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25 janeiro 2007

A senhora e seus maridos


Há filmes que, vistos na infância e adolescência, nunca mais são reprisados e, em conseqüência, vão embora para sempre. Assim foi com A senhora e seus maridos (What a way to go, 1964), que, tendo-o visto na época de seu lançamento, adolescente que era, agradou-me sobremaneira, principalmente porque um veículo para Shirley MacLaine, então uma estrela de primeira grandeza. 43 anos se passaram desde que vi What a way to go até que, nesta semana, olhando as ofertas de DVDs nas Lojas Americanas, deparei-me com um monte de disquinhos em oferta, todos de A senhora e seus maridos por modestos 19,90. Comprei-o no ato, incontinenti. O que estava em causa era a impressão adolescente que tivera do filme em contraste com o tempo que, passando, modifica a sua percepção. Como reagiria a What a way to go nestes bicudos tempos? Recordo-me que, na época, e o vi, em Salvador, no Liceu várias vezes, achei-o bem criativo, refinado, atraente. Comédia bem típica de uma época, a da sophisticated comedy, What a way to go tem, para começar, roteiro de Betty Comden e Adolphe Green (basta dizer que foram os roteiristas de Cantando na chuva, entre outros grandes e inesquecíveis musicais da MGM na fase Arthur Freed), que se basearam num argumento de Gwen Davis. Exemplo de um filme que tropeça por causa do diretor, o mão pesada J. Lee Thompson, que dirige administrativamente um roteiro bastante indicativo para a criatividade no ato de dirigir. Thompson não soube aproveitar as deixas contidas no screenplay, mas, mesmo assim, este, tão substantivo, mesmo em mãos de um Thompson, faz resultar num espetáculo que possui uma promessa retroativa..MacLaine é uma mulher que se casa várias vezes porque seus maridos sempre estão a morrer em acidentes. Embora com o propósito de ser feliz sem que, necessariamente, para isso, venha a ficar rica, o fato dela casar com alguém proporciona àquele que vier a desposá-la súbita riqueza. Habitante de uma pequena cidadezinha interiorana, troca o milionário local, um comerciante abastado (Dean Martin), pelo pobre Dick Van Dyke, que, casando-se com ela, torna-se rico e termina por morrer de tanto trabalhar. Decepcionada, MacLaine vai descansar em Paris, mas, na Cidade Luz, encontra o pintor Paul Newman, que usa máquinas como pincéis para seus quadros abstratos. Há uma sátira bem feita ao intelecutalismo e à mania do abstracionismo então em voga. Mas no filme, cada casamento de MacLaine, que narra, é ilustrado cinematograficamente, isto é: o de Van Dyke como uma fita muda, o de Newman, como uma do realismo poético francês. Mas Newman acaba sendo vítima de sua exasperação como artista, vítima das máquinas que utiliza, que lhe enforcam. A senhora do título em português desta vez se casa com um milionário, Robert Mitchum, e a ilustração é na base da comédia sofisticada, quando MacLaine desfila uma porção de vestidos todos assinados por Edith Head. Em seguida, Gene Kelly, pobre dançarinho de uma espelunca, que vira astro, de repente, e morre atropelado pelos fãs. Na ilustração do casamento, um filme musical, como não poderia deixar de acontecer. What a way to go tem MacLaine, sempre um talento, uma graça, mas como comédia deixa muito a desejar, apesar do roteiro de Comden e Green (este trabalhou como com Alain Resnais em Quero ir para casa/I want go home), da partitura de Nelson Riddle, das canções de Jule Styne. Pelo que se pode observar, o material em outras mãos, que não as de J. Lee Thompson, poderia ter resultado num filme admirável, caso tivesse, este material, sido transformado esteticamente em obra cinematográfica com uma narrativa ao gosto de um Billy Wilder, Frank Tashlin ou, mesmo, um Richard Quine.

Um comentário:

Anônimo disse...

É... Tempos áureos do cinema estadunidense!
Não só as comédias, como também os westerns, os melodramas.
Hoje se resume a barulhos explorando os efeitos e recursos mirabolantes de som.