Já cansei de falar aqui, neste blog, e alhures, acerca do vandalismo que tomou conta das salas de exibição, do comportamento debilóide da platéia dos Multiplex, etc. Mas tal comportamento também se verifica nas chamadas 'salas alternativas', point de encontro da maioria dos pseudo-cinéfilos soteropolitanos, que gostam de desfilar por elas para, como dizia minha avó, 'se amostrar'. Deixo para Victor Scarlato uma observação mais percuciente num texto escrito após ter ido à uma dessas famigeradas salas da cidade, em 9 de dezembro do ano que se findou. Abrindo logo as necessárias aspas:
"Pois bem, iniciarei, mais uma vez, a partir das intempéries do mundo cult. Tratarei, neste pequenino texto, sobre uma grande insatisfação minha para com um locus cult baiano: o Circuito Sala de Arte, mais especificamente, a Sala do Museu de Arte Moderna, MAM, localizado na belíssima Avenida Contorno.
Bem, antes de prosseguirmos com tais considerações, considero proveitoso retomar alguns pontos em relação à postura que possuo para com aqueles que se mostram como indivíduos pertencentes ao mais elevado padrão cultural: o movimento cult. É louvável que estes indivíduos estejam trilhando para suas vidas um caminho movido pela arte, pelo fascínio com o underground, pela espetacularização, por uma postura de "brutal crítica" e "engajamento social", além, é claro, de um demasiado louvor ao escapismo mundano a partir das drogas. Pois bem, meus caros, posso estar sendo exagerado com tais estereotipagens, mas, ainda assim, sabemos que algumas delas estão na formação do ethos cult; permitam-me esta construção típica weberiana. Tendo este cabedal em vista, o que podemos concluir de modo rápido? O público cult realmente é composto por indivíduos apreciadores da arte nobre, ou ainda, da medíocre arte contemporânea, com todas as suas produções rasas e intimamente pobres. Afinal, como sabemos, a arte está em crise, ou não? O que me importa evidenciar é que o discurso cult é um tanto cheio de questões pouco salutares e corroído por falsas problemáticas. Ah, um ponto que acabei esquecendo: além de tudo isso, o movimento cult brasileiro encontra a sua identidade no medíocre British Pop, com aquelas canções igualmente chatas e sem maiores reflexões, ou ainda, identificam-se com os barbudinhos cult do grupo Los Hermanos, sem contar, obviamente, com aqueles que se estabeleceram e ainda permanecem nos anos 60 e 70. Um filme que bem espelha este estereótipo é 9 Canções (9 Songs – filme de 2004, dirigido por Michael Witterbottom), na verdade, um verdadeiro emblema do furor cult. De todo modo, este é um fenômeno nas faculdades de comunicação, de artes e de ciências sociais, o estereótipo Los Hermanos. Desculpem-me pela extensão deste tipo, entretanto, considero-o essencial para a compreensão do que se passa na sala do MAM.
Nesta quinta-feira passada, ocorreu-me de voltar ao MAM e assistir à um filme que chamou a minha atenção e de minha namorada pelos comentários da fatídica crítica e da sinopse (Eu me lembro – filme dirigido por Edgar Navarro, 2006). Pois bem, para a minha lamentação, um filme deveras fraco, mas, isto é algo que comentarei na próxima postagem. Então, pelo que posso recordar, esta quinta-feira passada se constituiu como a minha quarta ida a tal sala de cinema. Como sou uma pessoa que gosta bastante de cinema e dos considerados filmes de arte, ou mesmo, filmes cult, considero-me como uma pessoa que pouco freqüenta este tipo de sala. Ainda assim, este fato é facilmente explicável. O primeiro ponto é que esta sala do Circuito de Arte é nova. No entanto, isso não é justificativa suficiente, desde a primeira vez que fui à sala do MAM, tomei uma ojeriza tão grande que nunca mais quis voltar. O que é algo muito ruim, uma vez que o MAM está situado no melhor sítio de Salvador, um local que possui a mais bela vista da Baía de Todos os Santos, um lugar realmente maravilhoso. Obviamente, devo explicar os fatores que me levaram a tomar certo repúdio por aquela sala de cinema. Em primeiro lugar, o atraso e a confusão que foi criada pela platéia para adentrar a sala, algo incrementado pelo próprio corpo do MAM. Além disso, o que me causou uma imensa indignação foi a educação do público ali presente. O filme que estava sendo exibido, quando fui nesta sala pela primeira vez, era de origem portuguesa, Um Filme Falado (dirigido por Manoel Oliveira, 2003), no qual se passa entre uma professora de história e sua filha num cruzeiro pelo Mediterrâneo. Obviamente, não farei outros comentários, não é um filme excelente, no entanto, é deveras interessante na sua proposta, vale a pena assistir. O que vale evidenciar é que o filme possui vários momentos de reflexão, e que, por parte da platéia, foram acompanhados de risos histéricos, conversas e chacotas. Então, pergunto-me: será este um público deveras diferente daquele que encontramos no “circuito comercial”? Tendo em vista a elevada apreciação cinematográfica e o elevado grau de crítica sobre cinema, considero que este público é ainda deveras ridículo com todo aquele espetáculo ali formado. Aliás, o cult adora a mise en scène barata, de sarjeta. Pois bem, é este o público deveras cult que freqüenta a sala de cinema do MAM.
Já no domingo passado, podemos compreender que os mesmos problemas ocorreram, à exceção do atraso no início do filme, e, pelo menos, não aconteceu, como na primeira vez, o filme não embolou no projetor. Imaginem vocês a deliciosa sensação de estar assistindo ao belíssimo Volver, de Almodóvar, e, de repente, as luzes se acendem e a projeção se apaga. Peripécias de uma sala do Circuito de Arte. Bem, antes de entrarmos propriamente para a sala de projeção, ficamos eu e minha namorada na fila. Como já foi dito anteriormente, eu, como todo bom aspirante a observador, fico de ouvidos atentos para as conversas alheias. E, obviamente, escutei algo que me incomodou muito. Dizia o indivíduo, com toda a indumentária cult ao outro: “Se estivéssemos no Multiplex (circuito comercial de Salvador, localizado no Shopping Iguatemi), estaríamos rodeados com aquelas crianças berrando e aqueles adolescentes ridículos”. Tendo esta fala em mente, resolvi declarar a minha insatisfação e, por conseguinte, evidenciar que nunca tive problemas nas salas do Multiplex (inclusive quando vou assistir às minhas desejadas animações) como os tenho na sala do MAM. Se a ante-sala do Multiplex é deveras barulhenta, com muitas crianças e adolescentes, dentro da sala de projeção, posso presenciar o contrário da palhaçada que presencio na sala do MAM, além de contar com uma projeção melhor, ambientação e conforto infinitamente melhores. Assim, meus caros, como não evidenciar um repúdio com este público medíocre e que se considera acima, a nata intelectual? Bem, para finalizar proveitosamente a semana, foi na quinta-feira que meu pesar com aquele lugar seu deu de modo avassalador. Antes mesmo da projeção, ainda com as luzes acesas, porém, bem fracas, escutei um arroto impressionante, vale observar que a sala estava muito vazia e, que para além dos vestidos como cult, contei apenas eu, minha namorada e mais um casal. Sendo assim, o grande indivíduo educado a dar este arroto foi um cult, uma vez que o outro casal estava à minha frente. Algo deveras cabível, não? Afinal, a onda cult é ser também escrachado. Bem, após as luzes se apagarem, foi difícil assistir ao medíocre filme, Eu me lembro (Edgard Navarro, 2006), por todos os motivos já evidenciados aqui: gritarias, risinhos e conversas intermináveis. Foi uma sensação tão ridícula que tive de pedir silêncio, em uma sala pequena, com poucas pessoas (em sua grande maioria cult) e, obviamente, este pedido se deu mais de uma vez.
Assim, como analisar esta sala de cinema, que já traz no seu nome algo ridículo, Circuito Sala de Arte, como um lugar aprazível? Desculpem-me aqueles que adoram este público cult ou ainda que são cult, considero que os mesmos deveriam rever esta atitude puramente de mise en scène. Pois bem, estas pequenas observações na sala do MAM são insuficientes para dar conta de toda a formação deste público, mas, ainda assim, nos são extremamente proveitosas para imprimir considerações acerca de tal público que me causa tanto repúdio. Afinal, o que importa, de fato, fruição artística ou encencação?"