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28 junho 2012

Luiz Wendhausen (1945/2012)


Luiz Carlos Araújo, mais conhecido como Lula Wendhauser, morreu terça passada, e não teve tempo de ver nas telas o seu projeto tão sonhado: Velas ao vento, roteiro de um longa que preparava há mais dez anos, e que trata da angústia de sua geraçao. Fascinado pelas imagens em movimento desde cedo, Lula passou a vida dedicada ao cinema. Realizou alguns curtas como Ulla (sobre uma mulher que foi estuprada na Boca do Rio dos tempos da paz e do amor), A barca de Noel, A trajetória de um zagueiro, entre outros  e, no momento, dedicava-se a alguns projetos alem de Velas ao vento: Bye, Bye Babilônia, Um chocolate, por favor, O grito da tela. Funcionário há muitos décadas do Departamento da Imagem e Som (DIMAS) da Fundação Cultural do Estado da Bahia, a sua morte causou consternação entre os seus colegas cineastas. Segundo soube, contava já 67 anos, embora não parecesse. Conheci-o há mais de 40 anos, quando fomos colegas no curso de Cinema dado por Walter da Silveira em 1968, mas o contato mais intenso se verificou quando ele me foi apresentado pelo saudoso fotógrafo de cinema Carlos Alberto Vaz de Athayde. Convidou-me em 1971 para ser seu parceiro no roteiro de A barca de Noel, mas depois o projeto sofreu muitas modificações.

Há dez anos, mais ou menos, para viabilizar as filmagens de Velas ao vento, convidou Rogério Sganzerla para dirigi-lo. O autor de O bandido da luz vermelha aceitou. A decisão de Lula foi tomada porque o nome de Sganzerla na direção, achava ele, facilitaria o processo de captação de recursos. Veio me mostrar a nota que saiu na Folha de São Paulo em página inteira. Mas, não sei por que cargas d'água, o projeto não deu certo. Lula Wendhausen tinha a sensibilidade à flor da pele, e, quando gostava de uma ideia, ao imaginá-la, chegava a chorar de emoção. Quando mais moço, atuou em teatro, e me lembro de O médico à força, de Molière, nos já distantes anos 60, em que faz um personagem, nesta peça montada pelo Teatro dos Novos e dirigida pelo célebre João Augusto.

Fica o registro e a saudade.

P.S: O desenho é de autoria de Caó Cruz Alves.
Maiores informações sobre os projetos de Lula no blog de Adalberto Meirelles:  
 http://pontocedecinema.blog.br/blog/os-projetos-de-lula-wendhausen-um-cineasta-que-ansiava-para-dar-o-grito-da-tela/


27 junho 2012

O rosto humano como paisagem

Clique na imagem para vê-la robusta
O DVD de Era uma vez no Oeste, de Sergio Leone, lançamento em edição especial, cheia de extras, que estava, há pouco tempo, no saldão de conhecida loja de departamentos, é, simplesmente, uma beleza. O filme, com o passar do tempo - é de 1968, ficou ainda melhor, não perdendo em nada do seu impacto inicial, quando o vi pela primeira vez na gigantesca tela do cinema Tupy em cópia de 70mm. Ainda que a dimensão da tela doméstica não possua o mesmo poder de envolvimento e êxtase - sim, é a palavra correta em se tratando de uma obra-prima como essa, momento, sem exagero, de rara inspiração em toda a história da arte do filme, vejo Era uma vez no Oeste como se fosse uma sinfonia, como se uma música de imagens.

A partitura do maestro Ennio Morricone está tão entrosada no filme que faz parte dele, e, neste caso, poderia dizer que Morricone é uma espécie assim de co-autor da obra da mesma maneira como Michel Legrand o é de Os guarda-chuvas do amor, de Jacques Demy. Morricone, com sua extraordinária musicalidade, exerce, aqui, em "Era uma vez no Oeste", não apenas uma complementação da narrativa, mas uma mise-en-musique.

E Leone é um esteta, um mestre absoluto, que sintetiza, neste "western sui generis", toda a sua primeira fase constituída de obras que "rascunham" esta belíssima reflexão sobre a estética westerniana num prisma novo e insinuante, apátrida, singular e original. Quem viu Por uns dólares a mais, Por um punhado de dólares e O bom, o mau e o feio - também conhecido por Três homens em conflito - pode testemunhar que estes filmes são uma "anunciação" de Era uma vez no Oeste.

A sua revisão comprova a magnificência de Sergio Leone que, nos anos 80, com seu canto de cisne, Era uma vez na América, traumatizou toda uma década, realizando uma das maiores obras de toda a história do cinema. Pena que a morte prematura - ia fazer 60 anos - o tenha levado embora.

Morricone compôs quatro temas fundamentais destinados a cada um dos personagens principais: Claudia Cardinale, Jason Robards, Charles Bronson e Henry Fonda - magnífico no papel de vilão, cínico, cruel, frio, super-maquiado, super-estilizado, capaz de matar até criancinhas com irrepreensível sangue frio. Quando os personagens se cruzam, as partituras também entram em rodízio com um resultado impressionante em se tratando da relação música e imagem.

A sequência inicial, de abertura, é uma obra-prima à parte, que mostra a espera, por três pistoleiros, em uma velha e encardida estação, da chegada do trem. Morricone chegou a compor um tema, mas desistiu e, influenciado por John Cage - para quem todo ruído num concerto é música, fez dos ruídos uma espécie de "sinfonia". Assim, o estalar dos dedos de um dos pistoleiros, a gota d'água que cai modorrenta no chapéu de Woody Strode, a mosca que fica zoando no rosto de Jack Élan, o ranger do moinho, a chegada estrepitosa do trem, etc, formam uma tensão inusitada.

Claudia Cardinale agita a paixão dos homens e, neste filme, encontra-se no auge da beleza. A mulher é aqui objeto do desejo de três homens rudes e sedentos: Henry Fonda, Jason Robards Jr, Charles Bronson. Com a perda do marido, um fazendeiro, em dia de festa, que é assassinato cruelmente pelo bando de Henry Fonda, resta a ela, sozinha, enfrentar uma vida nova, recomeçar de novo.

A tomada que apresenta a sua entrada na cidade e que mostra, em grua, a sair da estação, o movimento da cidade, é imensamente bela e impactante. Dá-se no momento em que Claudia sai do trem e entra na cidade, que, movimentada, encontra-se, somente na aparência, indiferente à sua beleza.

Leone tem um sentido de duração que difere da maioria dos cineastas, aproximando-se mais, na utilização do tempo cinematográfico, dos realizadores japoneses. Gosta de alternar extremos "close ups" com planos gerais de grande amplitude, provocando, com isso, um contraste nos códigos perceptivos. Mas, para Leone, o rosto humano não é uma face oculta, mas, e principalmente, também uma paisagem. Seus closes demoram na tela, enchendo-a, para perscrutar a alma humana, para adentrar na interioridade dos seres. Tudo é muito estilizado e rigoroso sem perder, contudo, o caráter de introspecção.

Não resta dúvida que o melhor filme dos anos 80 foi um Leone, e, aliás, o seu derradeiro, que lembra a segunda parte do monumental O poderoso chefão (The godfather, 1974), de Francis Ford Coppola. Mas o que assombra em Era uma vez na América, assim como em Era uma vez no Oeste, é a fascinante, envolvente, mise-en-scène leonina.

O argumento de C'era una volta in West/Once upon a time in West foi escrito a seis mãos: as de Bernardo Bertolucci, o consagrado cineasta de O último tango em Paris, as de Dario Argento, diretor "cult" de terroríficos e crítico afamado, e as de Sergio Donati, que ficou responsável pela decupagem, além, é claro, da participação de Leone em todas as fases do processo de criação cinematográfica.

O DVD é especial mesmo e tem muitos extras, inclusive um documentário precioso com depoimentos de Tonino Delli Colli, o fotógrafo, Alex Cox, Gabrielle Ferzetti, Bertolucci, Claudia Cardinale, Henry Fonda, entre outros.
Para assistir de joelhos.

25 junho 2012

A trajetória do autor do blog

Nasci em 12 de outubro de 1950, no Rio de Janeiro, precisamente na Tijuca, mas ainda em tenra idade vim para Salvador. Minha mãe, daqui, conheceu meu pai durante um passeio à Cidade Maravilhosa. Casaram-se em 1948 e permaneceram no Rio. Grávida do terceiro filho, em abril de 1953, meu pai, num sábado de Aleluia, chegando a casa, sentiu dor lancinante no coração e, em questão de minuto, estava morto, roxo, com a fisionomia deformada pela angústia e pela dor do enfarte agudo do miocárdio. Tinha apenas 44 anos, deixando-me, como herança, a cidadania italiana - que adquiri, pois ele era do sul da Itália, imigrante que veio no princípio do século com os pais, descascando, menino ainda, batatas no porão do navio - e uma pesada herança cardíaca, candidato a um heart attack, que já tive, pois praticava, com muito prazer, o tabagismo desenfreado, os porres semanais de álcool, o sedentarismo cômodo e delicioso de não ter que me movimentar muito, exceção se faça ao exercício de levantamento de copos, cuja habilidade, tenho-a comprovada.

Meu avô materno - também italiano que possuía fazendas de cacau em Ilhéus - alternava a moradia entre esta cidade litorânea do interior da Bahia e Salvador, onde tinha uma casa de muitos quartos, velha, mas atmosférica, no bairro de Nazaré. Apesar de ter parentes no Rio por parte da família Setaro, e, ainda, duas tias por parte materna, que moravam nesta cidade cantada em prosa e verso, vim para Salvador por causa do convite feito por meu avô. Como este ficava mais tempo em Ilhéus, minha mãe teria a casa de Nazaré à sua disposição.

Assim entrei na baianidade pela porta da morte paterna. Sou baiano em decorrência de uma estenose que explodiu de forma extemporânea. Naquele tempo não havia os sofisticados exames atuais, fazia-se, se muito, um eletro, uma tirada de tensão arterial. Meu pai nunca tinha ido a um médico, apesar de já ter dado sinais da insidiosa arteriosclerose: vermelho, a tensão parecia-lhe alta, queixando-se de taquicardia etc.

Os cinemas se concentravam no centro - Excelsior, Liceu, Art, Glória (depois Tamoio), Guarany, Bahia (que somente foi inaugurado em 1968) e, no Largo 2 de Julho, o Capri.
Na Baixa dos Sapateiros, ficavam o Tupy e, no corredor da rua J.J. Seabra, os poeiras Jandaia - ainda majestoso, Aliança e Pax. Sem contar os cinemas de bairro. Cada um tinha o seu: Oceania (no Farol da Barra, no edifício do mesmo nome), Nazaré (na Praça Almeida Couto, no Jardim de Nazaré), Amparo (no Engenho Velho de Brotas), Brasil, São Jorge e São Caetano (na Liberdade), Itapagipe, Roma, entre muitos outros.

A Rua Chile era o ponto chique da cidade. A maioria dos consultórios médicos - ainda não existia Rita Lee, digo a Garibaldi, das lojas, dos dentistas, das livrarias, aí se concentrava. Tenho saudades da casa de chá das Lojas Duas Américas - não esqueço da primeira escada rolante instalada na Bahia, que os soteropolitanos ficavam admirando, parados, estupefatos, onde uma tia minha tomou uma queda que a deixou dois meses de cama - e da Sloper. E da porta da Livraria Civilização Brasileira - que incendiou em 1965, quando estava dentro do Tamoio a ver Dr Fantástico (Dr. Strangelove), de Stanley Kubrick. Lembro-me do misterioso crime da Livraria Científica, quando mataram, à queima-roupa, o seu dono. Políticos e intelectuais, a las cinco de la tarde, se reuniam religiosamente na porta da Civilização, formando rodinhas onde o papo corria solto. As moçoilas elegantes da época - e não as lacraias da contemporaneidade - faziam o flirt, que consistia numa olhada rápida para um homem bem apessoado, podendo, nisso, dar-se o início de um namoro. E vice-versa. 

Adorava o cinema Guarany com aquele cheiro de ar condicionado que se sentia de fora, na Praça Castro Alves. E, ao lado, o famoso Restaurante e Bar Cacique, onde, na parte ao ar livre, os intelectuais da época gostavam de ficar tomando cerveja. Entre o Guarany e o Cacique, mais para o fundo, o Tabaris, que, menino, ficava olhando curioso, principalmente aquela placa azul onde estava inscrito: rigorosamente proibida a entrada de menores de 21 anos. Diziam-me adultos que o freqüentavam - sempre de paletó e gravata, manga de camisa era para vagabundo, assim como barba de dois dias - que mulheres lindas ali faziam ponto, vindas da França, Polônia, Argentina etc. Dançava-se e bebia-se ao som de orquestra de sopro regida, muitas vezes, pelo saudoso Vivaldo da Conceição, quando não apareciam - e apareciam sempre - orquestras nacionais e internacionais.

Uma noite, saindo do Guarany, com 13 anos, fiquei olhando para aquelas mulheres lindas, frustrado por ser menor de idade, com o porteiro me olhando feio, apontando para a placa impeditiva. O Tabaris encerrou suas atividades etílicas, musicais e sexuais em 1968, quando completei 18 anos. 

Menino de Nazaré, aproveitava os terrenos baldios para jogar um baba, com a bola feita com meias velhas. E, num elevado perto de minha casa, gostava de empinar arraias. Tinha todo o material necessário: cola para a linha, vidro picado e as grandes e belas pipas, coloridas, bonitas de ver no céu, paradas, enquanto as controlava com os meus dedos insignificantes, sentindo a força de seu puxão. No mais das vezes, andava e andava - chamava-se de paleta, paletar - muito, conversando com os camaradas de ocasião, espiando as meninas do Convento do Sagrado Coração de Jesus, ajudando a missa de Padre Lemos todos os domingos na Igreja do mesmo nome, que fica, ainda, em frente à famosa Mendoeira e ao lado da antiga e saudosa Faculdade de Filosofia, onde tinha um pé de jambo que gostava de roubar. Havia ali, entre a igreja e a faculdade, a banca de Seu Paranhos, onde, todos os sábados, meio-dia, avistava um caminhão jogar um pacote de jornais A Tarde, que comprava com assiduidade neste dia para ver os filmes que iam estrear na segunda-feira - naquela época os cinemas mudavam as suas programações neste dia.

Lia também livros, como Tarzan, de Edgar Rice Burroughs, Servidão humana, de Somerset Maugham, livros de George Simenon, José de Alencar, Morris West (A filha do silêncio, O advogado do diabo), Harold Robbins, Joaquim Manoel de Macedo, Graciliano Ramos, e os que encontrava na biblioteca da escola. E gostava de comprar o Correio da Manhã aos domingos, revezando com o calhamaço de O Estado de S.Paulo e o Jornal do Brasil. Nestes bons tempos, os jornais do sul somente eram vendidos na Praça Municipal e quem os quisesse adquirir tinha que ir até lá. Foi aí, com 12, 13 anos, que comecei a ler o crítico do Correio Antonio Moniz Vianna.

O primeiro filme que vi foi Um estranho no paraíso, musical de Vincente Minnelli, naquele cinemascope do Guarany. Lembro-me da estréia de Os dez mandamentos, de Cecil B. De Mille, em Salvador, em 1959. Para se ter uma idéia do atraso dos filmes, esta superprodução é de 1956 e somente três anos depois chegou a Salvador. Neste particular, os filmes eram lançados primeiro no Rio e São Paulo e levavam, muitas vezes, mais de um ano para aqui serem exibidos em Salvador. Assim, como ia muito ao Rio, pois tinha hospedagem gratuita, assistia, em primeira mão, a muitas fitas que somente muito tempo depois aportariam nestas plagas. Mas voltando a Os dez mandamentos, o seu lançamento, no Tupy, foi um acontecimento. Filas quilométricas por toda a Baixa dos Sapateiros. Duas sessões apenas: às 15 e 21 horas. Duas filas: uma para comprar o ingresso e outra 'para entrar'. Lembro-me que cheguei às 14 horas, consegui comprar o ingresso às 16 horas e fiquei na sala de espera apinhada de gente a esperar a sessão das 21. Tinha também vendedores de ingressos, os cambistas, que, lógico, cobravam mais caro. O mesmo aconteceu com o lançamento de Ben-Hur e, antes, antes mesmo de Os dez mandamentos, com A volta ao mundo em 80 dias, de Michael Anderson, com David Niven e Cantiflas e um elenco de centenas de astros em pequenas pontas como Marlene Dietrich, Frank Sinatra, Fernandel...

Minha formação cinematográfica se fez indo ao cinema e através do cinema de gênero: épicos históricos, comédias, musicais, thrillers, aventuras, policiais, e, principalmente, o western. O cinema nacional vivia a sua fase de chanchada. Vi muitas, com Oscarito, Zé Trindade, Grande Otelo, Ankito, Colé, Vagareza, Violeta Ferraz, Renato Restier, Cyll Farney, Sonia Mamede, Fada Santoro, Adelaide Chiozzo etc, etc. Filmes como De vento em popa, O homem do sputnick, Nem Sansão nem Dalila, Matar ou correr, todos estes de Carlos Manga, e, com Zé Trindade, Mulheres, cheguei!, O batedor de carteiras, O camelô da rua larga, O massagista de madame, Aguenta o rojão. Não posso citá-las aqui, porque transbordaria o espaço. Falava-se muito na Vera Cruz e, principalmente, em O cangaceiro, filme nacional, o mais visto até há poucas décadas. De repente, vi Rio zona norte, de Nelson Pereira dos Santos, e estranhei Grande Otelo em papel dramático, que perde o filho assassinado, como um compositor popular que tem suas músicas roubadas por um aproveitador.

Nesta época o cinema americano médio não tinha a nulidade dos tempos atuais. Era, na verdade, um grande cinema, aquele do qual François Truffaut considerou como o cinema do 'grande segredo'. Nos anos 50, havia realizadores como Stanley Kubrick, Robert Aldrich, Budd Boeticher, William Wyler, John Sturges, John Ford, John Huston, Vincente Minneli, George Cukor, Richard Brooks, George Seaton, Frank Tashlin, Alfred Hitchcock, Roger Corman, Raoul Walsh, Henry Hathaway, Jacques Tourneur, Howard Hawks, Leo McCarey, Anthony Mann etc, etc e mais etc. Que outra cinematografia reunia uma galeria de talentos tão grandes? Atualmente a maioria dos grandes diretores morreu e os estúdios são controlados por multinacionais estranhas ao cinema, como a Mitsubishi, a Coca-Cola...

Ver Spartacus, de Kubrick, na tela do cinema, foi uma experiência duradoura, assim como a comédia Se meu apartamento falasse, de Billy Wilder, ou Rio Bravo, western de Howard Hawks, ou 'Deus sabe quanto amei', melodrama refinadíssimo de Vincente Minnelli, ou a estesia melodramática de um Douglas Sirk - Palavras ao vento, Imitação da vida, 'Tudo isso e o céu também'. A infantilização do cinema americano se deu há algumas décadas com as guerras nas estrelas. O cinema como expressão da arte ou, melhor dizendo, o filme como arte, conheci-o aos poucos, com minhas idas ao Clube de Cinema da Bahia. Estudante secundário do Colégio Estadual da Bahia, filava aulas aos sábados para ver filmes no Guarany, onde Walter da Silveira, o programador do clube, os exibia em 1966. A primeira vez que me impactei com uma obra cinematográfica, considerando-a 'verdadeira expressão da arte', foi com O eclipse (L'eclisse), de Michelangelo Antonioni. Também fiquei muito extasiado quando vi Deus e o diabo na terra do sol, de Glauber Rocha. No clube, conheci Eisenstein, Resnais, Fellini, Luchino Visconti (seu Rocco e seus irmãos é uma obra-prima absoluta), Akira Kurosawa, François Truffaut, Yasujiro Ozu, Masaki Kobayashi, Kenji Mizoguchi (seu Contos da lua vaga me assombra até hoje), Godard, Jacques Rivette, Welles, Jules Dassin, Murnau, Fritz Lang et caterva.

24 junho 2012

Esclarecimentos sobre a Sala Walter da Silveira

Clique na imagem para vê-la ampliada



Sobre a nota que dei aqui protestando contra a retirada das fotografias ampliadas do ensaísta cinematográfico baiano Walter da Silveira, recebi esclarecimentos a respeito da Diretoria do Audiovisual/DIMAS da Fundação Cultura do Estado da Bahia.

Salvador, 22 de junho de 2012

Estimado André Setaro,

Vimos, por meio desta, apresentar esclarecimentos aos fatos citados no texto intitulado “Um crime contra a memória de Walter da Silveira”, publicado em seu blog no último dia 7 de junho.

As fotografias de Walter da Silveira que estavam expostas no foyer da Sala Walter da Silveira eram reproduções de fotos originais, impressas especialmente para uma exposição realizada pela Dimas no ano de 2006. A fim de aproveitar o material, bem como prestar mais uma justa homenagem a uma das maiores personalidades do cinema baiano, decidimos realizar uma exposição permanente no foyer da sala, a partir do ano seguinte (2007). Após reforma, o foyer foi reaberto sem as fotografias, uma vez que as mesmas – após prolongado período de exposição – se encontravam esmaecidas, devido à ação da luz solar. Acolheremos, portanto, sua crítica como uma sugestão para que uma nova exposição permanente de fotos seja realizada no local.

Em 2010, com o fim de atender a exigências legais no que tange a acessibilidade, higiene e segurança, e também com o objetivo de proporcionar maior conforto aos frequentadores do espaço, foi iniciada uma pequena reforma no foyer. A intervenção englobou ações como a troca de móveis; pintura; substituição do teto de gesso; e, conforme mencionado, adequações visando à acessibilidade do espaço. Entre as adequações voltadas a este fim, estão a reforma dos banheiros (local até então inacessível a cadeirantes) e mudanças no layout do espaço, visando à liberação do acesso de deficientes à sala através de elevador (este acesso permanecia fechado, já que a área do mesmo havia sido transformada em depósito). A sala passa por um processo de requalificação e o processo de aquisição de novo projetor se encontra em tramitação.

Por fim, no que tange à memória de Walter da Silveira, informamos que se encontra em fase de conveniamento com o Fundo de Cultura/SecultBA um projeto idealizado pelo neto do ensaísta e crítico cinematográfico, Paulo Silveira, cujo objetivo é salvaguardar parte significativa do acervo pessoal de Walter. São milhares de fotos, slides, textos, cartas, cadernos de anotação, pinturas e roteiros que compõem um conjunto documental de grande relevância, capaz de traduzir a força do seu trabalho e do seu pensamento. Para nós, essa é uma ação de extrema relevância e que, de fato, vai assegurar a preservação da memória de Walter da Silveira, por isso apoiada pela SecultBA.

Em tempo, agradecemos seu interesse em colaborar para o fortalecimento da Sala Walter da Silveira, que, nos últimos dois anos, vem brindando os cinéfilos com uma programação qualificada. Foram muitas mostras realizadas, a exemplo dos ciclos Marguerite Duras, Eric Rohmer, John Cassavetes, Kieslowski, Andrzej Wajda, Alejandro Jodorowsky, entre outros.

Estamos à disposição para críticas e sugestões.

Atenciosamente,
Diretoria de Audiovisual/DIMAS
Fundação Cultural do Estado da Bahia