1) Mais um vídeo sobre a deformação que um filme pode ser vítima quando exibido na televisão ou distribuído em DVD (é verdade que muitas distribuidoras respeitam o formato). Ontem, au hasard, deparei-me com Se meu apartamento falasse (The apartment, 1960), uma das melhores comédias de Billy Wilder, sendo mostrada em cinemascope no Telecine Cult. Qual o critério, pergunto de novo, pois alguns filmes passam deformados em fullscreen (ou foolscreen, como quer Romero Azevedo), sendo que em outros são preservados seus formatos originais.
2) Sobre preparador de elenco, um comentário de Rodrigo faz remeter a um bom artigo sobre o assunto publicado na Revista Piauí que tem como foco central a preparador-mor do cinema brasileira: a polêmica Fátima Toledo, que se diz influenciada por Stella Adler, famosa professora de arte dramática do Actor's Studio ao lado de Lee Strasberg. Vejam o indispensável link:
3) Há, isto sim, um componente de sadismo exacerbado na preparação dos elencos dos atuais filmes brasileiros. Cheguei ao radicalismo de afirmar: não vejo filmes cujos elencos tenham preparadores de elenco. Ou, então, esta chiquérrima: preparador de elenco e merda para mim são a mesma coisa.
7 comentários:
Olá,André.Fiz um comentário sobre sua enquete Hitchcock.
No blog wwww.alessandrocoimbrablog.blogspot.com
Nada disso pode ter "utilidade",mas parabéns pela lúdica iniciativa.
É do pequeno que a arte opera.
Conheço algumas pessoas que trabalharam no processo de produção de um filme que foi filmado lá pelas bandas de Lençóis, Mucugê, Chapada, etc.
Enquanto o staff ainda permanecia em Salvador, cheguei a acompanhar o local de encontro da equipe, a fim de ter um contato mais próximo com o esquema de pré-produção de um filme.
Percebi que o trabalho de produção de elenco serve como um "meio de campo" entre o diretor e os postulantes à atores. Percebi, também, a total falta de interesse do diretor (que se posicionava como o principal mentor da obra) em relação aos atores escolhidos pelo produtor. Com aquele perfil workaholic, sempre atarefado, cheio de coisas para resolver imediatamente, mas sem abrir mão de sua bata zen com estampas indianas, ele simplesmente perguntava, a esmo: "Já escolheu o cara de tal personagem? E aquele outro? Como andas isso?" e saia ao ouvir as respostas igualmente apressadas e rápidas do meio campista da dramaturgia cinematográfica.
Enxerguei esse processo como ineficiente e prejudicial à sinceridade das atuações no filme. Como o diretor vai poder orientar e dirigir seus atores, se ao menos nem foi ele que escolheu, mas estes apareceram em sua frente, eleitos por um terceiro?
Será que Billy Wilder precisou de um produtor de elencos para selecionar Gloria Swanson em Sunset Boulevard? E olhe que, segundo a lenda, a atriz era a quinta opção para o papel de Norma Desmond. Como o produtor iria conseguir perceber qual a melhor atriz para tal personagem, se ele não é o autor da obra, logo, se ele não sente o que se encaixa melhor para o processo criativo?
Dessa forma, penso que a função do produtor de elencos atrapalha o surgimento de boas atuações dramatúrgicas no cinema. Saquei isso de perto e vou esperar o filme ficar pronto para avaliar melhor esse ponto.
Tomara que isso fique restrito aos diretores ruins, que, antes de serem realizadores que pensam e falam cinema, são meros vencedores de editais.
Filipe Dunham
Perfeito Filipe o que você diz:
"Enxerguei esse processo como ineficiente e prejudicial à sinceridade das atuações no filme. Como o diretor vai poder orientar e dirigir seus atores, se ao menos nem foi ele que escolheu, mas estes apareceram em sua frente, eleitos por um terceiro?"
A existência de preparadores de elenco é uma 'aberratio'. Uma aberração. Imaginem o grande Billy Wilder com preparador de elenco. E um John Ford. Este o chutaria e daria socos ou até mesmo atirasse, se as balas no set não fossem de festim.
"Meros vencedores de editais", tá mais que explicado. Perfeita a identificação.
P.S. Fico imaginando Bergman naquela ilha à espera do preparador de Liv Ulman, Bibi Anderson e Max Von Sydon.
Sim, Romero, o exemplo é ótimo. Bergman a esperar ao lado de Bibi, Liv e Max a chegada a ilha de Faro do preparador de elenco. Simplesmente ridículo.
A famigerada Fátima Toledo faz verdadeiras sessões de psicoterapia com os atores, chegando um deles, em 'Cidade Baixa', de Sérgio Machado, a regredir ao útero materno e, logo em seguida, entrou em convulsão, atrasando o cronograma das filmagens.
A característica autoral do diretor de cinema vem cada vez mais se defasando. A presença do preparador de elencos prova isso, já que o diretor (pelo menos aqueles que pretendem ser reconhecidos com o status de autor) impõe seu estilo no ato da criação do filme, também, na forma com a qual os atores irão dramatizar. Mas tem diretor que dispensa este trabalho, deixando-o a cargo de seu preparador. Então, se um produtor de elenco já é suficiente para que o filme perca a qualidade na parte dramatúrgica, o preparador termina por assassinar qualquer traço autoral do diretor em seus atores.
Isso pode resultar em algo gravíssimo para quem gosta de filmes: uma película incapaz de nos encantar em sua farsa de representar a realidade, independente se de forma fiel ou não. O cinema, enquanto uma expressão artística, um espetáculo, deve nos despertar fascínio. Não vejo isso ser possível sem que os atores sejam guiados, unicamente, pelas orientações do criador da obra, nunca por outra figura, pois a sétima arte também fala através das atuações. Crepúsculo dos deuses, mesmo com toda influência expressionista em Wilder, seria o mesmo filme sem aquela Norma Desmond? Não creio nisso. Será que podemos afirmar que diretores que trabalham com preparadores de elenco não são autênticos criadores? Ou a dramaturgia atingiu um nível secundário na significação do filme, podendo o diretor, sem medo, relegar essa função para as Fátimas Toledos?
John Ford iria vestir o tal do preparador com uma roupa de índio e mostrá-lo, na prática, como John Wayne deveria interpretar Ethan Edwards em "The searchers". Sem balas de festim, diga-se de passagem.
Filipe Dunham
Não seria surpreendente elogiar a lucidez de Filipe, porque sempre lúcido e coerente. Mas seu comentário tem tudo a ver e concordo em número e grau com as suas palavras.
A insuficiência dramática de 'Quincas' é um exemplo de como o preparador de elenco deixa um filme anêmico e sem vida. O 'décor', neste filme, está eleito como um elemento mais importante do que a dramaturgia.
Bata-me correndo um abacate!
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