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13 junho 2007

De Alan Parker e seu sentido do tempo




Há filmes expressivos que, quando lançados, passam em brancas nuvens pelo circuito e, levando pouco tempo em cartaz, vão embora para nunca mais. Dois, os fatores determinantes do fracasso: a indiferença da distribuidora em proporcionar marketing eficiente e, principalmente em casos de obras acima da média, a ignorância da crítica quanto ao valor de certos realizadores. É o caso de Alan Parker, que os hermeneutas da sétima arte ainda não conseguiram ver-lhe a dinâmica, o sentido precioso que tem do tempo cinematográfico, o olhar detalhista capaz de contemplar os gestos mais insignificantes da condição humana e lhes dar uma dimensão analítica. Considerando que a crítica, que hoje se pratica, está mais afeita à resenha no esquema ‘guia de consumo’, ou ao comentário impressionista sem base referencial e conhecimento de causa, poderia até parecer normais tais ocorrências. O que se escreve atualmente sobre cinema se encontra mais ligado aos filmes de realizadores que estão ‘in’, que estão na moda, como é o caso de Pedro Almodóvar, ainda que este cineasta seja um grande talento, com universo ficcional e estilo próprio. Também são referendadas as obras que passeiam pelo circuito alternativo, como se o fato de uma determinada fita ser exibida, por exemplo, no Circuito Bahiano, tornasse-a, de per si, e por efeito varinha de condão, uma obra de arte. Assim os ledos e ivos enganos são imensos, abissais. Não se pode comparar, por exemplo, um Innarritu com um Parker, mas o primeiro é saudado com entusiasmo e o segundo completamente posto a escanteio.

Estou me referindo a Alan Parker porque revi um belo filme de sua autoria: Bem-vindo ao paraíso (Come see the paradise, 1990). Em alguns momentos dessa obra, por causa de seu sentido narrativo expressivo e detalhista, cheguei a pensar nos filmes de David Lean (A ponte do rio Kwai, Passagem para a Índia, Lawrence da Arábia). Come see the paradise, porém, foi boicotado pelo distribuidor, embora queimado tivesse lançamento mundial. A causa está na revelação dos campos de confinamento instituídos pelo governo de Franklin Delano Roosevelt aos japoneses residentes nos Estados Unidos durante a Segunda Guerra Mundial. O fato, histórico, sempre procurou ser abafado, principalmente quando aconteceu nos tempos de Roosevelt, presidente muito respeitado. E, além do mais, os USA consideraram uma petulância que sua emergência temática tenha sido provocada por um inglês como Alan Parker.

Bem-vindo ao paraíso, assim à primeira vista, segundo os desconstrucionistas de plantão, talvez possa parecer mais um filme hollywoodiano, com narrativa clássica. O hábito, entretanto, não faz o monge. Uma obra cinematográfica pode ser grande e bela se usa o classicismo, dependendo, apenas, isso, do talento do realizador na manipulação dos elementos da linguagem cinematográfica. A julgar pela onda desconstrutivista e a mania da fragmentação como conditio sine qua non da artisticidade de um filme, toda a obra de um John Ford, de um Otto Preminger, de um Howard Hawks, de um Raoul Walsh, entre muitos outros, estariam varridas para a lixeira do esquecimento.

Parker tem um impressionante timing, uma maneira cativante de olhar seus personagens, dar-lhes vida e poder de convencimento, senso rítmico que impressiona aliado a sua consciência do ‘conceito de duração’ das tomadas. E, além do mais, coisa rara, o humor está introjetado no ritmo, como podemos ver em O fantástico mundo do Dr. Kellog (The road to Wellville, 1994), com Hopkins, filme também que nem sequer foi lançado no circuito. Talvez porque um cineasta muito fino para o público médio – e, nesse caso, Ariano Suassuna (estou vendo A pedra do reino) tem razão quando disse que a desgraça do artista é quando tenta se moldar ao gosto mediano.

O melhor trabalho de Parker? Mississippi em Chamas (Mississippi burning, 1988) é obra de grande impacto. Mas não podemos esquecer de Coração satânico (Angel heart, 1987), O expresso da meia-noite (Midnight express), A chama que não se apaga (Shoot the moon, 1982), belo filme sobre a crise matrimonial, com Albert Finney e Diane Keaton – por falar nesta, ex-musa de Woody Allen, está ridícula em Alguém tem que ceder, inutilidade plena e absoluta, queima e desperdício de filme virgem perpetrado por uma tal de Nancy Meyers. Mas não gosto de Evita, com Madonna, que é de Parker. Mas não se pode gostar de tudo na vida, não é mesmo?

Um comentário:

Jonga Olivieri disse...

O importante é que o balanço do trabalho do diretor é positivo. Apesar de Evita.