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12 abril 2011

Sidney Lumet está morto


Iria colocar uma tarja preta neste blog, mas não soube como fazê-lo. Por causa da morte de Sidney Lumet, um grande realizador americano que morreu há alguns dias, aos 86 anos (boa idade, aliás, para se passar à eternidade, já que não podemos ficar para semente). Sobre ser um profissional acima da média, um cineasta notável, não teve em vida a notoriedade merecida - talvez por uma certa irregularidade na sua ficha filmográfica, mas quando tinha um bom roteiro em mãos geralmente o suplantava e causava admiração. Aliás, há poucos anos, o seu derradeiro opus, Antes que o diabo saiba que você está morto, entrou para a minha lista dos melhores filmes do ano.

Gostaria de fazer um mergulho retrospectivo na sua filmografia, mas, no momento, não há tempo disponível na minha agenda ociosa. O que não posso, sob pena de consciência culpada, é deixar de registrar o seu passamento, o desaparecimento de um profissional de altíssimo nível, que, lá vai o clichê, deixa o cinema contemporâneo cada vez mais pobre e medíocre. Lumet, homem de lhano trato, observador irônico do comportamento humano não desprovido de fina ironia, simples no trato, era, porém, exigente quando trabalhava (escreveu um livro onde relata o seu método de trabalho).

Não faz parte dos grandes pioneiros do cinema americano, mas surgiu da geração da televisão, onde começou a sua carreira até que realizou o seu primeiro e consagrado longa: Doze homens e uma sentença (12 twelve men, 1957), com Henry Fonda, Lee J. Cobb, e grande elenco, em CinemaScope e branco e preto, cuja ação se localiza durante duas horas numa sala onde jurados decidem a sorte de um réu. Impressionante o sentido da utilização do espaço exíguo e a capacidade de manter o espectador integrado ao espetáculo sem que haja, por parte deste, nenhuma hesitação em relação à abdicação de vê-lo, grudado, até o the end. Notável também o seu método de dirigir atores, embora estes, no cast de 12 twelve men, fossem excepcionais. Henry Fonda, que ajudou na produção, chegou a dizer, em entrevista, que Doze homens e uma sentença era o filme de sua preferência.

Entre os filmes de Sidney Lumet que mais admiro, além do citado Doze homens e uma sentença, estão Limite de segurança (Fail safe, 1964), com Henry Fonda, um dos mais agudos alertas sobre a ameaça nefasta da bomba atômica e seu perigo iminente; Um longo dia de viagem dentro da noite (Long day's journey into night, 1962), adaptação conscienciosa da grande peça de Eugene O'Neil, mas boicotado em sua distribuição comercial, que tem, no cast, entre outros, a excelsa Katherine Hepburn; O homem do prego (The pawbroker, 1965), com interpretação inexcedível de Rod Steiger, como o judeu atormentado pelo passado e que vive trancafiado em seu trabalho como dono de uma casa de penhor (que revi recentemente no Telecine Cult); neste filme, quase todo rodado em exteriores, na agitação da selva de pedra novaiorquina, Lumet usa com um sentido muito preciso o flash-back super rápido, que seria muito imitado por outros cineastas, sabendo absorver, e bem, os ensinamentos dos lances de memória resnaisianos; A colina dos homens perdidos (The hill, 1965), que se passa num campo de trabalho forçado e, pela primeira vez, apresenta Sean Connery numa interpretação que atesta a sua força de grande ator; Chamada para um morto (The deadly affair, 1967), eficiente thriller que tem James Mason; Serpico (1973), com Al Pacino como um policial sui generis na labuta diária do crime em cidade grande; Um dia de cão (Dog day's afternoon, 1975); Rede de intrigas (Network, 1976), com William Holden, Faye Dunaway e Peter Finch, que focaliza os bastidores nada reluzentes de um canal televisivo e deu, por este desempenho, um Oscar a Finch, que morreu logo depois das filmagens; A manhã seguinte (The morning after, 1976), filme esquecido e desprezado sobre o alcoolismo, com Jane Fonda e Jeff Bridges, O veredicto (The verdict, 1982), com forte presença de Paul Newman como o advogado alcoólatra que pega um caso como última tentativa de redenção,  entre outros.

Que a terra lhe seja leve, caro e querido Sidney Lumet!

4 comentários:

Jonga Olivieri disse...

Sim André. Lembrei docê. E eu que um dia antes estive com o dvd de "O Homem do Prego" nas mãos, mas acabei levando "O Anjo Exterminador" de Buñuel. Se tivesse sabido da morte dele, sem dúvida que, mesmo por razões sentimentais teria levado o primeiro.

André Setaro disse...

Vimos 'O homem do prego' em 1967 no antigo, e já extinto, cinema Popular em Salvador, quando você estava 'fugitivo'.

Filipe Dunham disse...

O primeiro filme de Lumet que vi foi Rede de Intrigas. Confesso que fiquei chocado com a abordagem caústica e corrosiva que Lumet atribuiu à temática do filme, representando a grande mídia de maneira crua, pesada, quase maniqueísta e adorniana. As interpretações são excelentes, a começar por Peter Finch, que, ironicamente, faleceu de enfarte após as filmagens e ganhou o Oscar póstumo. Faye Dunaway também está ótima, como um robô ambicioso, sexy e mau caráter, capaz de cometer qualquer atitude se for para chegar a seus objetivos. Enfim, gosto muito de Lumet. Depois de Rede de Intrigas assisti alguns outros dele e sempre o achei um cineasta muito competente. O tempo passa, mata, mas o bom legado de gente como Sidney Lumet ficará para sempre.

Jonga Olivieri disse...

Lembro disto até hoje, pois era um tempo em que nos lembrávamos de qual o cinema em que assistíamos um determinado filme!