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...E o vento levou em 2007
Das agruras do cinema baiano
Digo já e logo que a foto ao lado é da Chapada Diamantina, em Lençóis, interior da Bahia, locação de Cascalho, de Tuna Espinheira, ao qual passo, aqui, a palavra, para falar das agruras pelas quais passa a fim de conseguir colocar o imprescinídvel Dolby Stereo para poder comercializar o seu filme. Bom de copo, desses que quando começam a beber uma cervejinha vão até o limite da irresponsabilidade, Espinheira é cineasta há mais de 30 anos e o conheço mais ou menos desta época. Autor de uma porção de curtas, muitos deles premiados, em Cascalho experimenta o longametragista a se apoiar no livro homônimo de Herberto Salles, que, antes de morrer, lhe deu, expressamente, via papel assinado, autorização para fazer a transfer dos signos verbais para os signos icônicos. No elenco, Othon Bastos, Wilson Mello, Gildásio Leite, Irving São Paulo, e o cenário, belíssimo, da Chapada Diamantina. O filme é de época e se desenrola na década de 30. Abrindo as necessárias aspas, passo a palavra ao velho Tuna:
"Durante todo o ano de 2007, desenvolvemos uma luta feroz, com lances de desabridos pedidos de SOS. Fizemos correr o chapéu. Tentamos, em vão, sensibilizar a representação regional da Petrobrás, editais municipais, outros descaminhos, etc. etc. À beira de recorrer às mensagens engarrafadas atiradas ao mar, eis que, conseguimos aprovação no Fundo de Cultura, FCBA, em licitação pública. O que veio a representar a indefectível taboa da salvação, mesmo tendo sido o orçamento guilhotinado em mais de um terço do seu valor original. Enxergaram gordura, onde havia apenas pele e osso. Era pegar ou largar, não polemizamos, não deixamos afetar o humor. Bola pra frente.
Estamos falando aqui da saga do filme, CASCALHO, no objetivo, indômito, voltado para conseguir a finalização sonora no sistema Dolby Digital – 5.1. Esta roupagem técnica é imprescindível para o acesso ao escurinho do cinema comercial. Mais de noventa por cento das salas exibidoras estão aparelhadas com o sistema citado, 5.1. Explica-se aí, a persistência, e a vergonha, deixada um pouco de lado, para não morrer na praia.
A arte cinematográfica jamais teve vocação para a clandestinidade, precisa do púbico, principalmente, quando possível, ter alguma empatia, com este precioso público, para o qual ele foi feito. Não podemos perder de vista a ajuda da imprensa local, nosso filme, em colunas diversas, foi lembrado e registrado, na sua condição vexatória, de impedido de participar do mercado nas salas de cinema. O, então colunista, do Jornal A Tarde, Vitor Hugo Soares, em pelo menos, quatro de suas crônicas, publicadas aos sábados, fez referencias contundentes à situação de vida e morte da fita que estamos falando.
Para um melhor esclarecimento do leitor, no sentido de dirimir a impressão de ser este texto uma arenga puramente particular, sem eira nem beira para o interesse do conhecimento público, temos a dizer que, o filme, CASCALHO, baseado no clássico da literatura brasileira, do mesmo nome, de Herberto Sales, ganhou, em licitação pública, o concurso de roteiros, denominado Fernando Coni Campos, instituído pelos Governo do Estado da Bahia, é, portanto, um filme genuinamente baiano, produzido com dinheiro do erário público, todo rodado nas Lavras Diamantinas, no município de Andaraí. Mais de oitenta por cento dos técnicos e atores representam a mais polida prata da casa.
Queremos também deixar claro que, sabíamos todo o tempo, da dureza de uma caminhada franciscana. Tratava-se de um filme de baixo orçamento. Cutucamos o impossível com vara curta. Estamos escrevendo para comunicar e comemorar: Habemos filme!!! Pronto para adentrar no escurinho do cinema. Pronto para caminhar com suas próprias pernas.
Resta agora, torcer para que, com a benção da Corte Celeste e o Axé dos Orixás, CASCALHO, possa vir conquistar, alguma que seja, a empatia com o espectadores. Como cada cabeça é um mundo. Esperar, daqueles que lhe torcerem o nariz, pelo menos, também desejarem que a terra lhe seja leve."
tunaespinheira@terra.com.br
26 dezembro 2007
O céu que nos protege
Cristo nasceu em Éboli
Para se fazer uma lista dos melhores do ano, e assim foi durante mais de três décadas, havia de se escolher entre os filmes lançados na sua capital durante o ano. Possa ser que, agora, com a revolução tecnológica, com o advento da Confraria dos Baixistas, a disponibilidade de títulos raros em DVD, a coisa tenha mudado. Homero Azevedo, professor de cinema da Paraíba, acha, inclusive, que uma lista de melhores pode absorver, a considerar as mudanças dos últimos anos, até filmes do século passado. Ele, por exemplo, por ter visto apenas em 2007 A malvada (All about Eve, 1950), de Joseph L. Mankiewicz, considerou este um dos melhores e o incluiu em sua lista.
Ainda continuo no critério secular: a lista dos melhores do ano tem que obedecer a certos critérios, isto quer dizer: escolhe-se para ela apenas os filmes que foram lançados na capital de seu estado durante o ano em questão. Há casos, por exemplo, de um filme velho se inserir numa relação. Antes da revolução (Prima della rivoluzione, 1963) estava inédito no Brasil até 1998, por algumas dessas injunções incompreensíveis do atilado mercado exibidor. Filme do grande Bernardo Bertolucci (estou a rever o seu deslumbrante e hipnótico O céu que nos protege (The sheltering sky), Prima della rivoluzione foi considerado, em várias listas, um dos melhores do ano de 1998, embora obra produzida em 1963. Assim também aconteceu com O criado (The servant, 1963), de Joseph Losey, obra de mestre, que estava inédita no Brasil até que o Cinema 1 (exibidora e distribuidora), de Alberto Shatovsky, trouxe-a para o Brasil em 75 ou 76.
Uma lista que se quer pernóstica, postada nos comentários deste blog, apresenta uma relação na qual a maioria é inédita no Brasil, a ferir, com isso, os critérios mínimos para a feitura de uma lista para ser dada à imprensa. Claro, se for uma listinha de fanático, tudo bem. Que a faça como quiser. E eu mesmo, após o esclarecimento de Saymon Nascimento, vi que troquei alhos com bugalhos. Em busca da vida é chinês e não coreano como a minha ignorância dizera. Mas o fato é que a vida é assim mesmo: com altos e baixos.
Dos nacionais, acredito que o melhor filme do ano tenha sido Santiago, de João Moreira Salles. Documentário sobre o mordomo de seus pais, mas, também, uma reflexão sobre o próprio documentário cinematográfico e o ato de fazer cinema, Santiago é surpreendente pela maneira com que Moreira Salles estabelece o seu discurso cinematográfico. E Tropa de elite, concorde-se ou não com a sua postura, constituiu-se num fenômeno ainda a ser devidamente analisado. E, também um autor sem meio termo, que se gosta ou se detesta, porque muito visceral, Cláudio Assis com O baixio das bestas dá prosseguimento a uma estética do andar de baixo.
A imagem do post não é de filme nenhum. Mas, e apenas, ilustrativa.
25 dezembro 2007
Bloguista que é cinéfilo desatualizado
E leiam-me no Terra Magazine: http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI2174095-EI6791,00.html
23 dezembro 2007
Onde se encontram os melhores do ano?
Há uma decadência imensa na qualidade dos filmes que estão sendo lançados nos últimos anos. Nos anos 60, para se ficar apenas nesta década, a tarefa do crítico ou comentarista de selecionar os 10 melhores do ano era árdua, pois existiam 20, 30, e a triagem se fazia dolorosa. Atualmente a situação se inveteu: é muito difícil se achar uma dezena de filmes que possam ser considerados os melhores do ano. Por exemplo: A rainha, de Stephen Frears, com Helen Mirren, é um bom filme, mas não dá para contemplá-lo entre os eleitos de uma lista na qual somente deveria caber obras extraordinárias. É o que acontecia antigamente, quando os dez melhores eram dez obras-primas. A considerar o que se está aqui a dizer, não se acha o blogueiro em condições de, neste ano que ora se finda, fazer a relação.
A procurar agulha no palheiro, creio que apenas quatro filmes podem figurar numa lista dos melhores do ano. Vale notar que a distância entre o primeiro e os outros, por exemplo, é imensa. A ordem é de importância, sim!
1-) Medos privados em lugares públicos (Coeurs), de Alain Resnais. Disparado, o melhor filme do ano. O único, por assim dizer, grande filme do ano.
2-) As cartas de Iwo Jima (The letters from Iwo Jima), de Clint Eastwood.
3-) Possuídos (Bug), de William Friedkin.
4-) O império do sonho (Inland empire), de David Lynch
Resnais é, talvez, o último grande cineasta vivo. Eastwood herda a tradição do grande segredo do cinema americano dotado de uma narrativa quase muscular. Friedkin é surpreendente a cada tomada, a cada take, e Lynch faz descondicionar os termos da fabulação no cinema.
Clique na imagem para vê-la ampliada.
19 dezembro 2007
Beija-me, idiota!
Wilder dá início a esta comédia-demolição com uma panorâmica na qual mostra um plano geral de um teatro que anuncia o cantor Dino (Dean Martin) enquanto os letreiros vão sendo retirados a denotar, com isso, a despedida do artista. E no plano a seguir, com a música envolvente de Gershwin, Dino está no palco, meio bêbado, intercalando a canção com suas piadas características. Os créditos se anunciam neste frenesi e continuam na viagem que o cantor, saindo furtivamente para fugir das mulheres, inicia em direção a Hollywood onde, diz, vai fazer um filme com Frank Sinatra e sua turma. Mas um incidente, no meio do caminho, determina-lhe um outro itinerário para chegar a seu destino, obrigando-lhe a passar por várias cidades interioranas. Numa destas, Clímax, de poucos habitantes e cheia de preconceitos – tão diferente da visão edulcorada de uma cidadezinha americana apresenta em Cine Majestic, de Frank Darabont, Dino pára num posto de gasolina para abastecer seu carro, onde é atendido pela frentista Barry (Cliff Osmond – que sempre trabalha com Wilder e em Irma, la douce faz o guarda que recebe o dinheiro ao colocar o chapéu, logo no princípio, no bar de Moustache). Em Climax, mora um compositor e professor de piano, Orville Jeremiah Spooner (Ray Walston), parceiro de Barney em muitas músicas, casado com Zelda (Felicia Farr, esposa, na época de Jack Lemmon), apaixonada, desde criança, por Dino, e que tem todos os seus discos em casa. Mas Orville e Barney sonham que um dia suas músicas sejam reconhecidas e consigam sair do anonimato. Assim, a presença de Dino no posto de gasolina acende a chama da ambição de Barney, que danifica o motor do carro de Dino a fim de que ele fique retido em Clímax e vir a conhecer as músicas da dupla.
A solução encontrada pela mente fervilhante do gordo Barney é fazer com que Dino passe a noite na casa de Orville, mas este, que morre de ciúmes infundados da mulher, precisa arranjar um jeito de pô-la para fora por uma noite. Dino, insaciável quando se trata do sexo feminino, diz que não pode deixar de ter uma companhia, e, para satisfazê-lo, o plano de Barney inclui a vinda de uma prostituta, Polly, the pistol (Kim Novak, magnífica), que trabalha num bar/prostíbulo O Umbigo, cujo cartaz anuncia desde logo: “Entre e se perca”. Orville consegue brigar com a mulher e ela vai para a casa da mãe. Barney traz Polly, que representa, para Dino, ser a esposa de Orville. A troca de identidade, porém, não funciona, pois Polly, apesar de prostituta, uma profissional paga para um trabalho específico, qual seja o de dormir com Dino como se fosse a mulher de Orville, se enternece por este e não mostra o menor interesse pelo cantor. As coisas se complicam. Polly mostra que seria uma excelente dona de casa. E Zelda, saindo da casa dos pais, acaba indo tomar um porre no Umbigo.
O que interessa na verdade é que Wilder demonstra pela comédia que uma dona de casa típica americana pode ter uma mente prostituída – como, geralmente, muitas das donas de casa do mundo inteiro cujas fantasias são incontáveis, enquanto uma prostituta pode ser uma mulher pura e mais adequada ao lar. A comédia se desenvolve na base de uma ironia constante cujos atributos não se devem apenas a Wilder, mas, também, ao roteiro imaginoso de Diamond, que consegue driblar o peso teatral do argumento em função de uma transmissão deste através dos procedimentos cinematográficos. É neste particular que a direção de Wilder entra em campo ao conferir aos seus enquadramentos um sentido de equilíbrio e ritmo extraordinários. Este realizador sabe construir seu filme de tal maneira que o corte se anuncia como um atendimento à expectativa do espectador.
O imaginário de certas pessoas interioranas dos Estados Unidos, como Zelma, a mulher de Orville, que é a presidente do fã-clube de Dino, é uma representação das idiossincrasias de uma sociedade na qual o que importa mesmo é o sucesso a qualquer custo. Daí certo cinismo no final, a recusa de um happy-end, e a manutenção do status quo anterior, ainda que se possa pensar no desenlace diferente.
Entram na composição da excelência do espetáculo, além da direção de Wilder e do roteiro de Diamond, a funcional iluminação em preto e branco de Joseph La Shelle – fotógrafo preferido, em cinemascope, capaz de dar a Clímax um tom cinzento e a tela larga é sabiamente utilizada no deslocamento dos atores no espaço, facilitando o trabalho da câmera, a partitura musical de André Previn que utiliza clássicos da música como alguns dos compositores George e Ira Gershwin. E o elenco afinado, bem wilderiano, como o citado Cliff Osmand, que faz Barney, Ray Walston, Dean Martin e Felicia Farr. E inexcedível está Kim Novak num papel diferente, perfeitamente à vontade, blasé, principalmente para quem a imagina como a Madeleine de Scott na obra-prima Um Corpo Que Cai (Vertigo), de Alfred Hitchcock.
17 dezembro 2007
Ozu é o sublime, o absoluto e o humano
16 dezembro 2007
O mistério de Yasujiro Ozu
Com o apoio do Consulado Geral do Japão (Recife), mostra exibe os principais filmes do grande cineasta japonês, de 16 a 20 de dezembro, na Sala Walter da Silveira.
O cinema do japonês Yasujiro Ozu é o presente de fim de ano da Sala Walter da Silveira para os cinéfilos baianos. Com o apoio do Consulado Geral do Japão- Recife e da representação consular honorária em Salvador, o ciclo O Encanto de Ozu reúne na Sala Walter da Silveira, de 16 a 20 de dezembro, as principais obras do cineasta nipônico, sempre com entrada franca. O evento se antecipa às comemorações pelos 100 anos da imigração japonesa no Brasil, a ser festejado em 2008, com várias mostras de filmes e homenagens a realizadores como Akira Kurosawa e Eizo Sugawa.
A entrada é franca pessoal!
Às 20h
Coral de Tóquio (Tokyo Chorus, Japão, 1931, P&B, 90 min) Legendas em espanhol
Direção: Yasujiro Ozu
Elenco: Tokihiko Okada, Emiko Yagumo, Hideo Sugawara, Hideko TakamineSinopse - Comédia sobre o desemprego que mostra o cotidiano de um casal e seus filhos. Okajima desafia o patrão, um homem autoritário e impulsivo, por discordar da demissão de um colega. Ele é despedido sumariamente e engrossa o enorme contingente de desempregados da época. Para comprar comida, vende os quimonos da mulher. Depois de vários percalços, tem uma nova oportunidade com um antigo professor, agora proprietário de um restaurante, que lhe oferece um emprego temporário para carregar placas de anúncios pela rua. Oakajima doma seu orgulho, aceita a proposta e a vida da família se normaliza.
Dia 17/12Às 15h
As Irmãs Munekata (Munakata Shimai , Japão, 1950, P&B, 112 minutos) Legendas em espanhol.Direção: Yasujiro Ozu.
Sinopse – Setsuko é casada com Mimura, um homem doente e que sofre de alcoolismo. Ganha vida, com muita dificuldade, gerindo um bar. Hiroshi, um antiquário, há muito enamorado de Setsuko, propõe-se a ajudá-la. O que Hiroshi não sabe é que Mariko, irmã de Setsuko, também é apaixonada por ele. E este não será o único obstáculo ao amor dos dois...
Às 17h30 e 20h
Pai e filha (Banshun, Japão, 1949, cor, 108 min) - Legendas em português
Direção: Yasujiro Ozu
Dia 18/12
Às 15h e 20h
Ervas Flutuantes (Ukigusa , Japão ,1959, cor, 119 min) -Legendas em espanhol
Direção: Yasujiro Ozu.
Sinopse – Um trupe de atores ambulantes chega a uma pequena cidade do litoral. O intuito secreto do líder da companhia é encontrar-se com seu filho, nascido de uma relação que tivera no passado com a dona de um restaurante local.
Às 17h30
Direção: Yasujiro Ozu
Dia 19/12Às 15h
Fim de verão (Kohayagawa-ke no Aki, Japão, 1961, cor e P&B, 103min) - Legendas em português
Direção: Yasujiro Ozu
17h30
Era uma vez em Tóquio (Tokyo Monogatari, Japão, 1953, P&B, 136min) - Legendas em português
Direção: Yasujiro Ozu
Dia 20/12Às 15h e 17h30
Às 20h
Coral de Tóquio (Tokyo Chorus, Japão, 1931, P&B, 90 min) Legendas em espanhol
Direção: Yasujiro Ozu
Nicholson: revolta, carisma e personalidade
15 dezembro 2007
"Cascalho" em Dolby
14 dezembro 2007
Loucura ou imaginação?
A comilança (La grande bouffe, 1973), extraordinário filme de Marco Ferreri, que levou muitos anos proibido pela ditadura brasileira, a ser visto apenas em 1979, fechou, com chave de ouro, a mostra organizada pelas professoras Ligia Amparo e Micheli Soares O cinema, a comida e o comer, uma promoção da Escola de Nutrição da Universidade Federal da Bahia. Vi La grande bouffe, e a primeira visão causou imensa impressão, no Iguatemi 2, mais ou menos em 79. Depois o revi, creio que em 2001, na Sala Walter da Silveira. Mas ainda não o tinha apreciado em DVD. Nesta semana, terça, foi exibido na Sala de Arte da UFBa em DVD. Tomei um susto. Lembrava-me que, no final, restava Philippe (Philippe Noiret, o excelente ator francês que ficou famoso ao interpretar o operador em Cinema Paradiso, de Giuseppe Tornatore) como único sobrevivente do quarteto suicida integrado por Marcello Mastroianni, Ugo Tognazzi, Michel Piccoli (que aparece na foto a carregar a cabeça de um leitão). As últimas imagens do filme mostram-no sentado no jardim ao lado de Andrea Ferreolli, que lhe serve, de colherzinha, um açucarado pudim de morango. Diabético, e depois de tanta fartura, é sinal de que não iria resistir por mais tempo, mas o filme se fecha com Philippe a comer o pudim de morango. Qual não foi a minha surprêsa, quando, nesta visão agora em DVD, Phillipe Noiret, acompanhado no mesmo banco do jardim pela professora Andrea, vem a morrer. Um carregamento de carnes diversas chega e elas são jogadas no jardim. Morto Noiret, Ferreol se dirige ao interior da mansão e o filme acaba assim.
Teria imaginado a versão anterior? Georges Sadoul conta que a memória cinematográfica prega peças no sujeito. Conta, em seu Dicionário de filmes, que levou décadas falando de uma determinada sequência que não pertencia ao filme citado. Gostaria que alguém me esclarecesse a questão. Será que existiam duas versões de La grande bouffe? Ou será que estou realmente a ficar louco?
12 dezembro 2007
De Domingos de Oliveira
10 dezembro 2007
A fundo colorido
Saber usar a cor no cinema, com valor poético e funcionalidade dramática, é difícil. Usa-se o colorido a torto e a direito à maneira de um cartão postal. O espectador, condicionado ao filme colorido, por ignorância estatal, abomina o branco e preto, mas, infelizmente, não sabe contemplar a cor, ver, nesta, um componente de estesia. A imagem que ilustra este post não é a de um filme, mas tem uma composição cromática que me pareceu atrativa nesta conjugação de copos com líquidos de cores diversas.
Michelangelo Antonioni fez seu primeiro filme a cores na primeira metade dos anos 60, quando já cineasta consagrado. Assim como outros diretores importantes, Bergman inclusive, pensou muito antes de realizar uma obra colorida. E o fez com grande timidez em O deserto vermelho. Mas seu primeiro filme realmente colorido foi Blow up, filmado in loco na Londres dos efervescentes anos 60. Antonioni pediu autorização a prefeitura da capital da Inglaterra para poder pintar alguns quarteirões e toda a grama do parque onde se suspeita ter acontecido um assassinato. Na primeira solicitação, houve recusa, mas o realizador de L'avventura, somente por ser o cineasta da famosa trilogia composta por este, La notte, e L'eclisse, afinal conseguiu o desejado. O perfeccionismo de Antonioni em função da cor, da linguagem da cor, poder-se-ia dizer melhor, em Blow up, fê-lo impaciente e exigente, temperamental e neurótico, pois tinha medo de não se expressar adequadamente em filme colorido. E o fez, como o resultado está a mostrar, admiravelmente.
Hitchcock usa a cor com funcionalidade em Marnie aut(e em tantos outros filmes de sua autoria), quando o vermelho surge a dominar a tela quando das crises da personagem. E, a considerar que o branco também é uma cor (ou seria a anulação da cor?), o copo de leite, com a lâmpada acessa dentro dele, a acentuar a sua brancura luminosa, tem-se um admirável uso do cromático em Suspeita, do mestre, quando Cary Grant sobe uma escada em espiral para levar um copinho de leite para a sua esposa Joan Fontaine. O espectador fica em delirante suspense, a pensar que, naquele copo, há veneno.
Bernardo Bertoucci (por sinal, quando da morte de Bergman e Antonioni, que foram quase de mãos dadas para o túmulo, anunciou-se que o cinema morreu, etc e tal, a recorrer-se a alguns nomes restantes, a exemplo de Resnais, Von Triers, mas Bertololucci foi esquecido, que embora não seja nenhum Bergman ou Antonioni, é cineasta de grande expressividade) é um realizador atento à suan mise-en-sène, e procura, sempre, configurar o colorido de maneira eficiente e adequada. Dispõe de um artista da luz para ajudá-lo nesta tarefa, que é Vittorio Sttoraro. Em O último imperador, por exemplo, toda a parte em que o monarca fica no palácio, a luz é difusa, há pouca claridade, mas quando este resolve sair da prisão, e abraçar o mundo, a luz reina e as cores se avivam.
O Technicolor, por exemplo, era um processo rudimentar de apenas três cores, que apareceu pela primeira vez em 1932. Este processo de coloração fazia com que as imagens ficassem hiperrealistas, isto é, coloridas demais, as pessoas e as coisas eram, em technicolor, excessivamente luminosas e em cores. Faz pensar nas propagandas enganosas exibidas atualmente quando um sanduíche do Mac Donald's, por exemplo, na sua imagem publicitária, dá uma impressão de saber e gigantismo que não corresponde à realidade. Talvez o primeiro filme colorido com boa utilização da cor (leia-se a cor usada em função expressiva) tenha sido em O mágico de Oz, de Victor Fleming, em 1939, com a inesquecível Judy Garland (uma atriz e cantora que se pensa aqui insubstituível e única). Como citou Mariana Paiva, a cor é pensada em sua funcionalidade no desconcertante (e por vezes irritante) O cozinheiro, o ladrão, sua mulher e o amante.
09 dezembro 2007
A função da cor no cinema
Assim, se é verdade aquilo que afirmou Roland Barthes, que colorir o mundo significa em última análise negá-lo, como deve comportar-se a cor se não quiser esmagar a realidade, mas, pelo contrário, interpretá-la poeticamente? E, sobretudo, que atitude deve assumir relativamente às imagens e aos sons? A resposta é fácil de prever: a cor no filme deve cumprir uma missão essencialmente psicológica. Deve ser, não bela, mas significativa. Somente deste modo tem a sua presença uma justificação expressiva e pode servir para dizer coisas que não poderiam ser ditas sem a sua intervenção. Se tal não acontece, a cor não apenas resulta nociva para o filme como corre o risco de empobrecê-lo a ponto de fazê-lo regredir para um nível inferior ao alcançado no velho preto e branco.