A crítica, qualquer crítica, quando preparada para analisar uma obra, geralmente se arroga no direito de decidir sobre o seu valor estético, pensando estabelecer, com isso, a sua sorte. Claro que existem exceções, evidente que há aqueles que sabem interpretar com o equilíbrio necessário, ponderando as suas observações em função do exame estrutural da obra. Outros, mais afoitos, tentam, com palavras duras, destruir o que foi feito, não poupando palavras mais capazes de construir melhor as diatribes do que convenientes ao sabor analítico coerente e lúcido. Muitos se prendem às circunstâncias e procuram não destoar da opinião geral, com medo de ser tachado de dissonante. Embora necessária, vital, muitas vezes, para tirar de campo os falsos artistas e os falsos profetas, a crítica precisa se despir de sua arrogância e, no caso do cinema, procurar realizar, se isso for possível, uma espécie de desintelectualização a fim de eliminar, da crítica, os jargões, as exigências descabidas na procura de significados recônditos somente existentes na cachola de críticos que querem mostrar uma pseudo-erudição travestida de análise.
Mas se deixando para lá o problema da crítica e de seus cdfs, gostaria de dizer, aqui, algumas palavras sobre um curta que vi ontem: Imagens do Xaréu, de Marília Hughes, documentário que tenta mostrar o que aconteceu com a outrora tão festejada pesca do xaréu, que foi tema, inclusive, de dois filmes de um pioneiro do cinema baiano, Alexandre Robatto, Filho, que, em Entre o mar e o tendal (1953) e Xaréu (1953), procurou fazer uma espécie de cântico à pesca do referido peixe e a seus sofridos e lutadores pescadores. Hughes, com seu pequeno filme, cujo roteiro fora premiado no concurso do governo estadual, o Prêmio Agnaldo (Siri) Azevedo, procura mostrar o que aconteceu, nos tempos atuais, com os pescadores do xaréu. O documentário, no entanto, tem um alcance maior que é o da reflexão das imagens de um presente desiludido com as de um pretérito de entusiasmo. É a imagem da pesca do xaréu em suas duas manifestações que determina o desenvolvimento da idéia de Marília Hughes, é a imagem cinematográfica quem conduz a narrativa de Imagens do xaréu na procura de iluminar, por meio da imagem pretérita projetada, a realidade do presente, que contradiz a abundância do passado. Se, antes, durante a efervescência da pesca do xaréu, os pescadores, ainda que com peixes fartos, não podiam desfrutar das benesses da natureza, pois eram pagos não em dinheiro, como frisou o filho de Alexandre, Sylvio Robatto, mas em pequenas quantidades de peixes, a realidade atual é pior, pois uma paisagem de completo desalento. Não estaria aqui, neste particular, a gênese de Barravento, de Glauber Rocha?
Marília Hughes revela, a cada tomada, um apuro de composição com o fito de estabelecer, nos planos individuais, uma produção de sentidos particular que se vai somando para um sentido mais abrangente, que é o próprio filme, assim como se cada plano fosse uma tentativa de dar um sentido strictu sensu que, plano a plano, grão a grão, faz parte da composição do afresco final. Perpassando o desenvolvimento da narrativa, a imagem do xaréu, que se encontra presente até mesmo em locações específicas, como um super mercado. É como se o xaréu pertencesse (como pertence) à cultura da comunidade, fazendo dela parte inexpugável.
Tem-se, na estrutura de Imagens do Xaréu, filmagens in loco da paisagem, dos depoimentos dos antigos que ainda se lembram da pesca do xaréu, e as imagens de arquivo, que mostram tomadas de Entre o mar e o tendal. Compor uma relação entre o presente e o pretérito do xaréu parece ser o móvel da realização do documentário. Este, no entanto, não se limita a apresentar as imagens deslocadas no tempo, mas a sua tentativa é no sentido de intercalá-las num processo de simbiose como que dando a entender que a imagem do xaréu se encontra na consciência dos pescadores do presente e, da constatação do passado, uma desesperança quanto ao futuro.
O que se pode dizer em relação à estrutura de Imagens do Xaréu é que o apoio dele está nos depoimentos, sendo um filme, portanto, que se alicerca nos depoimentos e nas imagens dos pescadores. Mas o propósito de Marília Hughes não foi o de reinventar a linguagem do documentário.
Mas se deixando para lá o problema da crítica e de seus cdfs, gostaria de dizer, aqui, algumas palavras sobre um curta que vi ontem: Imagens do Xaréu, de Marília Hughes, documentário que tenta mostrar o que aconteceu com a outrora tão festejada pesca do xaréu, que foi tema, inclusive, de dois filmes de um pioneiro do cinema baiano, Alexandre Robatto, Filho, que, em Entre o mar e o tendal (1953) e Xaréu (1953), procurou fazer uma espécie de cântico à pesca do referido peixe e a seus sofridos e lutadores pescadores. Hughes, com seu pequeno filme, cujo roteiro fora premiado no concurso do governo estadual, o Prêmio Agnaldo (Siri) Azevedo, procura mostrar o que aconteceu, nos tempos atuais, com os pescadores do xaréu. O documentário, no entanto, tem um alcance maior que é o da reflexão das imagens de um presente desiludido com as de um pretérito de entusiasmo. É a imagem da pesca do xaréu em suas duas manifestações que determina o desenvolvimento da idéia de Marília Hughes, é a imagem cinematográfica quem conduz a narrativa de Imagens do xaréu na procura de iluminar, por meio da imagem pretérita projetada, a realidade do presente, que contradiz a abundância do passado. Se, antes, durante a efervescência da pesca do xaréu, os pescadores, ainda que com peixes fartos, não podiam desfrutar das benesses da natureza, pois eram pagos não em dinheiro, como frisou o filho de Alexandre, Sylvio Robatto, mas em pequenas quantidades de peixes, a realidade atual é pior, pois uma paisagem de completo desalento. Não estaria aqui, neste particular, a gênese de Barravento, de Glauber Rocha?
Marília Hughes revela, a cada tomada, um apuro de composição com o fito de estabelecer, nos planos individuais, uma produção de sentidos particular que se vai somando para um sentido mais abrangente, que é o próprio filme, assim como se cada plano fosse uma tentativa de dar um sentido strictu sensu que, plano a plano, grão a grão, faz parte da composição do afresco final. Perpassando o desenvolvimento da narrativa, a imagem do xaréu, que se encontra presente até mesmo em locações específicas, como um super mercado. É como se o xaréu pertencesse (como pertence) à cultura da comunidade, fazendo dela parte inexpugável.
Tem-se, na estrutura de Imagens do Xaréu, filmagens in loco da paisagem, dos depoimentos dos antigos que ainda se lembram da pesca do xaréu, e as imagens de arquivo, que mostram tomadas de Entre o mar e o tendal. Compor uma relação entre o presente e o pretérito do xaréu parece ser o móvel da realização do documentário. Este, no entanto, não se limita a apresentar as imagens deslocadas no tempo, mas a sua tentativa é no sentido de intercalá-las num processo de simbiose como que dando a entender que a imagem do xaréu se encontra na consciência dos pescadores do presente e, da constatação do passado, uma desesperança quanto ao futuro.
O que se pode dizer em relação à estrutura de Imagens do Xaréu é que o apoio dele está nos depoimentos, sendo um filme, portanto, que se alicerca nos depoimentos e nas imagens dos pescadores. Mas o propósito de Marília Hughes não foi o de reinventar a linguagem do documentário.
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