Tuna Espinheira está com seu longa, Cascalho, em exibição no cine Brasília desde o dia 1 de maio. A convite do Professor e membro da Academia de Letras da Bahia Aleilton Fonseca vai também exibí-lo em Feira de Santana no próximo dia 28 de maio. Após a projeção, uma conversa informal com o realizador. Transcrevo aqui um texto de Tuna, o velho guerreiro, sobre o seu filme. Na foto, Herberto Sales sendo condecorado pela então prefeita Lídice da Matta, tendo, ao fundo, óculos escuros na camisa, o cineasta.
"O romance Cascalho, de Herberto Sales, é hoje – e o tempo (único juiz categorizado), dá fé e assina em baixo – um livro clássico, emblemático, do chamado Ciclo do Garimpo.
Gabriel Garcia Marques escreveu livros maravilhosos, entre eles o surpreendente: Viver Para Escrever. Este de memórias. É só lê-lo para revisitar o principal da obra deste mestre. No Brasil, entre outros, Zé Lins do Rego, foi ainda mais radical, usou a memória como ferramenta substancial no seu oficio de escritor maior
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Herberto viveu nas terras outrora férteis em diamantes, em Andaraí, ouviu estórias, vivenciou um passado ainda latente, e, com a alma em chamas foi ungido para escrever, registrar a Odisséia das Lavras Diamantinas
Herberto viveu nas terras outrora férteis em diamantes, em Andaraí, ouviu estórias, vivenciou um passado ainda latente, e, com a alma em chamas foi ungido para escrever, registrar a Odisséia das Lavras Diamantinas
Nada como a memória com o necessário talento para temperar um bom livro.
Na passagem comemorativa dos 50 anos de Cascalho, em Salvador, tive a oportunidade de conhecer, em carne e osso, o autor da saga do garimpo. Eu tinha, formigando, já um bom tempo, uma utopia confessada a mim mesmo e gente próxima, de roteirizar o romance Cascalho. Conversando com ele, o próprio, Herberto, temperados ambos, com doses de Whisky, aproveitando a licença poética do momento, eu disse: “Tinha vontade de filmar o seu livro”, laconicamente ele me respondeu: “Faça o roteiro e me mande”.
Mergulhei de corpo e alma nas páginas daquele livro cinquentão, jamais imaginei o quanto de terrível é mexer na criação alheia. Adaptar uma obra literária para o cinema, é uma espécie de ato de heresia a cada vez que se suprime um personagem, corta pedaços da estória, espreme o enredo para caber no filme, entre outras intrusões... Enfim, pisa-se no solo sagrado da criação...
O roteiro técnico ficou pronto, submetido ao crivo do autor, foi aprovado e sacramentado. A partir daí só restava cair em campo, confiando na Corte Celeste de plantão e no Axé dos Orixás.
Herberto Sales, selou sua cumplicidade com o nosso projeto, com um texto do gênero a quem interessar possa... Vai na íntegra:
“Caro amigo ( ou amiga ) – O portador destas mal traçadas linhas é o conhecido homem de cinema Tuna Espinheira, de quem tenho o prazer de ser amigo e admirador, nem se fala.
Ele está ( para minha honra ) tratando de fazer um filme do meu romance Cascalho. Deus o ajude.
Faça de conta que quem está apresentando esta carta sou eu. Todavia, sou bastante modesto para reconhecer que Tuna Espinheira ( se isso é possível ) me representa melhor que eu próprio.
E isto é verdade e dou fé”.
Herberto Sales,
São Pedro da Aldeia – 10.04.95.
Ele está ( para minha honra ) tratando de fazer um filme do meu romance Cascalho. Deus o ajude.
Faça de conta que quem está apresentando esta carta sou eu. Todavia, sou bastante modesto para reconhecer que Tuna Espinheira ( se isso é possível ) me representa melhor que eu próprio.
E isto é verdade e dou fé”.
Herberto Sales,
São Pedro da Aldeia – 10.04.95.
Herberto já não estava entre nos quando (em 2003) seus personagens se encarnaram nos atores: Wilson Mello, Othon Bastos, Gildasio Leite, Lúcio tranchesi, Irving São Paulo, Arildo Deda, Agnaldo Lopes, Emanuel Cavalcanti, Caco Monteiro, Rosa Espinheira, Jorge Coutinho, Bertho Filho, Julio Góes e povoaram a cidade de Andaraí (terra natal do escritor ), onde se passa a estória, nos anos trinta. No cenário exuberante da Chapada Diamantina.
Só no final do ano 2008 – DC – O filme em questão, ficou pronto, ou seja, com a armadura necessária para as exigências técnicas do mercado comercial. Infelizmente (não cabe aqui chorar aos pés do Caboclo) sem condições de bradar aos quatro ventos sua chegada ao escurinho do cinema... Não temos a menor dúvida que a propaganda é a alma do negócio... Por conta da circunstancia particular nossa, com Deus é servido... Sugerimos aos espectadores de boa vontade, se estiverem de acordo, fazer o boca a boca, avisando aos não avisados, seria esta, de resto, uma maneira de tentar não permitir que, a correnteza do descaso arraste ao Deus dará... Mais este filme para o ossuário geral da Utopia do fazer cinema no Brasil.
Sem propaganda o fita em cartaz tem vida curta. Portanto os primeiros serão os primeiros, dificilmente os últimos chegarão primeiro... É só prestar atenção ao terceto final do exemplar e coincidente (com vistas à nossa estória) soneto de Mário Quintana: “Pobres cartazes por aí afora/Que anunciam: Alegria – Risos/ Depois do Circo já ter ido embora”.
O cinema não tem vocação para a clandestinidade... Que os anjos nos digam Amém... Aleluia!!!!!!!"
Tuna Espinheira e-mail: tunaespinheira@terra.com.br
Tuna Espinheira é cineasta, roteirista e diretor do filme: Cascalho