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12 dezembro 2009

Tuna registra Marighella em imagens

O cineasta Tuna Espinheira conversa com Dona Clara, viúva e companheira de toda vida de Marighella, quando filmava a cerimônia comemorativa da inauguração, em São Paulo, de uma placa para assinalar os 40 anos de seu brutal assassinato erguida no mesmo espaço onde veio a morrer metralhado pelos agentes da ditadura. Ao que tudo indica, Espinheira deve ir a Cuba para filmar. Aguardem notícias. Cliquem na imagem para vê-la em maior amplitude.

10 dezembro 2009

Henri Agel

O famoso crítico de cinema Henri Agel (1911/2008): anguloso e sábio. Professor do IDHEC (Institut des Hautes Études Cinematografiques), autor de Le Cinema, entre muitos outros livros. Homenagem mínima que este blog pode lhe prestar.

Truffaut: cineasta terno e afetuoso

Ao contrário do cinema de seus companheiros da Nouvelle Vague - Godard, Rohmer, Chabrol, Rivette, Resnais... racionalista e cerebral, o de François Truffaut é feito com a emoção e o coração, com extrema sensibilidade e uma simpatia incomum pelos seus personagens, que são tratados com ternura, generosidade e afeto. O crítico ferrenho, radical, intransigente, das revistas Cahiers du Cinema e Arts et Spetacules, que ataca em seus escritos o cinema clássico francês e o realismo psicológico de acadêmicos como Claude Autant Lara, Julien Duvivier, entre outros, sofre uma espécie de metamorfose quando passa a realizar filmes, transformando-se num cineasta terno e amável.

Os Incompreendidos (Les Quatre Cents Coups, cuja tradução literal é Os Quatrocentos Golpes), além de inaugurar a Nouvelle Vague – juntamente com Acossado, de Godard, Hiroshima, de Resnais... -, dá início à carreira de Truffaut como realizador de longas. E, neste 2009, a distância deste filme é de exatos 50 anos. Aqui também começa o ciclo dedicado a Antoine Doinel (sempre interpretado por Jean Pierre Léaud), um personagem com evidentes elementos autobiográficos, através do qual aborda o rito de passagem da infância à idade adulta. É a nostalgia da adolescência que Truffaut reflete nos filmes do ciclo Doinel, a fugacidade do tempo e a ânsia de amar, a chegada a idade adulta, o casamento... (Antoine et Colette, 1982, episódio de O Amor aos Vinte Anos/L’Amour a vints ans; Beijos Proibidos/Baisers Volés, 1968, Domicílio Conjugal/Domicile Conjugal, 1970, e; Amor em Fuga/L’Amour en Fuite, 1978).

(Em Os Incompreendidos, Truffaut, avant la lettre, considerando a época, alude à Nouvelle Vague e a seu amigo e colega Jacques Rivette, quando os pais de Antoine – que, por sinal, nos outros filmes do ciclo estão sempre ‘indo ao cinema’ – decidem ir ver Paris Nous Appartient, de Rivette, filme emblemático, apesar de pouco conhecido do movimento francês, e, de volta, no automóvel, consideram-no ‘muito bom’ – melhor homenagem impossível).

Romântico, sem, contudo, abandonar a visão irônica e dolorosa das relações afetivas, Truffaut tem a sua obra-prima já na terceira incursão longametragista: Uma Mulher para Dois/ Jules et Jim (1961), crônica de uma relação triangular (Oskar Werner, Jeanne Moreau...) baseada no texto literário de Henri Pierre Roché, autor que lhe serviria de inspiração para realizar, dez anos depois, abordando a mesma temática da dificuldade de amar, As Duas Inglesas e o Continente/ Les Deux Anglaises et le Continent (1971). O problema da comunicação no amor, aliás, do amor impossível, en fuite, é uma constante na filmografia de Truffaut, como revelam A História de Adele H/ L’Histoire de Adele H (1976), com Isabelle Adjani, A Mulher do Lado/ La Femme de la Cote (1981), entre outros.

Se seus colegas da Nouvelle Vague procuram elaborar uma linguagem que desconstrói o discurso cinematográfico tradicional, revertendo os cânones da lei de progressão dramática griffithiana, François Truffaut não pretende nunca em seus filmes dissolver a estrutura lingüística, mas, ao contrário, busca desesperadamente a fluência narrativa, o toque mágico capaz de envolver o espectador a fazê-lo pensar que não está no mundo’. É verdade que brinca com a metalinguagem, mas num sentido de reverência e ao cinema como em A Noite Americana/ La Nuit Americaine (1973), belíssima homenagem ao processo de criação cinematográfica onde Truffaut comparece como ele mesmo no papel de um diretor que faz um filme. O filme dentro do filme, portanto.

Outra vertente temática na obra truffautiana é a dominante policial, influência, na certa, de sua admiração por Alfred Hitchcock – seu livro de entrevista com este, Hitchcock/Truffaut, da Brasiliense (e, agora, em outra edição pela Cosac ou Companhia das Letras), é, simplesmente, uma aula magna de cinema. Há Hitchcock em Fareinheit 451 (1966), que faz na Inglaterra, com o mesmo Oskar Werner de Jules et Jim, baseado na ficção-científica de Ray Bradbury. Outra obra alusiva ao mestre é A Noiva Estava de Preto/ La Mariée Était em Noir (1967), com Jeanne Moreau ou, mesmo, Tirez sur le Pianiste, segundo filme (1960), e A Sereia do Mississipi/ La Sirene du Mississipi (1969), no qual declara, através das imagens em movimento, a sua paixão momentânea, Catherine Deneuve, que trabalha, aqui, ao lado de Jean Paul Belmondo. E no seu canto de cisne De Repente num Domingo/ Vivement Dimanche (1984), cujo ‘claro/escuro’, proposital, vem em auxílio de uma proposta estilística em função do film noir francês. Sem esquecer o elaborado, como mise-en-scène, Um só pecado (Le peau douce, 1963).Que, revisto agora, considero um dos melhores filmes do cineasta.

Autor, porque dono de um estilo próprio, marcante, ainda que com um universo temático diversificado, François Truffaut, na sua filmografia, envereda por assuntos diversos, a exemplo de O Garoto Selvagem/ L’Enfant Sauvage (1970), filme sobre a luta de um médico, no século XIX, para ‘domar’, um menino bárbaro criado sem contato com a civilização – influência possível para Werner Herzog em O Enigma de Kaspar Hauser. Na Idade da Inocência/ L’Argent de Poche (1976), experiência na qual, repetindo Jean Vigo (Zero de Conduite), o universo que retrata é constituído somente de crianças. Sem esquecer O Último Metrô/ Le Dernier Metro (1980), uma volta ao passado, Segunda Guerra Mundial na França ocupada, para valorizar, numa situação-limite, a importância dos pequenos gestos.

Em todos os filmes de François Truffaut, um denominador comum: a narrativa que sobrepuja a fábula, a doce fabulação que advém de um sentido preciso de mise-en-scène, o touch truffautiano, sempre terno, apaixonado, capaz de levar ao espectador o prazer do autor com o que está a filmar e o prazer, imenso, de se assistir ao que se está a ver.

06 dezembro 2009

Notas ligeiras sobre o teatro baiano

1) Minha pequena (e modesta) opinião sobre a montagem baiana de Joanna D'Arc (estou a colocar com dois ns porque no cartaz da peça assim está) acendeu uma polêmica entre alguns leitores (vejam nos comentários abaixo do post do escrito sobre Joanna). Embora não concorde com um deles, o de Henrique Wagner, e em gênero, número e grau, é uma opinião e, como sou voltairiano, defendo até a morte o direito dele tê-la. O fato é que a maioria das pessoas gostou muito da peça. Mas, como dizia o genial Nelson Rodrigues, toda unanimidade é burra.

2) Há, em cartaz na cidade, uma outra montagem que pretendo ver. Trata-se de uma peça em homenagem ao veterano ator baiano Harildo Deda dirigida por Luiz Marfuz e que se encontra no Teatro Vila Velha.

3) Sempre gostei muito de teatro. Vi quase todas as montagens baianas dos anos 60 e 70, mas, de repente, parei de ir aos palcos da soterópolis. Certas peças de teatro de laboratório, com os atores sujos e de malhas pretas a pular como macacos no proscênio, me incomodaram a paciência e me provocaram a aporrinhação. E depois veio o besteirol. Nada contra o besteirol, se bem feito, se articulado com engenho e arte e que seja capaz de fazer rir. Sinto, no entanto, falta de montagens de textos antológicos como se fazia antigamente. Quase que não se monta mais Ibsen, Strindberg, Camus, Tenneesee Williams, Ionesco, Tchecov, Bertold Brecht, Molière, William Shakespeare, entre tantos.

4) Assim de memória, tenho, dentro de seus arcanos, as lembranças inesquecíveis de O macado da vizinha, de Jorge Salomão, creio que vista em 1966 na Escola de Teatro, Stop, Stop, de João Augusto, Teatro de Cordel, de vários diretores (entre eles, João Augusto, Péricles, Orlando Senna), Esta noite improvisamos, de Alberto D'Aversa, Santo sepulcro para casal, também deste último, A escolha, de Orlando Senna, segundo texto de Ariosvaldo Mattos, Eles não usam black-tie, de João Augusto, O noviço, baseado em Martins Penna, cujo diretor, agora, esqueço, mas montada pelo grupo do Teatro dos Novos, Uma obra de governo, de Álvaro Guimarães, entre muitas outras. Nos anos 70, Marilyn Miranda, A casa de Bernarda Alba, dirigidas por José Possi, quando foi diretor da Escola de Teatro. E Calígula, de Camus, montada no interior devastado do Teatro Castro Alves, que se incendiou em 1958 e somente teve restauradas as suas instalações na primeira reabertura de 1967, quando vi, no seu imenso palco, O burguês fidalgo, de Molière, com Paulo Autran, O avarento, também de Molière, com Procópio Ferreira, A úlcera de ouro, deliciosa comédia musical com Marília Pêra, O Gonzaga, de Orlando Senna, entre muitas outras que o cansaço e a memória fraca deixam de registrar.

A foto é de Paulo Autran na pele de Tartufo, de Molière.