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27 novembro 2008

O filão da comédia sofisticada

Há filmes que expressam bem o estilo de representação de uma época ou de um gênero determinado. Confidências à meia-noite (Pillow talk, 1959), de Michael Gordon, com Rock Hudson, Doris Day e Tony Randall, é exemplar nesse sentido. Se, antes deste, o cinema americano sempre se notabilizou por excelentes comédias (as de Hawks, as de Cukor, as de Tashlin, as de Minnelli...) é, porém, a partir de Pillow talk que se constitui, por assim dizer, um filão específico no qual a comédia vira perfurmaria de luxo, a adquirir uma nova sofisticação. Confidências à meia-noite é pioneiro como um filme detonador de outros que se lhe seguiram quase no mesmo diapasão, quase no mesmo tom: Volta meu amor (Lover come back, 1961), com o mesmo par romântico, é um revival de Pillow talk sob as ordens de Delbert Mann, Quando setembro vier ( Come September, 1961), de Robert Mulligan, troca Doris pela italiana Gina Lollobrigida, mas o screenplay dos três é de Stanley Shapiro, um autêntico perfumista (ao lado do produtor Ross Hunter). A nova sophisticated comedy inspirou até Howard Hawks, que aproveitou Rock Hudson em O esporte favorito do homem (Man's favorite sport, 1964), ainda que o estilo deste autor comportasse uma certa anarquia e um espírito demolidor não afeitos à perfumaria de Shapiro e companhia. O fato é que o filão tomou conta do cinema americano até a quebra definitiva do Código Hayes em meados dos anos 60, quando os temas deixaram de ser tão perfumados e adquiraram o cheiro da tragédia americana. Norman Jewison realizou Não me mandem flores (Send Me No Flowers, 1964), com Rock e Doris, e Michael Gordon não perdeu tempo em ver se fazia ressurgir o filão (já prestes a se esgotar), em 1965, reunindo Rock Hudson e Leslie Caron (a inesquecível Gigi, de Minnelli) em Favor não incomodar.
O fato é que Confidências à meia-noite se constituiu num fenômeno de bilheteria na época de seu lançamento (Ruy Castro, numa lista, chegou a considerá-lo um dos filmes marcantes de um período). Um compositor mulherengo (sim, Rock Hudson mesmo) e uma decoradora de interiores (a virginal Doris Day) tornam-se inimigos quando compartilham o mesmo número de uma linha telefônica. Mas tudo se acerta depois, quando os dois se apaixonam perdidamente. Interessante observar que, naquela época, era difícil se encontrar uma linha de telefone. O que não ocorre atualmente com a avalanche de telefones celulares que tanto perturbam a vida dos outros (quando usados de maneira deseducada e inconveniente, como pelos selvagens que fazem parte da platéia das salas de cinema).

2 comentários:

Jonga Olivieri disse...

"Confidências à meia-noite" é excelente. Por acaso o revi no ano passado. "Quando setembro vier" idem.
Tempinho divertido aquele, não é mesmo. O cinema estadunidense era um primor... em entretenimento.

Cassiano Mendes disse...

Digníssimo Setaro,

Sou agora um seu 'seguidor'. Aliás, bem da verdade, lhe sigo há muito tempo não somente no blog mas desde os tempos imemoriais da 'Tribuna da Bahia'. Você não deve me conhecer pessoalmente, mas sou leitor de suas colunas há muito tempo. Pena que tenha abandonado o colunismo diário para ficar somente às quintas. De qualquer modo, também vejo, de vez em quando, publicações suas no suplemento cultural de A Tarde. Queira receber aqui o meu grande abraço.