Escrevi o texto a seguir em 2004 e, devo dizer, que gostei do remake de Sob o domínio do mal, de Demme, que, abaixo, na escrita, dou a impressão de ficar com a pulga atrás da orelha. De uma maneira geral, não gosto de remakes, mas compreendo que há a necessidade de, às vezes, adaptar-se um roteiro interessante aos tempos contemporâneos. Mas quando se trata de um filme maior, de uma obra-prima, o remake é inadmissível. Não se pode, por exemplo, fazer um remake de Cidadão Kane. Este é o que é e ponto final. Cidadão Kane não pode ser corrigido, aperfeiçoado. Ele é aquilo que Orson Welles projetou. Mas o remake admissível seria para aqueles filmes normais com um argumento bom, uma história de eficiência dramática que, com a tecnologia atual, poderia ser melhor construída em função de seu desenvolvimento. De qualquer maneira, o fato é que andei copisdescando o texto infra quase que a fazer desnecessária esta introdução para retificar algumas coisas. Mas blog é assim mesmo. Mas, infelizmente, remakes são feitos para que os filmes sejam adaptados ao gosto atual, ao gosto pós-moderno, ao modelo decadentista da sociedade contemporânea, que desce a ladeira sem brilho e aos trombolhões.
Sou contra os remakes, considerando que o filme é aquele de sua época e deve ser visto como tal. A maioria dos remakes é constituída de desastres absolutos, como pode servir de exemplo Psicose, de Gus van Sant. E quando não são totalmente descartáveis ficam a léguas de distância do original. É o caso de Onze homens e um segredo, de Steven Soderbergh, em relação ao de Lewis Millestone. Vejo, agora, que se encontra, na lista das maiores bilheterias dos Estados Unidos, o remake de Sob o domínio do mal (The manchurian candidate), desta vez dirigido pelo competente Jonatham Demme – de O silêncio dos inocentes – e com um elenco respeitável: Denzel Washington, Merryl Streep e Jon Voight. Mas, por melhor que seja, não se pode compará-lo a Sob o domínio do mal, do grande John Frankenheimer, quando se encontrava, nos anos 60, na sua melhor fase. O filme original conta com Frank Sinatra, Janet Leight, Laurence Harvey, Ângela Lansbury, entre outros, e é uma obra premonitória de fatos que iriam sacudir os Estados Unidos, além de sua impressionante pela sua mise-en-scène.
Os remakes acontecem para adaptar os originais à cultura da maldita contemporaneidade, com os atores se comportando mais de acordo com a gestualística da atualidade. No caso do filme de Frankenheimer, por ser em preto e branco, o seu remake usa cores, considerando que o público atual não aceita mais o filme que não tem cores. Uma ignorância sem precedentes, pois, opinião quase unânime de quem entende de cinema, o preto e branco é, por assim dizer, mais artístico, proporciona ao realizador uma fotografia mais ajustada ao tecido dramático da narrativa. Gosto muito de ver um filme em preto e branco. Há, também, nos filmes mais antigos, um certo pudor em relação ao sexo e uma contenção na explicitação da violência. Como a platéia não aceita mais nenhuma contenção, com o vale tudo contemporâneo, nos remakes se ajustam esses ingredientes num volume mais alto. Soube que existe uma versão de Janela indiscreta, de Hitch, que tem, no remake, Christopher Reeves no papel de James Stewart. Se sair em DVD ou vídeo ou passar em cinema, passo ao largo.
Há, assim, nos remakes habituais, uma necessidade de adaptação cultural. Em Psicose, de Hitch, o verdadeiro e original, os personagens possuem um determinado tom na maneira de se comportar em cena, enquanto que na versão de Gus Vant Sant há um relaxamento que vai, neste ponto, muito de acordo com a falta de elegância, ausência de finesse, como se está, aqui, sempre a repetir. Mas aceito alguns remakes, quando feitos pelo próprio realizador, como o que aconteceu em O homem que sabia demais, que Hitchcock realizou nos anos 30 na Inglaterra e, na década de 50, resolveu refilmá-lo por contar, na ocasião, com mais recursos de produção. Leo McCarey também fez duas versões de Tarde demais para esquecer (An affair to remember). A primeira nos anos 40. Mas a que ficou registrada para sempre na memória do espectador foi a de Cary Grant e Deborah Kerr, obra de alto refino, sofisticada, irônica, de uma singularidade e emoção impressionantes.
O remake de Acossado (A bout de souffle), de Jean-Luc Godard, aconteceu nos anos 80, com Richard Gere no papel antes reservado a Jean-Paul Belmondo, o inesquecível Michel Poiccard da obra que detonou, em 1959, a Nouvelle Vague juntamente com Os incompreendidos (Les quatre-cent coups), de François Truffaut. Ainda que a de Gere tenha admiradores, trata-se de um outro filme, de uma outra coisa. São quantidades heterogenias, na verdade. Absurdo dos absurdos, como já se tentou fazer, seria um remake de Cidadão Kane, de Orson Welles. Ou já pensaram numa versão 2008 de Hiroshima, mon amour, de Alain Resnais?
A imagem é de Cary Grant ao lado da inesquecível Deborah Kerr em Tarde demais para esquecer.
Há, assim, nos remakes habituais, uma necessidade de adaptação cultural. Em Psicose, de Hitch, o verdadeiro e original, os personagens possuem um determinado tom na maneira de se comportar em cena, enquanto que na versão de Gus Vant Sant há um relaxamento que vai, neste ponto, muito de acordo com a falta de elegância, ausência de finesse, como se está, aqui, sempre a repetir. Mas aceito alguns remakes, quando feitos pelo próprio realizador, como o que aconteceu em O homem que sabia demais, que Hitchcock realizou nos anos 30 na Inglaterra e, na década de 50, resolveu refilmá-lo por contar, na ocasião, com mais recursos de produção. Leo McCarey também fez duas versões de Tarde demais para esquecer (An affair to remember). A primeira nos anos 40. Mas a que ficou registrada para sempre na memória do espectador foi a de Cary Grant e Deborah Kerr, obra de alto refino, sofisticada, irônica, de uma singularidade e emoção impressionantes.
O remake de Acossado (A bout de souffle), de Jean-Luc Godard, aconteceu nos anos 80, com Richard Gere no papel antes reservado a Jean-Paul Belmondo, o inesquecível Michel Poiccard da obra que detonou, em 1959, a Nouvelle Vague juntamente com Os incompreendidos (Les quatre-cent coups), de François Truffaut. Ainda que a de Gere tenha admiradores, trata-se de um outro filme, de uma outra coisa. São quantidades heterogenias, na verdade. Absurdo dos absurdos, como já se tentou fazer, seria um remake de Cidadão Kane, de Orson Welles. Ou já pensaram numa versão 2008 de Hiroshima, mon amour, de Alain Resnais?
A imagem é de Cary Grant ao lado da inesquecível Deborah Kerr em Tarde demais para esquecer.
10 comentários:
Só para ampliar a lista cito "Corrida contra o destino(Vanishing Point-1971) cujo remake de 96 ou 97 é pastelão puro. Tem "Matou a familia e foi ao cinema", 1969 de Julio Bressane que Neville de Almeida inverteu nos anos 90, ou seja matou o cinema e foi pra familia.E o que dizer de "E o vento levou" e "O Morro dos ventos uivantes" totalmente desfigurados em seus péssimos remakes. Já Fankstein e Drácula geraram excelentes remakes, concorda ?
É uma questão complicada a de ‘remakes’. No caso em questão, ou seja no caso de “Sob o domínio do mal” (Mandchurian candidate), achei uma forçada de barra. O primeiro filme, cuja ideologia está inserida no “utilitarismo” da guerra fria, até se justifica no contexto histórico.
O termo no original “Mandchurian” tem a ver com uma lavagem cerebral feita pelos chineses em soldados estadunidenses. Quando isto passou para uma empresa com o mesmo nome, a coisa ficou complicada.
Mas concordo que o filme em si não é de todo ruim. Apesar de não gostar de remakes e ter visto poucos que valessem a pena. O "Psicose", citado por você, eu detestei.
Quanto aos remakes realizados pelos próprios diretores é diferente. É como que uma retomada por parte do autor.
Sim, Jonga, o 'remake' realizado pelo próprio diretor é uma espécie de retomada por parte do autor, como fez o mestre Hitch em 'O homem que sabia demais', considerando que na década de 50, e já estabilizado em Hollywood, o genial realizador de 'Um corpo que cai' dispunha de mais recursos, maiores possibilidades de expressão. Mas Romero o que, realmente, Neville D'Almeida fez em 'Matou a família e foi ao cinema', 'remake' do filme homônimo de Júlio Bressane (que considero deste, ao lado de 'Cara a cara' e 'O anjo nasceu', os seus melhores antes de entrar na 'chatice' crônica de seus ensaios fílmicos) foi, muito mais do que matar a fonte inspiradora, cometer uma verdadeiro assassinato ao cinema enquanto fabulação e expressão. O filme é de doer. E Neville fica sem desculpas, já que fez também 'Rio Babilônia', que machuca o cinema. Sem falar naquela coisa horrorosa que é 'Os sete gatinhos', e que o genial Nelson ainda aplaudiu.
O Grande Nelson sabia fazer marketing pessoal como ninguém, aplaudiu os gatinhos de Neville(inclusive visitou o set e tirou fotos ao lado do elenco)só para reforçar a bilheteria, no fundo ele sabia que aquilo era um gande blefe. Já que falamos de Neville não esqueçamos A Navalha na Carne, aquela doeu mesmo( a versão anterior de Braz Chediak- 1970 - com Jece Valadão, Emiliano Queiroz e Glauce Rocha ao menos tinha a dignidade do elenco)
Muito bem lembrado, Romero. Estava esquecido da asneira cometida por Neville na transposição de 'A navalha na carne', a bela e cruel peça de Plínio Marcos. A primeira adaptação, de Braz Chediack, com Jece, Glauce, e o fortíssimo Emiliano José, valeu a pena, mas a de Neville tive ímpetos de sair no meio, protestar, fiquei indignado, e mais ainda quando ainda vi nas ilustradas da vida alusões ao diretor e a seu filme, que deveria ser queimado para que, no futuro, a imagem do cinema brasileiro não ficasse tão atingida.
O que, pelo amor de Deus e da Virgem Maria, Neville D'Almeida fez de bom em cinema? Todo filme de Neville é ruim, meu caro Setaro, é um crime cometido contra a sétima arte, contra a inteligência, contra a expressão, contra, como você mesmo gosta de usar o termo, a 'mise-en-scène'. 'Jardim de guerra' foi cultuado pelos imbecis e também pelo fato do filme ter sido proibido, mas é muito sem vida inteligente por trás das câmaras. O resto é um inferno para cinéfilo se torturar: 'Os sete gatinhos', chato, mal filmado, planos demorados, sem a sensibilidade exata do conceito de duração de cada tomada, 'Rio Babilônia', sim, este tem Denise Dumont, que é uma gracinha, mas filme não se faz de gracinhas e se é para fuder se vai a um motel, 'A navalha na carne', que crime, como Plínio Marcos pôde ficar calado?, 'Matou a família e foi ao cinema', e quase que matou a todos nós, que gostamos da arte do filme. Neville faz mal ao cinema, e deveria ficar no seu canto, quieto, fazendo outras coisas. Não gosta de música? Por que não compõe? Mas, por favor, o que o cinema lhe fez Neville?
E me lembrei de 'A dama do lotação'. Vale para ver Sônia Braga. O resto, lixo.
Um filme puxa outro, e outro, e outro.
Não pode ficar de fora dessa postagem( por sinal muito boa para começar a semana), o caso dos Orfeus. Digo logo que o de Marcel Camus dá uma goleada no do pretencioso Cacá Diegues. Nem a presença, sempre marcante, de Caetano Veloso salvou aquela bucha em cinemascope e technicolor. Como se dizia nos bons tempos da cinefilia "Que desperdicio de celulóide!"
Essa queixa com o Neville não passa de briga da turma da cachaça contra a turma da coca, que nunca o perdoou por ser tão produtivo. Neville é um grande cineasta brasileiro e consagrado, basta ver sua lista em http://www.imdb.com/name/nm0206970/
Custa crer, Luana Simões (ou que nome venha a ter na realidade) que possa gostar do cinema de Neville D'Almeida. Mas, como se diz, tem gosto para tudo.
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