Procurar furdunços para se coçar não é tarefa difícil para o pessoal que faz cinema na Bahia. O furdunço que se estabeleceu em torno de Revoada, de José Umberto, com o produtor sequestrando o material filmado para montá-lo à revelia de seu autor, é um caso que precisaria ser mais discutido, pois serve como exemplo do poder da produtora em detrimento do diretor do filme, aquele que o concebe e o planeja e que estabece a sua forma de expressão. Agora mesmo os cineastas estão a discutir certas exigências do Edital, principalmente as referentes ao privilégio dado às emprêsas de produção. Tuna Espinheira, atento a tudo, envia-me um e-mail no qual dá notícias sobre um furdunço mais que apropriado. A mendicância, como se pode perceber, continua acessa e brava. Os mendigos de editais estão a sair de seus pontos cativos para o protesto meritório.
Velho André,
Li, hoje pela manhã, revolta de um seguimento dos cineastas baianos contra o presente Edital de concurso de roteiros. A briga principal está ligada às Empresas de Produção, das quais se exige mais de 3 anos de atuação no Estado. Acho que a discussão seria no sentido de reclamar a decisão do Júri em relação ao projeto inscrito, ficando a obrigatoriedade do contrato com a Pessoa Jurídica como uma segunda etapa do concurso. Isto deixaria livre o roteirista/diretor com a sua proposta. No caso de vencedor, o proponente teria mais força na negociação com a Empresa. Sem estar, previamente engessado com as interferências prováveis do Produtor.
Uma das coisas curiosas nisto tudo é que não existem na Bahia, pelo menos no meu conhecimento, uma real produtora de cinema. As que funcionam são do ramo da publicidade. Mesmo porque não sobreviveriam produzindo cinema por aqui. A atividade cinematográfica na terrinha é coisa bissexta, bota bissexta nisto.
Outra coisa é o fato de se exigir um monte de documento da Empresa e nenhum currículo do pretenso Diretor. Afinal quem vai fazer o filme!?
Agora Inêz é morta, no meu conhecimento, por ouvir dizer, há mais de um ano discute-se os Editais. Acho que a classe dormiu de toca, não se muda a regra do jogo no meio da partida. Existe razões de um lado e do outro, sem faltar alguma advocacia em causa própria, dos eternos alguns de plantão. Vixe Maria, mais um imbróglio.
Tuna
Transcrevo aqui a reportagem de Saymon Nascimento que saiu hoje na capa do Caderno 2 de "A Tarde" para maiores esclarecimentos do leitor deste blog.
Cineastas pedem edital de emergência
SAYMON NASCIMENTO
Produtoras com menos de três anos de mercado e realizadores independentes devem ficar de fora dos editais abertos pela Secretaria de Cultura do Estado para a produção de um longametragem – que tem um prêmio de R$ 1,2 milhão – e dois curtas, com valor de R$ 100 mil, cada um. De acordo com os cineastas, em carta aberta ao secretário Marcio Meirelles, o motivo do impedimento são novas cláusulas no texto da licitação, que não estavam presentes nos editais de incentivo à produção anteriores, lançados em 2004.A primeira cláusula estabelece que somente pessoas jurídicas podem se inscrever no edital. Os proponentes do projeto devem ser empresas. "Esse item inviabiliza o trabalho de jovens realizadores que, na Bahia, sempre trabalharam de forma independente", afirma o presidente da Associação Baiana de Cinema e Vídeo (ABCV), Lula Oliveira.
O videomaker Mateus Damasceno, que tem dois projetos de curta, é um dos excluídos da concorrência. "Sem a possibilidade da inscrição por pessoa física, o projeto corre o risco de nunca acontecer. Está difícil se associar a produtoras, já que elas têm filmes próprios e há um limite de três projetos inscritos", afirma.Na carta aberta a Marcio Meirelles, a ABCV pede a realização de um edital “emergencial” de curta-metragem para proponente pessoa física – padrão adotado nos editais mais recentes do Ministério da Cultura. No entanto, se a reivindicação for atendida, o prêmio não pode passar de R$ 62.250. Diferentemente do último edital, de 2004, os recursos das licitações atuais estão lotados no Fundo de Cultura do Estado, que estabelece um teto de 150 salários mínimos para projetos de pessoa física.
TRÊS ANOS – Para os projetos pertencentes às produtoras, há outros entraves para a participação na concorrência.Determinados pelo Fundo de Cultura, os editais abertos para longa e curta restringem o tempo de estabelecimento do proponente ao mínimo de três anos, para que esteja apto a concorrer aos incentivos."Entendo a preocupação em garantir que essa quantidade de dinheiro não caia na mão de produtoras inexperientes, sem capacidade de gestão, mas essa questão pode ser resolvida com análise de currículo, como no edital do Ministério da Cultura. Há produtores com mais de 20 anos de mercado, com bastante experiência, que só fundaram empresas recentemente", afirma o produtor Amadeu Alban, sócio da Santo Forte. A empresa tem dois projetos de longa e um de curta, mas não pode concorrer porque tem menos de três anos de mercado.Nos editais para longa-metragem do MinC, somente pessoas jurídicas podem disputar o incentivo, mas a exigência é de experiência comprovada e não de tempo: três curtas e/ou médias ou um longa.Com um ano e oito meses de fundação, a produtora Cavalo do Cão também não pode inscrever Tropykaos no edital de longa-metragem. O projeto, assinado pelo fundador da produtora, Daniel Lisboa – vencedor do Videobrasil por O Fim do Homem Cordial –, foi um dos nove vencedores do primeiro edital de desenvolvimento de roteiros, realizado ano passado. "Podemos tentar uma co-produção internacional, mas o caminho mais lógico seria concorrer a esse edital.Acho problemático o governo fazer um edital para roteiro e, depois, impossibilitar que os vencedores saiam do papel".Na carta aberta a Marcio Meirelles, os cineastas pedem a retificação do atual edital: o tempo mínimo de estabelecimento para que uma produtora possa concorrer passaria de três para dois anos. Anexa está uma lista de 20 produtoras e realizadores inelegíveis.
ESVAZIAMENTO – Outra conseqüência da realocação dos editais de incentivo à produção de cinema é a impossibilidade de que uma produtora premiada por qualquer projeto dentro do Fundo de Cultura possa tentar um segundo incentivo antes da prestação de contas e finalização do primeiro.O proponente também só poderá ter um projeto aprovado por ano.A produtora Coisa de Cinema, do cineasta Claudio Marques, tem os três anos regulamentares para estar habilitado às concorrências em questão, mas pode ficar de fora do certame porque ganhou incentivo no calendário do ano passado para realizar um festival de cinema."Com essa restrição, as produtoras vão investir em apenas um projeto por vez, escolhendo a dedo. Resultado: a seleção de curtas deve ter participação mínima, porque todo mundo vai querer apostar no longa, para não ficar preso a um projeto pequeno sem poder entrar em outras concorrências", afir ma.A empresa deMarques tem um projeto de longa e dois de curta, mas, caso consiga finalizar o projeto anterior a tempo, só vai inscrever o longametragem. "Apesar de haver duas dezenas de projetos de longa e quase cem de curtas no Estado, os editais vão estar esvaziados. Essa seleção não vai refletir o momento atual do cinema baiano", analisa.
FORA DO CIRCUITO – O cineasta Pola Ribeiro, diretor do Instituto de Radiodifusão Educativa da Bahia (Irdeb) – autarquia da Secult responsável pelos editais para o audiovisual –, disse que a secretaria deve se reunir com a classe ainda esta semana para discutir a reivindicação do edital de emergência para pessoa física, mas reafirmou a intenção de direcionar as licitações de cinema e vídeo para as produtoras."Cinema não é um projeto de um homem só. É preciso que o realizador se una às produtoras para que os projetos se tornem mais fáceis de se viabilizar.Não é o diretor que vai mandar parar uma rua, ou prestar contas – é necessário uma base de articulação com a sociedade, que são as empresas.Só assim o trabalho artístico vai ser profissionalizado", sustenta.Para Pola Ribeiro, os cineastas que estão atualmente inelegíveis, seja por falta de produtora, ou porque a empresa à qual estão aliados não cumprem as exigências do edital – três anos de estabelecimento ou outros projetos pendentes no Fundo de Cultura –, devem olhar para "fora do circuito"."Há, por baixo, mais 20 produtoras elegíveis que estão sem projeto, sem contar com o interior. O problema é que a gente de cinema só se relaciona com quem está próximo, em vez de procurar se articular com empresas que não estão concorrendo". De acordo com o diretor do Irdeb, os realizadores podem procurar empresas produtoras que trabalham com publicidade e comunicação, e apresentar os projetos."Como medida imediata, o próprio Irdeb deve fazer uma convocação dessas produtoras ociosas para a articulação com os realizadores inelegíveis.Com essa disponibilidade de empresas, é impossível que os editais fiquem esvaziados", acrescenta.De acordo com a assessoria da Secult, até o fechamento desta matéria o secretário de Cultura, Marcio Meirelles, não havia lido a carta aberta que lhe foi enviada pela ABCV e, portanto, não daria declarações sobre o assunto.
A foto que ilustro o post é de Cascalho, longa de Tuna Espinheira, que se encontra pronto para lançamento no mercado já com Dolby e tudo o mais.