Publicado originariamente no Terra Magazine há duas semanas, 
republico aqui, neste ocaso do velho 2012, os melhores filmes que vi neste ano. 
Perdi alguns importantes, como parece ser o caso de Drive, do 
dinamarquês Nicolas Winding Refn, bastante apreciado pela crítica e que, 
apresentado em Cannes, foi aplaudido de pé. Não deixei esperar que o ano se 
findasse para a publicação de meus melhores (como deveria ser feito). E a pressa é sempre inimiga da perfeição. O 
aguardado Holly Motors, que, tudo indicava, parecia filme da relação 
tradicional dos melhores, deu-me impaciência e aporrinhação. Talvez seja a 
idade. Feliz 2013 para todos. Se há possibilidade disso.
1.) FAUSTO (Faust), 
de Aleksandr Sokurov, com Johannes Seiler (Fausto), Anton Adasinsky, entre 
outros. Discípulo de Andrey Tarkovsky, Sokurov, realizador notável pela maneira 
na qual se utiliza da linguagem cinematográfica (A arca russa é 
um exemplo de experimentalismo radical com o plano-sequência), encerra a sua 
tetralogia dos homens políticos numa reflexão sobre a ânsia humana da conquista 
do poder. A essência do mito de Fausto (tão bem exposta por Murnau numa 
obra-prima do expressionismo alemão ainda no tempo do mudo) encontra aqui a sua 
postura contemporânea. É o melhor filme de 2012.
2.) A 
SEPARAÇÃO (Jodaeiye Nader az Simin), de Asghar Farhadi, com Leila 
Hatami, Peyman 
Moadi, Sarina Farhadi. Depois do boom e 
certo esgotamento do neorrealismo 
iraniano dos sapatinhos perdidos, um filme adulto, denso, com uma 
visão ácida e crítica da sociedade iraniana. Um homem, após se divorciar, 
vê-se obrigado a contratar jovem para cuidar do pai que sofre de 
Alzheimer, mas 
ela se encontra grávida, trabalhando sem o consentimento do marido. 
A realidade 
pulsante de uma sociedade presa a grilhões da intolerância. Urso de Ouro no 
Festival de Berlim.
3.) MISTÉRIOS 
DE LISBOA, de 
Raoul Ruiz., com Adriana Luz, Ricardo Pereira, outros. Realizador barroco e com 
acentos surreais, dono de uma filmografia de 117 filmes, este filme 
surpreendente, ainda que seus 275 minutos de projeção (4 horas e 15 minutos), 
não perde o seu encanto no decorrer do tempo. Uma viagem em torno da Portugal de 
Camilo Castelo Branco a partir de uma condessa obcecada pelo ciúme e sedenta por 
vingança, um próspero homem de negócios com passado de pirata sanguinário, um 
padre que de aristocrata e libertino se converte em justiceiro, e um garoto 
órfão em colégio interno. Filme que se coloca à parte na mediocridade atual do 
cinema contemporâneo e um dos mais belos do ano que ora se 
finda.
4.) ESSENTIAL 
KILLING – MATAR PARA VIVER (Essential KillING), de Jerzy Skolimowsky, com Vincent 
Gallo, Emmanuelle Seigner. Thrillerangustiante 
e político, quase sem diálogos, realizado pelo talento incomum de Skolimowsky 
(O ato final, O 
Uivo...), 
obra de impacto pela condução da narrativa, pelo seu aspecto minimalista e pelo 
extraordinário uso das cores. Capturado pelo exército norte-americano no 
Afeganistão, um homem é enviado para um centro de detenção secreto situado  na 
Europa de Leste. Como um animal em fuga, perdido naquela paisagem branca e 
gélida, ele tem apenas uma opção de sobrevivência: obedecer aos seus instintos 
mais básicos.
5.) COSMÓPOLIS (Cosmopolis), 
de David Cronenberg, com Robert Pattinson, Kevin Durand, 
Sarah Gadon, Juliette Binoche, Mathieu Amalric, Paul Giamatti´. Nos 
insólitos filmes desse canadense inventivo e inconformista, 
geralmente há 
a questão dos limites humanos na sua ambiciosa intervenção 
científica para 
uma mutação dos homens e das coisas. (Gêmeos – Mórbida semelhança, A mosca etc). 
Aqui, um dia na vida de um milionário especulador numa Nova York assolada pelo 
capitalismo cada vez mais selvagem. Estranho, perturbador, outro Cronenberg 
sempre bem-vindo.
6.) HABEMUS 
PAPAM (idem), 
de Nanni Moretti, com Michel Piccoli, Nanni Moretti, Jerzy Stuhr, Franco 
Graziosi. Um conclave no Vaticano para escolher um novo Papa não chega a um  
consenso e decide por um desconhecido cardeal, que, não se achando preparado 
para a alta função, tem ataque de pânico e foge pelas ruas de Roma. O cinema 
italiano, que já foi, décadas atrás, um dos melhores do mundo, na sua decadência 
atual colhe poucos frutos, a exemplo desse filme de Nanni Moretti (que também 
trabalha como ator no papel do psiquiatra).  Sátira que oscila entre o trágico e 
o cômico, com acentos tchechovianos, pode ser considerado um dos melhores do 
ano.
7.) 007 
– OPERAÇÃO SKYFALL (Skyfall), de Sam Mendes, com Daniel Craig, Judi Dench, 
Javier Bardem. A inclusão deste filme, entre os melhores do ano, é uma homenagem 
ao cinema-espetáculo tão banido quando a aferição do que é bom cinema se atrela 
mais à sisudez temática que, muitas vezes, detona uma operação fílmica mais 
voltada para a aporrinhação do que para o prazer. Dentro dos limites de seu 
gênero – cinema de gênero, portanto, e não de autor, Skyfall, 
que comemora os 50 anos do agente secreto criado por Ian Fleming nas telas, é um 
espetáculo que seduz pelo ritmo e pela repaginação de 
seus elementos de fábula.
8.) A 
MÚSICA SEGUNDO TOM JOBIM, 
de Nelson Pereira dos Santos. Exceção se faça a poucos documentários brasileiros 
(e, entre eles, os de Eduardo Coutinho), o que os caracteriza é o 
feijão-com-arroz do amontoado de entrevistas articuladas numa estrutura 
audiovisual gasta e repetitiva. O veterano Pereira dos Santos soube driblar a 
mesmice num filme feito somente com imagens e música sem a adição de vozes 
distantes a não ser aquelas que cantam as canções. E a música do maestro Tom 
Jobim promove a linguagem musical brasileira a um patamar de excelência e 
exclusividade. Não resta a menor dúvida: Jobim é o melhor compositor brasileiro 
de todos os tempos e o filme faz uma homenagem à altura de seu 
gênio.
9.) INTOCÁVEIS (Intouchables), 
de Olivier Nakache e Eric Toledano, com François Cluzet, Omar Sy. Após acidente 
de pára-quedas, rico aristocrata contrata jovem recém-saído da prisão para 
ajudá-lo no infortúnio. Apesar de gênios incompatíveis aparentemente, o passar 
do tempo determina que eles se compreendam, nascendo, daí, uma grande amizade. 
Os realizadores demonstram aptidão para a análise de comportamentos e o 
resultado é, simplesmente, surpreendente, revelando um excelente momento do 
cinema francês contemporâneo. O filme é pleno de observações interessantes sobre 
as idiossincrasias do ser humano.
10.) A 
INVENÇÃO DE HUGO CABRET (Hugo), de Martin Scorsese, com Asa Butterfield (Hugo 
Cabret), Bem Kingsley (Méliès), Sacha Baron Cohen (Inspetor da estação), 
Christopher Lee (Monsieur Labisse), Emily Mortimer (Lisette), Jude Law (pai de 
Hugo), Bem Addis (Salvador Dali),  
entre outros. A ação se passa em Paris nos anos 30. Singela homenagem ao gênio 
de Georges Méliès feita por um ardoroso cinéfilo e cineasta. Méliès é o pai da 
ficção (Voyage dans la lune…) 
enquanto os irmãos Lumière do registro sem artifício. Scorsese, em seu primeiro 
filme em 3D, usa o processo para potencializar os efeitos mágicos dos filmes de 
Méliès. Magia e encanto. Encanto e magia.
Hors 
concurs: 
ESSES 
AMORES (Ces amours-là), de Claude Lelouch, com Audrey Dana, Laurent Couson, 
Samuel Labarthe. Lançado no ano passado, e, por não tê-lo visto, omitido da 
relação dos melhores, apenas o vi em 2012 em DVD, mas não poderia deixar de 
citá-lo aqui nesta relação. Quadragésimo terceiro filme de Lelouch, poeta das 
imagens e da mise-en-scène, 
do qual sou admirador inconteste, e que assinala os cinqüenta anos desse 
realizador na atividade cinematográfica, o filme é um painel sobre os encontros 
e desencontros de pessoas que abrange um tempo dramático de um século – aliás 
bem ao gosto do autor (Retratos da vida, Toda uma vida etc). Ces 
amours là, 
além do painel histórico, é, sobretudo, um filme sobre o amor e uma homenagem ao 
cinema e ao próprio realizador. Inspirado, sensível, poético, com partitura do 
sempre presente Francis Lai e Laurent Couson. A sequência final é um 
testemunho  de sua 
grandeza.
P.S: Entre os filmes nacionais, a neo-chanchada deu o tom negativo do cinema brasileiro, com mixórdias como Os penetras, De pernas p'ro ar 2, E aí, comeu?, entre outras, que fazem das antigas chanchadas obras-primas da arte do filme. As neo-chanchadas se utilizam da linguagem televisiva e não há, nelas, nenhum apuro cinematográfico. Destaco dois filmes do cinema nacional como os melhores do ano: O homem que não dormia, do baiano Edgard Navarro, e Febre do rato, de Cláudio Assis.
P.S: Entre os filmes nacionais, a neo-chanchada deu o tom negativo do cinema brasileiro, com mixórdias como Os penetras, De pernas p'ro ar 2, E aí, comeu?, entre outras, que fazem das antigas chanchadas obras-primas da arte do filme. As neo-chanchadas se utilizam da linguagem televisiva e não há, nelas, nenhum apuro cinematográfico. Destaco dois filmes do cinema nacional como os melhores do ano: O homem que não dormia, do baiano Edgard Navarro, e Febre do rato, de Cláudio Assis.

 
 
3 comentários:
Realmente me toca profundamente o esvaziamento do cinema italiano. O que sobrou de um rico passado arquivamos em dvd's. Ainda bem que hoje podemos faze-lo. Mas... Fica a nostalgia no ar...
Setaro, infelizmente me falta o Essential Killing da sua lista, que desconfio também faria parte da minha. Muito bem lembrado o Mistérios de Lisboa de Ruiz. Abraço.
Entre os nacionais faltou Sudoeste( filma ímpar em 2012, em estética e roteiro), A música segundo Tom Jobim e Eu receberia as piores notícias dos seus lábios.
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