Seguidores

10 maio 2008

Justiça é feita a "Revoada"



O realizador baiano José Umberto, autor do longa Revoada, já marcou um tento com o bloqueio determinado por um juiz da Justiça Federal da parcela ainda a ser recebida da conta da produtora de Rex Schindler. O imbróglio foi várias vezes aqui comentado, mas para quem ainda não sabe, este último sequestrou o copião (material filmado) do filme de Umberto, que estava a ser editado pelo montador Severino Dadá no Rio de Janeiro segundo as indicações estabelecidos pelo diretor, que também se encontrava nesta cidade a acompanhar a montagem de seu filme. Mas circunstâncias da vida determinaram-lhe a vinda urgente a Salvador para se submeter a uma cirurgia. Foi então que entrou em cena os produtores associados à frente Schindler, que, por ser o produtor, e não satisfeito com a montagem do autor, Umberto, seqüestrou o material para fazer uma edição mais a gosto do mercado. Segundo os produtores, a versão do cineasta é muito autoral, com tomadas extensas, e, então, decidiram aplicar-lhe a estética da tesourinha, isto é, retalhar o filme, desfigurando-lhe, para que ficasse mais palatável para o mercado exibidor. Umberto, que não costuma dormir de touca, entrou logo com uma ação na Justiça Federal para readquirir o direito de montar seu filme segundo o concebeu e o imaginou. E, agora, recebeu a decisão a seu favor. O juiz assim declarou: "CONCEDO a medida liminar postulada, determinando a suspensão imediata da liberação dos recursos remanescentes, destinados à produção do filme "Revoada", até o julgamento final da presente demanda". É bem de ver que o julgamento final ainda não foi proclamado, mas já é um grande passo no sentido de uma sentença que faça justiça ao realizador. Solicitei a Umberto a divulgação da decisão e ele, prontamente, me autorizou, segundo mensagem recebida que aqui coloco:


Salvador/BA, 09 de maio de 2008.

Ao

Prof. André Olivieri Setaro
Nesta

Prezado Senhor,

Como Requerente do Processo no.2007.33.00.015802-3 do Poder Judiciário Federal, Seção Judiciária da Bahia, autorizo e me responsabilizo pela divulgação jornalística em geral da Liminar decisória de 30 de abril de 2008 sobre o filme "Revoada", de minha Autoria, que foi tornada pública e veiculada no Diário Oficial da União ao dia 08 de abril de 2008.

Atenciosamente,

José Umberto Dias

Autor e Co-Produtor do longa metragem "Revoada"

RG - 00470411-88


Por sempre achar que foi uma apropriação indévita dos produtores, a decisão referida fez justiça a José Umberto. Este blog e seu autor ficaram satisfeitos com o resultado, ainda que um primeiro passo, mas uma conquista importante pelo direito da liberdade de expressão e criação. E que deve servir de exemplo para outros casos nos quais a ingerência da produção esteja a prejudicar o livre exercício do poder criador. A dicisão (assim está escrito) é uma peça de elogio à liberdade de expressão e demonstra que o juiz agiu com a ciência e a consciência.



PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL

AUTOS No. 2007.33.00.015802-3
AÇÃO POPULAR
REQUERENTE: JOSÉ UMBERTO DIAS
REQUERIDO: SECRETÁRIO DO AUDIOVISUAL DO MINISTÉRIO DA CULTURA
E OUTRO


DICISÃO


JOSÉ UMBERTO DIAS, devidamente qualificado, ajuizou ação popular contra o SECRETÁRIO DO AUDIOVISUAL DO MINISTÉRIO DA CULTURA, Sr. Orlando Sena, e a produtora REX SCHINDLER FILMES E SERVIÇOS LTDA, objetivando, liminarmente, a suspensão do pagamento dos valores ainda não pagos referente ao contrato administrativo celebrado para a execução da obra cinematográfica “Revoada”.


Nota de AS: O que implica que a produtora de Rex não vai receber os recursos ainda não pagos e, em consequência, fica impossibilitado de destruir ainda mais o filme com a montagem espúria à revelia de seu realizador e autor.

Afirma que é autor da obra cinematográfica “Revoada”, com a qual participou de concurso público promovido pelo Ministério da Cultura, em parceria com a produtora Rex Schindler Filmes e Serviços Ltda, visando a captação de recursos para a sua produção. Assevera que a referida obra sagrou-se vencedora no referido concurso, sendo celebrado contrato entre o autor, a produtora e a União, por intermédio da Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura, ficando orçado o filme em R$1.000.000,00 (um milhão de reais), a ser liberado em parcelas sucessivas de acordo com as etapas de produção.

Sustentou a existência de diversas irregularidades na utilização dos recursos públicos recebidos pela Produtora Rex Schindler Filmes e Serviços LTDA para a elaboração do filme “Revoada”, alegando ainda a existência de omissão do agente administrativo quanto à fiscalização do referente contrato. Afirmou que a irregularidade na aplicação das verbas fornecidas pelo Ministério da Cultura configura ato lesivo ao patrimônio público e cultural, justificando o ajuizamento da presente ação.


Nota de AS: Vejam que o requerente alega irregularidade na aplicação das verbas fornecidas pelo Minc, o que significa dizer malversão de dinheiro público.

Juntou procuração e documentos às fls. 23/78.

A decisão de fl. 80 determinou a apreciação do pedido de liminar após a oitiva da parte contrária.

Devidamente citada, a produtora Rex Schindler Filmes e Serviços LTDA apresentou contestação às fls. 93/98, afirmando que não tem nenhuma obrigação de exibir para o autor os documentos por ele requeridos. Sustentou, outrossim, ausência de prova que sirva de lastro para as alegações do acionante, bem como inexistência de infringência e/ou descumprimentos às normas que tutelam a proteção pretendida pelo acionante, juntando documentos às fls. 99/109.

Documentos apresentados pelo requerente às fls. 113 e 118/120.

Devidamente citado, o Secretário do Audiovisual do Ministério da Cultura apresentou contestação às fls. 123/126, alegando que o autor limitou-se a tecer observações indiciárias genéricas, sem, contudo, apresentar qualquer prova de ilegalidade administrativa ou lesiva ao patrimônio público ou cultural. Sustentou, igualmente, que agiu em estrito cumprimento das normas e condições do Edital do Concurso e da legislação pertinente. Pugnou, por fim, pela improcedência da ação e juntou procuração à fl. 127.

Às fls. 128/130, o Ministério Público Federal manifestou-se a favor da concessão da liminar pleiteada pelo autor, sustentando que os documentos apresentados pela parte ré às fls. 100/109 não serviram para comprovar de forma plena a regularidade na utilização os recursos federais recebidos pela Produtora Rex Schindler Filmes e Serviços LTDA para a produção do filme “Revoada”.

Às fls. 132 foi determinada a citação da União.

Às fls. 134/135 a acionante requereu a concessão da medida liminar.

Eis o relatório.

Examinados, decido.

A ação popular consiste em remédio jurídico idôneo à anulação de ato lesivo ao patrimônio público ou à entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural.

Por sua vez, a Lei de Ação Popular (Lei no.4.717/65) define patrimônio público como os bens e direitos turísticos (art. 1º.,S 1º.), protegendo-se, destarte, o patrimônio público em sentido mais amplo.

Assim, para o cabimento da ação popular, basta a ilegalidade do ato administrativo que se pretende invalidar, por contrariar normas específicas que regem a sua prática ou por se desviar dos princípios que devem sempre nortear a Administração Pública, sendo dispensável, pois, a demonstração do próprio prejuízo material aos cofres públicos, já que o inciso LXXIII do art. 5º.da Constituição Federal abarca não só o patrimônio material do Poder Público, como também o patrimônio moral, o cultural e o histórico.

O caso sub judice tem por objeto um contrato celebrado entre o autor da presente ação, a produtora Rex Schindler Filmes e Serviços Ltda e o Ministério da Cultura, visando o repasse de recursos públicos federais para a realização do filme “Revoada”. Afirma, o autor, que houve malversação das verbas federais, descumprimento de cláusulas do Edital, superfaturamento dos equipamentos usados, entre outras irregularidades, o que justificaria a concessão de liminar para suspender o repasse do restante dos valores destinados à produção da obra cinematográfica.

Da análise dos elementos probatórios até o momento produzidos, verifica-se que os fatos e fundamentos trazidos pelo autor possuem relevância, fazendo-se presentes os requisitos autorizados da medida liminar postulada, senão vejamos.

Há fortes indícios de que houve má utilização por parte da produtora acionada dos recursos públicos recebidos do Ministério da Cultura para a elaboração do filme “Revoada”, o qual ainda está em fase de produção, embora a empresa produtora já acuse o recebimento de R$946.783,70 (fls. 37/67), quase o total do valor contratado, contrariando o disposto no item “8” do instrumento convocatório.

Outrossim, segundo os documentos juntados aos autos, restou comprovada a violação ao item “8”, alínea “d”, do Edital no.02/2005 (fls. 029), pois foram liberados 40% do valor referente à última parcela, que é de R$100.000,00 (cem mil reais), antes mesmo da entrega das cópias gravadas, quando o instrumento convocatório estabeleceu que tal parcela só seria liberada após a entrega das referidas cópias.

Desse modo, o perigo da demora se faz presente, pois caso não concedida a presente medida, serão liberados os R$60.000,00 restantes do valor contratado, sem que haja a conclusão do filme e a apuração das irregularidades apontadas.

Assim, estando demonstrados o perigo da demora e a fumaça do direito, impõe-se o deferimento da liminar, medida que se presta, justamente, à garantia da efetividade da tutela jurisdicional.

Ante o exposto, CONCEDO a medida liminar postulada, determinando a suspensão imediata da liberação dos recursos remanescentes, destinados à produção do filme "Revoada", até o julgamento final da presente demanda.

Cite e intime-se União, inclusive, para exercer, querendo, a faculdade prevista no $3o do art. 6o., da Lei no. 4.717/65 .

Retifique-se o termo de autuação, incluindo-se a União Federal.

Intimem-se.

Salvador, 30 de abril de 2008.

Paulo Roberto Lyrio Pimenta

Juiz Federal da 16a Vara"

Nenhum comentário: