O affair que aconteceu na tarde de terça última, durante uma mesa do III Seminário Internacional de Cinema e Audiovisual, comentado e discutido, por causa da agressão do cineasta Edgard Navarro a este bloguista, já são favas contadas e passadas. O pivô de tudo o artigo que publiquei em A Tarde - e que também está publicado aqui logo abaixo. Volto a dizer tudo que disse: os realizadores baianos não passam de mendigos das burras do estado e que o cinema sempre refletiu a sua cultura e o seu momento histórico. Neste particular, considerando a nossa imensa miséria cultural, o cinema praticado na soterópolis vem a refleti-la. O texto abaixo, que saiu hoje publicado em A Tarde, "A vanguarda da derrière", é de autoria do jornalista Franciel Cruz. Achei de reproduzi-lo aqui e pedi o seu consentimento. Ele aceitou. A ilustração poderia ser a de um derrière, mas preferi um envelope de Paul Klee.
"Este balanço na órbita do universo é exatamente o que vocês estão pensando: mais uma polêmica no, com o perdão da má palavra, audiovisual baiano. Eu estou cansado, mas não para dizer: Se a cada mil chiliques dos artistas locais ganhássemos, em contrapartida, um filme que prestasse, a Bahia seria o maior celeiro de obras-primas da cinematografia latino-americana. (E prosseguimos honrando esta gloriosa tradição. Ai, deixem meu cabelo em paz).
A novidade, se é que podemos chamar assim, é que atingimos um novo patamar.O menino Drummond dizia que “Lutar com as palavras é a luta mais vã”. E, em seguida, acrescentava. “Entanto lutamos mal rompe a manhã”.
Acontece que o cineasta Edgard Navarro só escutou a primeira parte do ensinamento do poeta. E, ontem à tardinha, no III Seminário Internacional de Cinema, abandonou a batalha vã dos argumentos. Para rebater as constatações do professor André Setaro sobre a falta de continuidade na produção local, mostrou a bunda como contestação - mesma atitude tomada recentemente por, desculpem o palavrão, Gerald Thomas. Não deixa de ser uma evolução. Em priscas eras, encerrava-se o debate de modo fálico, com uma banana. Hoje, variamos o cardápio. Somos a vanguarda do derrière.
Mas, qual heresia disse Setaro que provocou tamanha indignação? Às aspas: “Fazem-se filmes na Bahia de vez em quando e ao sabor dos editais governamentais, os únicos que podem proporcionar a realização de longas-metragens, porque o cinema exige altos recursos e somente o Estado tem a capacidade de socorrer os cineastas ditos baianos, que vivem à sua mercê”. Resumindo: os cineastas são mendigos da boa vontade oficial.
Pois é. Nada de novo, conforme atestam os alfarrábios. Há exatos 18 anos, em 1989, no número 13 da Revista da Bahia, houve um debate com estes personagens na Associação Bahiana de Imprensa. Pois muito bem. Noves fora a eterna ladainha pela perda de Glauber Rocha, o chororô era o mesmíssimo: falta de verbas governamentais. Valei-me, meus culhões de Cristo.
Mas, retorno à cizânia da tarde de ontem e vejo que, antes de apelar aos dotes de seu traseiro, Edgard Navarro afirmou que Setaro “só faz bater no cinema baiano nos últimos 20 anos”.
Não procede.
Aliás, em relação à obra do cineasta, o referido professor tem sido até generoso, elevando à categoria de obra de arte filmes feitos pelo mesmo Edgard. Quem quiser conferir, basta acessar o blog de Setaro. Eis o endereço: http://setarosblog.blogspot.com.Porém, somente o elogio não é o bastante. Tudo na Bahia tem que ser lindo, divino, maravilhoso. É o tal fantasma da baianidade que nos persegue, que nos faz recusar sempre algo que não seja o reconhecimento de uma suposta (e inexistente) genialidade. Poderia ainda dizer que, ao usar a bunda como expressão, Edgard apenas está se inserindo na linha evolutiva da cultura baiana. Não digo. Já falei demais, o telefone está caro, vou desligar, obrigado pela atenção."
4 comentários:
Nossa...inacreditavel tudo isso.Vendo as proporções que isso tomou.
Mas para mim eis que surge um novo significado para o pensar(e quem sabe fazer) cinema aqui na Bahia.E principalmente sobre essa nova "onda". Acho que a nova geração tão esperada não aconteceu...tá tudo se acabando, tá tudo piorando.
Nostradamus é que tinha razão!
Acompanhei o desenlance da polêmica, e, desde o início vi claramente o seu conteúdo.
Embora esteja longe do cinema baiano, é sem sombra de dúvida evidente a sua crise.
Afinal, a Bahia já nos deu um Glauber Rocha. E daí em diante?
Não quero desmerecer as tentativas posteriores de continuar a tentativa de fazer um bom cinema na 'boa terra', mas, creio que nos dias de hoje -- reflexo de uma crise até maior --, a coisa degringolou. Em outras palavras: não se faz mais cinema como antigamente.
Infelizmente...
De fato o cinema baiano (não entendo porque afirmar que inexiste um "cinema baiano" sob o argumento de que falta uma sequência continuada de filmes e filmes com características comuns. Há cinema baiano como há teatro baiano e música baiana - a qual, por sua vez, não é ou não deveria ser sinônimo de axé music) - o cinema baiano - aqui, de longe, pouco, quase nada, parece produzir algo que preste. E talvez seja irônico que a confusão instalada tenha partido justamente daquele que "salvou a honra" desse cinema com o belo Eu me lembro.
A produção cinematogáfica da Bahia depende do Estado, é mendiga do Estado. Mas isso é realidade brasileira, não vejo por que a ênfase no "baiano". E assim como não acho que os cineastas devam se ofender com essa constatação, não acho que ela deva ser passada como ofensa ou como demérito. A dependência estatal de que é cometido o cinema vai além de qualquer insinuação quanto a "parasitismo" por parte de artistas e isso é óbvio.
O que aconteceu no dia 10/07 pela tarde, no TCA, foi realemnte lamentável. Mas tenho uma vontade: gostaria de ler um artigo seu sobre BERGMAN.Admiro demais esse fantástico cineasta.
Grata,
Marcele.
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