Entre os 37 votantes na enquete que pergunta sobre o melhor western, Rastros de ódio (The seachers, 1956), de John Ford, ganhou folgado, obtendo 12 votos (32%). Realmente o filme é uma obra-primíssima, um dos monumentos da arte do século XX. Surpreendeu, no entanto, o tracinho para Consciências mortas (The ex-box incident, 1943), western aclamadíssimo de William Wellman, com Henry Fonda, Anthony Quinn, Dana Andrews, que, sobre ser uma obra de forte conotação social e denúncia contra a hipocrisia de uma sociedade, é bem típica do gênero. Ainda que lançado em DVD, Consciências mortas parece que é um filme apenas conhecido de alguns críticos mais velhos e que possuem a tal necessária base referencial.
Acredito que The seachers ganhou em primeiro lugar porque é um filme hoje bastante citado. E mais por isso mesmo. Considero particularmente a obra maior de John Ford e um dos melhores filmes que já pus os olhos. Mas, a julgar pelo resultado da enquete, os filmes que estão mais em exposição, e estão sempre em referências nas alusões críticas, possuem mais probabilidade de serem votados. E a preferência dos votantes recaiu, ao que parece, numa ligação mais afetiva do que histórica, a considerar os minguados dois votos (5%) para No tempo das diligências (Stagecoach, 1939), de John Ford, obra emblemática e arquetípica, ponto de partida do western moderno.
Se a enquete tivesse sido feita há duas, três décadas, Matar ou morrer (High noon, 1952), de Fred Zinnemann, não ficaria com um voto mirrado (2%). Paráfrase sobre o maccarthismo, foi um filme muito admirado em sua época, um sucesso, que deu origem, inclusive, a uma paródia de Carlos Manga com Oscarito e Grande Otelo: Matar ou correr. Em High noon - a música fica no ouvido, estou a ouvi-la digitando esta, Gary Cooper é um xerife que se vê ameaçado por três criminosos. Mal termina a cerimônia de seu casamento com Grace Kelly, tem que se defender, e defender a sua cidade, mas seus habitantes, por covardia, negam-lhe apoio. O homem que matou o facínora (The man who shoting Liberty Valance, 1962) é um belíssimo (redundância a considerar que a maioria dos filmes de Ford é belíssimo) Ford, que Peter Bogdanovich tem como obra que sentencia o fim do gênero. Teve 5 votos (13%).
Depois de Rastros de ódio quem obteve mais votos foi Os brutos também amam (Shane, 1953), de George Stevens, com Alan Ladd (9/24%), o segundo colocado, portanto. Entre os especialistas, um notável e muito reverenciado é Onde começa o inferno (Rio Bravo, 1959), de Howard Hawks, mas, aqui, recolheu 4 votos (10%).
Parece que ninguém viu Pistoleiros do entardecer (Ride the high country, 1962), de Sam Peckinpah, western crepuscular, sobre a decadência de dois pistoleiros (Joel McCrea e Randolph Scott). Um filme vigoroso e poético. Por falar em Peckinpah, esqueci de colocar na enquete Meu ódio será tua herança (The wild bunch, 1968), com William Holden, Robert Ryan. Pena!
6 comentários:
Eu teria votado em "Rastros de Ódio" também, por pura preferência pessoal, mas acho que faltou na lista "Rio Vermelho".
O mais interessante é que "Rio Vermelho" é o melhor filme a retratar com acurácia o fenômeno histórico dos cowboys -- os verdadeiros, aqueles tropeiros que tiveram existência efêmera como o Pony Express.
Acho que faltou também o western spaghetti. "Era Uma Vez no Oeste" é páreo duro para qualquer filme, e em termos de revitalização do western muito mais importante, eu acho, que The Wild Bunch.
Sim, "Era uma vez no Oeste" é um grande filme, mas, na enquete, preferi privilegiar os americanos clássicos.
Meu voto foi para "O homem que matou o facínora" por causa da relação entre os personagens de John Wayne e James Stewart. A discussão, para mim (se é que eu enxerguei direito), ultrapassa o filme e chega à filmografia dos próprios atores, e da construção do herói de western, por parte de Wayne, e do bom moço dos filmes de Capra, por parte de Stewart.
Sem sombra de dúvidas "Rastros de ódio" é um grande filme.
Porém, como já lhe havia dito, a escolha era difícil. Muito difícil. "No tempo das diligências" é um marco. "Matar ou morrer", o filme que é considerado o grande western "psicológico" também é uma obra-prima.
Agora, proponho que faça uma enquete dos "spaghetti". Talvez valesse a pena.
Sim, uma enquete do 'western-spaghetti' é uma boa idéia. Fa-la-ei em tempo hábil e oportuno. Muito criticado quando de sua fase áurea, nos anos 60, chegando, inclusive, a ser motivo de um artigo na extinta 'Filme/Cultura' da lavra de Paulo Perdigão, que, negando suas qualidades, chamou-o de 'um cinema apátria'. O espírito revisionista se deu início quando da explosão magnífica que foi 'Era uma vez no Oeste', de Sergio Leone, quando a crítica começou a olhar com mais atenção aos 'spaghettis'. Viu-se que 'Por um punhado de dólares' e 'Por uns dólares a mais', ambos de Leone e com Clint Eastwood, eram bons filmes, assim como 'Django', com Franco Nero, entre muitos outros. O mesmo aconteceu com o filão pseudo-histórico do crepúsculo dos anos 50 e primeira metade dos 60, quando se viu que 'A revolta dos gladiadores', 'As façanhas de Hércules', 'Maciste na terra dos gigantes', entre muitos outros, eram obras interessantes e de certa originalidade na encenação, na 'mise-en´-scène'.
Consciências Mortas é um grande filme, mas é um falso faroeste. Está muito mais próximo de um drama de tribunal, só que ambientado no oeste.
Tirando os filmes de Ford e Shane, que são unanimidades, adoro o A Face Oculta, de Marlon Brando, os faroestes de Anthony Mann (Um Certo Capitão Lockhart, especialmente), JOhnny Guitar, de Nicholas Ray, e O Diabo Feito Mulher, de Fritz Lang.
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