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17 julho 2006

Poesia e sensibilidade



Ainda insisto em me inquietar com o tempo que passa, pois parece que vi Beijos roubaods (Baisers volés, 1968), de François Truffaut, no máximo há uma década. Ontem, domingo, o revi no Cult - que está melhorando sua programação, dos canais Telecine (Net/Sky). Passados 38 anos de sua realização, o filme tem uma fluência narrativa que parece ter sido feito hoje, principalmente na utilização das elipses, dos cortes, das transições. Exibe um frescor, uma espontaneidade, e uma necessidade de pegar o instante para que o amor se perpetue, ainda que na ilusão desse mesmo instante captado. Realizado nos turbulentos meses de 1968, François Truffaut faz uma comédia romântica que ficou preservada das circunstancialidades, das contingências do momento. Mas não deixa de se referir às turbulências em alusões passageiras. A seqüência do escritório dos detetives, já no final, é elucidativa do método do realizador em apanhar uma série de situações num plano geral com discretos movimentos de câmera. Assim, vê-se o escritório com Antoine Doinel sendo chamado pelo chefe da agência e, quando sai, fala com o velho detetive, que fica fora de campo. Num movimento de câmera, estando, ainda, na mesma tomada, toma-se conhecimento da morte deste, que é fulminado por um ataque e cai, desfalecido, no chão. Ou seja: o velho e simpático detetive morre fora de campo.

Jean-Pierre Léaud está perfeito como Doinel - excelente quando, diante do espelho, fica repetindo o nome da personagem de Delphine Seyrig e de Claude Jade e dele próprio. Baisers volés respira um frescor, como foi dito acima, que responde como a renovação detonada pela Nouvelle Vague. Um cinema menos rígido, menos literário, feito de pequenas situações, e que procura a expressão dos sentimentos dos personagens, que não deixam de ser a vox do autor. A belíssima canção de Charles Tranet abre e fecha o filme. O primeiro plano de Beijos roubados aponta em direção da entrada da Cinemateca Francesa, cujo presidente, Henri Langlois, fora deposto por André Mauraux, provocando protestos unânimes dos maiores cineastas. Episódio que Bernardo Bertoluci retrata no início de Os sonhadores.

Sai-se do filme, depois de tê-lo visto, flutuando.

2 comentários:

Amanda Luz disse...

... E viva Truffaut!

Procurarei ver este filme.
bjo!

Anônimo disse...

Estou copiando em DVD toda a programação. Hoje, temos Jules & Jim. De fato, o TelecineCult está melhor: viu que está passando uma mostra Kieslowski? Copiei também A Cicatriz e sua fotografia fúnebre, quase preto-e-branco. Belíssimo!