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30 janeiro 2009
A bela com Errol Flynn
Dona Lúcia Rocha: mãe coragem do cinema brasileiro
Texto de minha autoria publicado ontem, quinta, 29, no jornal Tribuna da Bahia. Na foto, Dona Lúcia Rocha ao lado de Rogério Duarte.
Dona Lúcia Rocha, mãe de Glauber, é uma mãe coragem como a heroína da famosa peça de Bertold Brecht. Ao completar, neste 2009, a fantástica idade de 90 anos de existência, e festejada com várias homenagens, tem, no entanto, em seu itinerário tragédias que lhe impuseram sofrimento e dor.
Morto o filho querido, o realizador Glauber Rocha, cujo reconhecimento internacional é indiscutível, Dona Lúcia resolveu se dedicar, full time, à preservação da memória do autor de Deus e o diabo na terra do sol, e, para isso, criou o Templo Glauber. A princípio, na primeira metade dos anos 80 (o cineasta morreu em agosto de 1981), Dona Lúcia pretendeu instalar o acervo memorialístico do filho em Salvador, mas não encontrou apoio. Segundo ela, foi enrolada e, no final das contas, para não perder a oportunidade, aceitou o convite do Museu da Imagem e do Som para o depósito do material do filho.
Da Imagem e Som, o Templo Glauber se mudou para um casarão em Botafogo, mas o percurso, para conseguir sobreviver às intempéries, foi cheio de atropelos, principalmente quando, em 1990, houve o confisco promovido por Fernando Collor, que provocou um trauma imenso no funcionamento do templo dedicado a Glauber.
Nascida em Vitória da Conquista, Dona Lúcia Rocha casou-se com Adamastor e, com ele, tiveram três filhos: Ana Marcelina, Glauber, e Anecy. Como numa tragédia grega, Dona Lúcia perdeu os três. Ana Marcelina foi a primeira, ainda adolescente, quando uma leucemia a tirou da vida inesperadamente, causando, com isso, imenso choque na família. Em 1976, a talentosa Anecy, atriz no auge de seu sucesso, cai, de repente, no poço do elevador do prédio onde morava. Apenas cinco anos se passariam para que Glauber viesse também a morrer. Como se diz, geralmente os filhos é que enterram os pais, mas no caso dessa mãe coragem, que é Dona Lúcia Rocha, ela enterrou os seus três filhos.
Também o marido, Adamastor (dono daquela loja que ficava logo na entrada da rua Chile, Loja Adamastor), sofrera acidente automobilístico que o deixara sem o vigor de antes, e Dona Lúcia tinha que se desdobrar para manter o equilíbrio da família. O casarão da rua General Labatut, número 14, Barris, era o point onde se reuniam os jovens intelectuais que queriam fazer cinema na Bahia. A pensão de Dona Lúcia, com o passar do tempo, foi ficando famosa a tal ponto de hospedar artistas e intelectuais que vinham do eixo Rio-São Paulo. Devia, o casarão hoje em ruínas, ser tombado como patrimônio cultural baiano.
Dona Lúcia, ao contrário das mães tradicionais, sempre incentivou Glauber para fazer cinema. Adolescente, ela, ao invés de lhe dar um automóvel, como todo jovem deseja, ele, consultado, preferiu uma câmera 16mm para filmar. Quando das filmagens de Barravento, na praia de Buraquinho, distante da cidade, Dona Lúcia preparava quarenta marmitas para que o pessoal da equipe técnica não ficasse sem almoçar - a produção dava apenas para se fazer o filme e muito mal para alimentar seus participantes. Embora não creditada (o único, segundo ela, que a creditou foi Joaquim Pedro de Andrade em Os inconfidentes), Dona Lúcia fez alguns figurinos de Deus e o diabo na terra do sol e O dragão da maldade contra o santo guerreiro, entre outros filmes do filho querido.
O mais incrível é que Dona Lúcia pulou uma fogueira também no que diz respeito à sua saúde. Há quatro anos atrás, quase aos 90, submeteu-se a uma cirurgia de revascularização miocárdica, a famosa ponte de safena. Na sua idade, e a considerar ser uma operação bastante invasiva, Dona Lúcia tirou de letra. E não é a primeira que faz. Há 20 anos, submeteu-se à mesma cirurgia, sempre com êxito considerável. Uma vez, perguntei a ela o que era colocar uma ponte de safena. Me respondeu: "André, está vendo aquela estrada de asfalto, deite-se ali e sinta um caminhão pesado passar por cima de você!" Há dois anos também já passei por esta faca – questão genética, principalmente, e o auxílio de excelentes coadjuvantes: cigarro e álcool e vida sedentária, cujo esporte favorito está no levantamento de copos.
Vi recentemente, no Canal Brasil, dois documentários sobre a mater glauberiana: Abry, de Paloma Rocha (filha de Glauber com Helena Ignês) e Joel Pizzini, e Lúcia Lux, de Neville D'Almeida. Vale lembrar que dois cineastas baianos, José Umbelino e Fernando Belens, fizeram, há alguns anos, um bom documentário sobre a figura de Dona Lúcia Rocha: A mãe.
O título do filme de Paloma é tirado de uma frase da própria Dona Lúcia, que, ao ouvir do médico que tem um problema que precisa, para ser extinto, de uma operação invasiva, com a abertura do peito, ela repete: “Abre, abre, abre”. Paloma, para dar um tom, substituiu, no título, o “e” pelo “y”, e ficou Abry. O outro, de Neville, vale pelas entrevistas com ela, pelos depoimentos que dá sobre a vida e sobre Glauber, como conta quando o filho foi preso durante a ditadura e a espera angustiosa, dias e dias, pela sua volta. Já o filme da dupla Umbelino e Belens creio mais completo.
Visitem o Templo Glauber pela internet: http://www.tempoglauber.com.br
29 janeiro 2009
Ir ao cinema é missão quase impossível
Recebo muitas mensagens que apoiam o meu comentário sobre os débeis mentais que atropelam os cinéfilos no Multiplex. Vejam, por exemplo, a quantidade de comentários no post dedicado ao assunto. O fato é que é impossível, hoje, assistir-se a um filme em paz e sossego. Devo confessar que ando a perder filmes importantes, esperando-os em dvds, por causa do comportamento selvagem dos débeis mentais que assolam os complexos multiiplex ou cinemark. É verdade que faço muito esforço para ver os lançamentos mais importantes, a procurar os horários mais suaves, isto é, aqueles situados nas últimas sessões, que são mais calmas e menos concorridas. A julgar pelo comportamento da platéia, será que a sociedade atual está apenas composta por débeis mentais?
Para não achar que estou sozinho nesta situação de aflição, vou transcrever aqui o que disse Marcelo Janot em seu blog do Telecine, o Blog Cult, sob o título Ir ao cinema: missão (quase vez mais) impossível: "Assim como muitos de vocês, eu também hoje penso duas vezes antes de ir ao cinema. Nem tanto pelo alto preço dos ingressos, já que como crítico tenho acesso livre em alguns circuitos exibidores e nos outros pago meia por causa do cartão de crédito e da operadora de celular. O problema maior é a fonte de estresse que se tornou ir ao cinema, por conta da falta de educação da platéia. Gente que fica olhando o celular de 5 em 5 minutos e acendendo aquela luz irritante (sem contar os que atendem), gente que fica conversando o filme inteiro com o companheiro(a) como se estivessem no sofá de casa. Jovens baderneiros, adultos estúpidos (já viram como tem gente que não entende as coisas mais óbvias de certos filmes?) e velhinhos tagarelas...tá difícil ver cinema em silêncio, se concentrando no filme. É triste, porque eu gosto da tela grande. Acho que semana que vem eu consigo ver o “Benjamin Button”, talvez as salas já estejam um pouco mais vazias."
Luis Carlos Merten conta, em seu blog, que, em Lisboa (encontra-se por lá neste seu novo giro europeu), os cinemas fazem intervalo de 6 minutos para que os porutugueses possam comprar pipocas e ir ao banheiro. Com esta, literalmente, caí do cavalo. Não somente o Brasil, mas a sociedade contemporânea, em todas as partes do mundo, parece mesmo infestada de débeis mentais.
28 janeiro 2009
Centenário de um cineasta baiano
27 janeiro 2009
Débeis mentais atropelam cinéfilos no Multiplex
O comportamento selvagem e os atos de vandalismo são fatos recentes (de uma década para cá). Alguém chegou a me sugerir que sempre foi assim. Ledo e "ivo" engano. Antigamente havia mais respeito ao espetáculo cinematográfico, a platéia se comportava, gostava dos filmes, prestava a eles muita atenção. Via-os em silêncio, ainda que, de vez em quando, uma piada espirituosa fosse bem vinda. Nos cinemas de segunda categoria, situados na Baixa dos Sapateiros (Pax, Aliança...), a platéia gostava de externar as suas emoções e, muitas vezes, a fazer zoada. Mas neste caso havia uma integração entre a platéia e o filme que se estava a ver. O público reagia quando a mocinha, em mãos de bandidos sanguinários, via o mocinho chegar para salvá-la. Ou quando a cavalaria, no último momento, evitava um determinado massacre. Havia umas palavras e expressões que eram sempre gritadas quando um homem beijava, na boca, uma mulher, o que se chamava de colada (havia um censura rigorosa que estabelecia o tempo do beijo cinematográfico). Neste momento, ouvia-se um Chupa, Caetano!!, que até hoje não vim a compreender. Nada a ver com o compositor santo-amarense, pois, naquela época, ainda era um menino de calças curtas em sua cidade natal. Ainda está para ser investigado este insólito: Chupa, Caetano!!
A sociedade de consumo tirou a condição de cinéfilo para torná-lo, via a propaganda massiva, um mero consumidor de filmes. A maioria das pessoas que vai ao cinema hoje é constituída de consumidores e não de cinéfilos. O ir ao cinema atualmente é apenas uma das fases do shoppear. Vai-se aos shoppings e não aos cinemas. Quando as pessoas terminam de passear pelos corredores dos shoppings é que decidem ir aos cinemas, a escolher os filmes pelos cartazes, pela simpatia de um determinado astro ou estrela. E se comportam nas salas escuras como autênticos débeis mentais.
Nos tempos em que havia civilidade, educação, respeito, vendia-se tábuas de chocolate, drops, balas, chicletes, etc, numa bombonière discreta. Todos os cinemas tinham suas "bombonières", assim chamadas porque a sociedade brasileira sofreu a influência francesa - tanto é que nos ginásios se aprendia mais francês do que inglês e a Casa da França era disputada pelos alunos. Nos poeiras, assim chamadas as salas de segunda categoria, cadeiras de madeira, sem ar condicionado, havia um baleiro que circulava, antes das sessões, com uma cesta rigorosamente arrumada com os "queimados". Tudo em fila, uma disposição dos drops, chocolates, chicletes e outros, quase militar. E o baleiro também se apresentava com a sua farda, que tinha até um boné "oficial". Não me lembro de pipocas nesta época (e, falar nisso, estou a ficar velho). Se existiam, elas eram vendidas com muita discrição nas portas dos cinemas e poucas as pessoas que as compravam. Atualmente o cinema é monstruosamente associado às pipocas. Nada contra as pipocas. Até gosto. Mas não dentro das salas exibidoras, pois provocam ruídos não apenas no comer como, também, no amassar dos saquinhos. E nos dias de hoje os chamados "saquinhos" foram substituídos por verdadeiras bacias - que podem ser reaproveitadas para a lavagem de roupa miúda, como calcinhas e cuecas.
O menino que gritava semana passada numa sessão vespertina de A troca é um atestado da bagunça generalizada na qual se encontram as salas exibidoras. Vai-se hoje ao cinema não para apreciar os filmes, como já disse, mas para esculhambar, ainda que o termo seja um tanto forte. Mas é isso mesmo. Foi-se a época em que o cinema era quase como uma função como no teatro. A música que anunciava o início da sessão, o suceder de luzes coloridas, a cortina que se abria solenemente, o gongo anunciador. E as salas eram grandes, entre 1.500 e 2000 lugares, com platéia e balcão. O extinto Capri, que ficava no Largo 2 de julho, tinha uma ladeira expressionista que unia o balcão à platéia. O espectador que quisesse ir ver o filme nesta última tinha que descer a tal ladeira sinuosa, cenário exemplar que fazia lembrar a cenografia de O gabinete do Dr. Caligari, filme alemão da escola expressionista realizado em 1919.
26 janeiro 2009
Atriz lança livro sobre teatro e jornalismo
Além disso, traz reflexões sobre: a relação complexa e dinâmica entre a cena teatral na Bahia e sua cobertura; a configuração do espaço cênico no jornalismo baiano; as repercussões do modernismo teatral no estado e no país; as inovações editoriais ocorridas à época; a percepção de questões do teatro em moldes modernos e o surgimento de vozes/fontes que as representem na imprensa.
Para a realização deste trabalho, a autora resgatou e digitalizou mais de duas mil fotos e matérias jornalísticas sobre teatro, publicadas entre os anos de 1956 e 1961, trazendo à tona inestimável acervo que contribui de modo preponderante para a escrita da história cultural brasileira. O livro publica uma seleção de 27 imagens deste acervo. Nos periódicos estudados, textos, entre outros, de Walter da Silveira, Paulo Francis e Glauber Rocha (que, ao lado do jornalismo, se desdobra na direção dos primeiros filmes do Cinema Novo).
Na pesquisa que dá base ao livro, realizada em seu mestrado, Jussilene Santana ainda entrevistou inúmeros artistas e jornalistas que fizeram a cultura baiana no período, a exemplo dos atores Sonia Robatto, Yumara Rodrigues, Maria Silva, Wilson Mello, Manoel Lopes Pontes, Mario Gadelha, Roberto Assis, Harildo Déda e do jornalista Florisvaldo Mattos. Alguns deles em seus últimos depoimentos, como Nilda Spencer, Carlos Petrovich e Álvaro Guimarães, já falecidos. Em 2007, Jussilene organizou com parte dos entrevistados o Ciclo de Entrevistas Memória do Teatro na Bahia, evento que resultou em mais de 12 horas de depoimentos gravados sobre a história do teatro baiano e brasileiro.
Ainda este ano, Impressões Modernas será lançado nas bienais da Bahia (de 17 a 26 de abril) e do Rio de Janeiro (de 10 a 20 de setembro). O livro, patrocinado pelo Fundo de Cultura, da Secretaria de Cultura do Estado da Bahia, terá lançamentos, ainda, nas cidades de Ilhéus, Itabuna, Vitória da Conquista e Itaberaba. Em todas elas, a autora fará palestras e doará exemplares para as bibliotecas das universidades estaduais (UNEB, UESC, UEFS, UESB). A divulgação e as palestras abertas à comunidade acadêmica e ao público interessado continuam em novembro em Juazeiro do Norte (Ceará), Recife e São Paulo.
Após o nascimento de sua primeira filha, a atriz retorna novamente à Bahia em agosto para os ensaios do espetáculo Joana d'Arc, no qual fará o papel-título, com estréia prevista para outubro. A peça, contemplada no último edital da Fundação Cultural do Estado com o prêmio de R$ 100 mil, tem direção de Elisa Mendes, texto de Cleise Mendes e produção de Virgínia da Rin. No elenco, nomes como Carlos Nascimento, Carlos Betão e Widoto Áquila.
Atualmente no doutorado, Jussilene Santana continua sua pesquisa sobre o teatro baiano nas décadas de 1950 e 1960. Sua tese Martim Gonçalves: Uma Escola de Teatro contra uma Província faz parte do Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas, da Universidade Federal da Bahia.
Formação Profissional
Pelo desempenho em As Lágrimas Amargas de Petra von Kant, Jussilene recebeu indicação ao Prêmio Braskem de Teatro na categoria melhor atriz coadjuvante. Sua elogiada atuação na montagem Budro lhe rendeu o Prêmio Braskem de melhor atriz baiana de 2004. Na tevê, esteve no elenco do especial A Mulher de Roxo, com direção de Fernando Guerreiro. Em 2007, fez os longas-metragens Estranhos e Jardim das Folhas Sagradas.
Como jornalista, trabalhou em jornais diários baianos (Correio da Bahia e A Tarde) e apresentou programas locais na TV Record (Travessia 2001/2002) e TVE (Sextas Baianas 2006/2007). Ganhou os prêmios Banco do Brasil (2003) e Associação Baiana de Imprensa (2004), sendo finalista do Troféu Coelba de Reportagem (2003). Atualmente é professora de jornalismo e continua atuando como atriz profissional em teatro, cinema e TV. Seus principais temas de pesquisa são: teatro, jornalismo, cultura, história e Bahia.
O livro Impressões Modernas
Nestas décadas, a Escola de Teatro da Bahia se firma como um centro profissionalizante de excelência, único no país, articulado com outros centros de formação de artistas localizados nos EUA, Europa e Oriente. Sua criação possibilita que procedimentos do teatro moderno sejam trabalhados sistematicamente nas artes cênicas de Salvador, alterando profundamente os rumos da atividade no estado. A Escola de Teatro, então sob a direção do encenador Eros Martim Gonçalves, marca a transição de um período no qual o teatro na Bahia é entendido como uma atividade amadora e diletante, para outro em que é reconhecido como um campo autônomo, profissional e artístico.
Segundo a autora, esta época da cultura baiana, ocorrida na Bahia em meados do século XX, é sempre narrada de forma lendária. Jussilene lembra que a criação e a atuação da Escola de Teatro da Bahia, ponta de lança da produção do período, está relacionada ao "renascimento baiano", patrocinado pela gestão do reitor Edgar Santos à frente da Universidade da Bahia.
"Muito se fala da influência do cinema e da música baianos para o Brasil, mas o que o teatro baiano legou neste período também é de altíssima qualidade e foi até agora miseravelmente estudado", destaca Jussilene. Segundo a autora, o principal legado para as artes cênicas seria a geração de alunos/atores que faria afinadamente o Cinema Novo, o Tropicalismo, o cinema marginal e a televisão brasileira nas décadas subseqüentes, destacando os atores nacionalmente mais conhecidos: Othon Bastos, Geraldo Del Rey, Helena Ignez e Antonio Pitanga. "Mas também houve montagens inovadoras e polêmicas, como a da Ópera dos Três Tostões, de Bertolt Brecht, e Calígula, texto de Albert Camus, encenada pela primeira no Brasil, pela Escola de Teatro, no TCA, tendo no papel-título o ator Sérgio Cardoso. Ambas as encenações são de Martim Gonçalves", pontua.
Diálogo contrastante.
É importante ressaltar o diálogo contrastante que Impressões Modernas – Teatro e Jornalismo na Bahia mantém com a abordagem promovida por O Teatro na Bahia através da Imprensa, de Aninha Franco (1994). Segundo Jussilene, esta publicação minimizou arriscadamente as diferenças entre os discursos promovidos pelos jornais do período – cujas posturas políticas e estéticas são bem distintas –, rotulando, de modo genérico, as desiguais coberturas jornalísticas como "o discurso da imprensa".
"Ora, os jornais não apenas discordam entre si, como também modificam publicamente opiniões sobre eventos e artistas quando estes assumem posturas que se afastam das linhas editorias defendidas ou mesmo por questões pessoais dificilmente diagnosticáveis. Não há como contar uma história pela imprensa sem analisar isso", ressalta.
Outro ponto que merece destaque no debate com Franco, segundo Jussilene, é a linguagem datada que esta autora utiliza para tratar dos choques e diálogos interculturais. "Franco denomina de colonizador toda e qualquer informação, processo poético ou de linguagem que não seja 'assumidamente baiano', porém sem explicar o que entende por baianidade, ora confundida por ela com a idéia de brasilidade".
Ainda segundo Jussilene, causa e conseqüência, na coletânea de matérias e artigos de jornais que Franco apresenta não há qualquer referência a eventos, por exemplo, promovidos por Martim Gonçalves à frente da Escola de Teatro que, no mínimo, tornariam mais complexo o rótulo dado ao encenador de "adepto de estrangeirismos".
"Gonçalves apresenta à cidade tanto um painel da melhor dramaturgia ocidental, com Camus, Brecht, Claudel, Mishima e Tenessesse Williams, quanto os brasileiros Antonio Callado, Maria Clara Machado, Ariano Suassuna e Arthur Azevedo. Mas ele também publica artigos sobre teatro popular nos jornais baianos, os mesmos que mais tarde lhe fecharão as portas, e monta o primeiro espetáculo teatral de cordel na Bahia. Isso ao contrário do que o imaginário teatral baiano sedimentou de que teria sido o Teatro dos Novos o primeiro a fazer montagens trabalhando esta literatura popular", finaliza a autora.
SERVIÇO
Livro: Impressões Modernas – Teatro e Jornalismo na Bahia
Autor: Jussilene Santana
Editora: Vento Leste
Data: 05 de fevereiro, às 17h
Local: Livraria LDM (Rua Direita da Piedade)
Preço: R$ 50,00
Preço promocional (dia do lançamento): R$ 30,00
CONTATOS PARA ENTREVISTAS
Jussilene Santana (71)8812-1346
25 janeiro 2009
Cinema Baiano (14): De um curso inesquecível
Quando se podia transitar na urbis soteropolitana, antes que a violência tomasse conta da cidade, lá pelos anos 60, um exibidor de um cinema do bairro da Liberdade, o Cine São Jorge - que formava com o Brasil e o São Caetano as salas exibidoras do bairro, resolveu passar, à meia-noite dos sábados, "filmes de putaria", segundo sua própria expressão. Eram filmes mal feitos, péssima fotografia, mal focados, quase que não se podia ver direito o que estava acontecendo no interior do enquadramento. Para compensar a qualidade deficiente dos celulóides em 35, o exibidor comprou um projetor 8mm - nada de Super 8, que não existia - em Marota, um comerciante antigo da Cidade Baixa que negociava com material de cinema. Instalando este projetor na sala, mandou buscar filmes suecos e dinamarqueses "de putaria grossa", que tinham, apesar da bitola menor, o 8mm, uma qualidade fotográfica excelente.As sessões ficavam abarrotadas, porque em matéria de "putaria", os homens se contentavam com as histórias em quadrinhos de Carlos Zéfiro, vendidas clandestinamente, mas fáceis de encontrar na Praça Municipal. Não sei se o Macaco de Blair pegou esta época ou se chegou mesmo a ir às famosas "sessões de meia-noite". Fui a uma delas, e vim andando da Liberdade para casa em Nazaré perto das duas da manhã. Tudo era muito calmo. Dava prazer se viver em Salvador.