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05 outubro 2009

Moscou contra 007

Ontem, domingo, revi, no Telecine Cult, Moscou contra 007 (From Russia with love, 1963), o segundo filme do agente secreto interpretado por Sean Connery (o primeiro, O satânico Dr. No [Dr. No, 1962) também tive o prazer de revê-lo sábado no mesmo canal).
Moscou contra 007, quando lançado (e, vejo no Imdb, que a sua estréia se deu primeiro no Brasil em 27 de abril de 1964) se transformou num fenômeno de bilheteria. Ninguém ficava indiferente a sua ação frenética, ao compasso da partitura eletrizante de John Barry, às tiradas humorísticas, ao dínamo propulsor de sua estrutura narrativa, envolvente.

Seus produtores Albert R. Broccoli e Harry Saltzman não tinham idéia, quando lançaram Dr. No que o filme faria um sucesso sem precedentes capaz de lhes estimular uma continuação, que foi este From Russia with love. Mas não esperavam, mesmo cônscios do êxito deste, que o filme fosse além dos prognósticos. Como aconteceu e a série se desdobrou em outras películas a seguir. James Bond virou uma coqueluche.

Na época, a ideologia, porém, imperava entre os estudantes. E Bond, agente secreto à serviço de sua Majestade, não agradava à esquerda, que lhe fazia vista grossa. Recordo-me que, na sala de espera do cinema onde estava sendo exibido, deparei-me, de repente, com um militante que, ao me ver, desceu escada abaixo para se esconder no banheiro. O que iriam dizer seus companheiros quando tomassem conhecimento que ele estava a ver filme reacionário de James Bond?

Creio que o fascínio de James Bond supera e está acima das ideologias. Devo fazer uma confissão agostiniana: adoro os filmes de James Bond - pelo menos aqueles interpretados por Sean Connery e alguns com Roger Moore, ainda que tenha visto com muito prazer o penúltimo Casino Royale, com Daniel Craig.
A apresentação, quando Bond, ereto, pistola na mão, surge na tela do lado direito e caminha a seu meio e, de repente, posta-se de frente e atira, caindo, na tela, uma tinta vermelha, é espetacular e emocionante, com a música tema de John Barry.
Em From Russia with love, inaugura-se o prólogo antes dos créditos. Steven Spielberg confessou, há algum tempo, que sua grande frustração era a de nunca ter feito um filme de James Bond. A séria Indiana Jones, guardadas as suas diferenças, é uma tentativa de dar ao filme o ritmo frenético das aventuras bondianas. Tanto é que Spielberg, assim como nos filmes do agente secreto, também estabelece um prólogo antes da apresentação dos créditos.

Em Moscou contra 007, o que se passa antes dos letreiros iniciais embalados com a música From Russia with love, é um fake. Bond (Sean Connery) persegue Robert Shaw (Red Grant), mas é derrotado com um fio de aço por este. Morto, diante de um castelo exuberante, as luzes se acendem com estrépito e vemos um homem tirar a máscara do derrotado que se pensa ser James Bond. Em seguida, a emergência dos créditos, dando já ao filme um impacto.

A Spectre planeja decodificar os segredos nucleares da União Soviética e, para isso, conta com a ajuda de uma mulher irascível e violenta (Lotte Lenya, que foi esposa de Kurt Weil, autor, com Bertold Brecht, de A ópera dos três vinténs) e seu fiel escudeiro Red Grant (Robert Shaw), homem treinado para matar e destituído de qualquer sentimento de humanidade ou compaixão. Precisa, no entanto, também, da ajuda de uma mulher (Daniela Bianchi), disciplinada soviética que trabalha na embaixada de seu país sediada na Turquia. Porque os ingleses também estão interessados nos segredos da União Soviética, a Spectre pensa contar com a colaboração involuntária deles, mas James Bond, convocado, entra em ação, desarma todo o esquema e, como é de praxe, leva a bela Daniela Bianchi para a sua alcova íntima.

A luta final, entre Lotte Lenya e Sean Connery é muito estimulante para aqueles que gostam do bom filme de ação (atualmente os filmes de ação, honradas as exceções de praxe, são rápidos e dentro da estética do videoclip, que resultam pobres e ruins).
François Truffaut escreveu, em seu extraordinário livro de entrevistas com Alfred Hitchcock, sobre a influência imensa de Intriga internacional (North by northwest, 1959) sobre todo o cinema do gênero thriller a partir dos anos 60, inclusive, disse ele, toda a série de James Bond, cuja estrutura narrativa é bastante influenciada pelo filme hitchcockiano. O que é verdadeiro.

Terence Young, o diretor, inspira-se em Intriga internacional. Vejam a luta no trem, por exemplo, entre Shaw e Connery. E mais: a textura da mise-en-scène advém da estrutura hitchcockiana de North by northwest.

Baseado em Ian Fleming, assim como todos Bonds-movies, Moscou contra 007 é, segundo penso, o melhor de toda a série, porque um thriller bem ajustado sem as novidades que viriam adornar os filmes posteriores.

Está em cartaz no Telecine Cult. Vale a pena conferir.

7 comentários:

Jonga Olivieri disse...

No final das contas 007 (dobl'ou seven = duplo zero sete, ao pé da letra) tornou-se uma instituição, como as séries de Tarzan, que acabaram oficialmente poucos anos antes, em finais dos 1950.
Digo oficialmente porque já haviam acabado antes. No meu entender, o último Tarzan que teve alguma expressão foi Gordon Scott, cujo "Tarzan's greatest adventure" é o melhor filme. Por acaso Sean (Bond) Connery foi vilão contra Gordon (Tarzan) Scott antes de ser famoso.

Jonga Olivieri disse...

Mas para finalizar, que a direita aproveitou, ah, lá isso aproveitou!
O Ibrahim Sued, a besta do Ibrahim Sued, que uma vez num program de TV (ao vivp, pois não existia ainda o "São" VT) chamou um sujeito no seu progema a dizer: "Ele fala várias línguas, portanto ele é um troglodita" (juro que não é piada).
Mas esta besta do Ibrahim escreveu: "000 contra Moscou"...

Vlademir disse...

Também adoro os exemplares de 007 estrelados por Sean Connery, e alguns com o Roger Moore, além dos com o Timothy Dalton (o meu segundo Bond preferido), e À Serviço Secreto de Sua Majestade (que é ótimo pelo filme em si, mas sofre com o lamentável ator que faz o Bond).
E o Moscou contra 007 também tem uma outra cena inspirada em Intriga Internacional, a que o herói é perseguido por um avião.
Abraços.

André Setaro disse...

É verdade. Sean Connery foi o vilão de "A grande aventura de Tarzan", com Gordon Scott. E a cena do avião, Vlademir, é "chupada" de "Intriga internacional". Esqueci de comentar, mas obrigado pela lembrança.

Romero Azevêdo disse...

Setaro, a série de James Bond tem um charme que resiste ainda hoje. Nesse quesito sou radical: qualquer filme de James Bond´, para mim, é bom. Além do James Bond Theme, as canções que embalavam os créditos são memoráveis.As Bond Girls são outro atratativo da série, os vilões também.
Além de atanazar a vida de Tarzan, Sean Connery fez papel de mocinho romântico no infantil "A lenda dos anões mágicos", produção da Disney feita em 1958.
Para por aqui pois vou correndo comprar o box 1 da coleção James Bond.

André Setaro disse...

"Moscou contra 007" tem no seu elenco o grande ator mexicano Pedro Armendariz (acho que foi seu último filme), que conhecia muito, quando jovem, em dramalhões da Pelmex. Nunca me esqueço de Maria Felix. Há, nos filmes de James Bond, um fascínio indescritível. Vi "Moscou" quando tinha 14 anos, em 1964 ou 1965, no extinto Liceu, aqui na Bahia. Revi-o nos cinemas sempre que era reprisado. Aquelas apresentações de créditos eram inovadoras para a época. A partitura de John Barry com a música tema do filme é espetacular. Acho que quem não gosta de 007 não gosta de cinema.

Vá logo, Romero, comprar o 'box' de Bond. Pode acabar.

Eduardo S. Mafra disse...

007 é um ícone de fato, esses papos ideológicos extremistas não devem se aplicar quando não há sentido, ou seja, diante de uma obra de qualidade.Realmente não sabia da referência de Indiana Jones à série 007, além das referências já feitas ao gênero aventura que Spielberg fez. Falando em intertextualidade, o senhor aprecia os filmes de Quentin Tarantino? Estou ansioso pela estréia do novo filme! Gostaria de saber sua opinião pelo diretor. =)