansando essa formula do filme TV. Só campanhas cooperadas que reúnam os sem propaganda podem ampliar o posicionamento do cinema brasileiro na mente do espectador. O resto é recrudescer contra o abuso desse quase monopólio. Trabalho de formiguinha, onde nossos heróis desdentados devem agir com inteligência para enfrentar os superpoderosos da américa do norte.
Felizmente ainda existem distribuidores e exibidores preocupados com esse segmento. Mas furar esse cerco pode não significar nada. O que faz um filme brasileiro ser notado é o volume de publicidade investido nele. E isso também pode significar nada. Pois outros fatores são pré-requisitos ferozes: leia-se o mix de valores agregados: atores famosos, efeitos, sexo, violência...
E mesmo assim um filme pode naufragar, se o diretor for um desconhecido ou não agradar a crítica. Em meio a tantos lançamentos festejados é praticamente impossível obter espaço na mídia espontânea. De todos os filmes em cartaz no Brasil hoje, Esses Moços é o filme mais atípico. Nossa qualidade está em sermos diferentes e nesse quadro, só o boca a boca pode fazer o filme ter mais audiência.
- Existe espaço para a critica séria e inteligente no jornalismo brasileiro?
Sim, claro, mas cada vez menos. Infelizmente os formadores de opinião do jornalismo diário, podem condenar um filme à morte antes de sua primeira sessão. Você já observou que já na madrugada de sexta, antes da primeira sessão do filme, é possível ler as sentenças que reduzem um filme à cinzas? Essa é a mesma critica que adora dizer amém aos modismos de hollywood, esses fazem tanto mal ao cinema brasileiro quanto o monopólio dos Blockbusters.
- Esses Moços é uma vítima disso e você estava preparado para receber críticas?
Sim. Independente de falarem bem ou mal, que importa é que a crítica seja uma análise da obra, com alguma coerência ou método. Pois mesmo quando apontam lacunas, falhas e insatisfação demonstram sensibilidade e acuidade, e, naturalmente, é possível enxergar alguma inteligência por trás do teclado.
- Você se refere a que tipo de leitura crítica?
A crise de identidade da crítica se manifesta antes de tudo no gênero. Hoje se mistura tudo: artigo, reportagem, resenha, colunismo social, opinião, resenha... As mais preguiçosas ou preconceituosas normalmente não se sustentam, na maioria das vezes são conotadas por fatores extra fruição. O complicado é que esses escribas ganham autoridade num espaço de comunicação de massa e abusam do poder.
- E que mais lhe irritou na postura da crítica em relação a Esses Moços?
Na estréia do filme no festival do Recife, as mais de duas mil pessoas que lá estavam receberam o filme com muito carinho, interagindo e aplaudindo o filme em cena aberta diversas vezes. Mas, as matérias que se referiram a participação no festival, simplesmente omitiram esse fato. Por acasião do lançamento um mês atrás, fomos vítimas da superficialidade dos resenhistas de Folha, Reuters
e Veja. Criticas preguiçosas que induziam o espectador a não ver o filme. E o papel da crítica não é esse.
- Mas, como você fala, me parece que o filme, realmente não agradou à crítica?
Tivemos algumas críticas ruins, outras boas, onde há leituras que conseguem perceber o filme com sensibilidade, e apontam as qualidades da obra sem benevolência, e os defeitos, sem arrogância.
Por outro lado recebemos dezenas de depoimentos espontâneos via e-mail, ou blogs, de cinéfilos, cineastas e espectadores. Algumas dessas leituras se colocadas lado a lado com as opiniões que menosprezam o filme, no faz refletir de como há um divorcio real entre o olhar leviano da mídia ligeira e o olhar do espectador que apenas sente o que um filme denota.
- No panorama atual, onde predomina o realismo e o documentário social e biográfico, há espaço para um cinema de fábula como o seu?
Quem conhece meus filmes anteriores sabe que sou um fabulador. Meu cinema está mais para o primeiro cinema, para o teatro de variedades. É cinema, mas não é obcecado pela recriação da realidade. Nele há espaço pro cinema mudo, pro circo, pro teatro e para a poesia principalmente. E o que parece ingênuo é planejado. Isso incomoda quem está acostumado a tudo redondinho. E a carga de despojamento e lirismo que os personagens carregam ao mesmo tempo, não costuma freqüentar o realismo de cartilha.
- Para esse tipo de filme não faz falta um outro circuito?
É infelizmente falta. As salas de cinema no Brasil estão virando um gueto de elites. E não apenas da elite que pode pagar. Mas de uma elite de jovens, que desde a infnacia já alugaram o espaço de seus imaginários ao modelo de cinema serial, calcado apenas na velocidade, no superlativo e na pirotecnia. São dois tipos de cinema em conflito: o dominante dos super heróis e um outro: o cinema dos homens comuns. Para esses comuns sobram apenas 20% das salas, onde ainda é possível ver um tipo de cinema de qualidade, mas aí a concorrência é grande também, e a tendência é também o estrangeiro dominar o segmento. O cinema é uma indústria rica, e dedicada a quem tem poder aquisitivo. Faltam circuitos que deveriam levar a 80% da população, cinema com preços populares. Mas só a televisão e leis mais rígidas podem defender o produto brasileiro dessa lavagem cerebral, que é avassaladora. Essa dominação absoluta dos lançamentos estrangeiros, está apontando para se repensar não apenas as leis, mas o papel do jornalismo, que tem usar seu poder para ajudar a deter esse monopólio.
- O que você faria diferente na hora de lançar um filme?
Creio que temos um mercado ocupado e com alguns vícios recorrentes, que todos nós temos que enfrentar quando lançamos um filme. Há os lançamentos de nomes consagrados e há os filmes mais populares, na atualidade quase sempre ligados às majors e a Globo Filmes, que conseguem ser lançados com um bom número de cópias e uma boa divulgação, mas, em contrapartida, sofrem na sua grande maioria também, séria discriminação.
- Os festivais ajudam a carreira de um filme?
Os festivais, sejam eles nacionais ou internacionais, dão prestígio a um determinado tipo de filme e a crítica, em geral, se sente à vontade para recomendar esses filmes. Esses Moços é um exemplo de filme que não tem muito "o perfil para ganhar festival", é popular, e a crítica não sabe se comportar diante de um filme assim. Os festivais no exterior se tornam mais importantes ainda. Mas, é algo difícil para um filme fora do eixo, pois depende de ligações que exigem maior poder de fogo das produtoras. É claro que o filme independente brasileiro que consegue isso, imediatamente é recebido em seu país com outros olhares. Coisa de uma colonização arraigada, que sagra o filme pobre Iraniano e argentino, como cult e criativo, mas esnoba o igualmente criativo cinema brasileiro de baixo orçamento.
- Diante de uma ocupação abusiva dos blockbusters, que chega a um percentual inacreditável de 80% com apenas 3 filmes, está havendo uma reação das associações cinematográficas e de parte da crítica. É a Tela em Transe. O que pensa um cineasta que está lançando seu primeiro longa no circuito com um número ínfimo de cópias?
Só um mobilização ampla pode melhorar esse quadro.É fundamental também que se ocupe anualmente a mídia de massa – principalmente a TV, com campanhas institucionais trimestrais patrocinadas pela estatais, onde possa se juntar as belas imagens de nossos filmes para incentivar e estimular e incentivar o grande público a conhecer os muitos brasis, nosso talentos e nossas historias. Alem disso ampliar a cota de tela, taxar cópia a cópia, criar a cota de trailler e garantir espaço para o merschandesing nos foyers das salas.
- Em 2001, o cinema brasileiro levou um número considerável de público às salas de cinema como há muitos anos não vinha acontecendo. O que houve de lá pra cá, que não conseguimos manter esse avanço? Houve uma contra reação?
Principalmente falta de estratégia de comunicação. Os filmes estão sendo lançados sem apoio de pesquisas para definir a linha de criação da comunicação, e seus verdadeiros públicos alvos. Por outro lado está cansando essa formula do filme TV. Só campanhas cooperadas que reúnam os sem propaganda podem ampliar o posicionamento do cinema brasileiro na mente do espectador. O resto é recrudescer contra o abuso desse quase monopólio. Trabalho de formiguinha, onde nossos heróis desdentados devem agir com inteligência para enfrentar os superpoderosos da américa do norte.