Figura lendária da crítica de cinema na Bahia, Hamilton Correia teve, por muitos anos, uma coluna diária no jornal soteropolitano Diário de Notícias, além de programas em rádio e televisão. Quando editou o seu famoso suplemento literário, publicou um artigo de um jovem meio abusado que se chamava Glauber Rocha. Hamilton Correia, embora muita gente disso não saiba, é o introdutor do autor de Deus e o diabo na terra do sol na imprensa. Amigo de Walter da Silveira, um dos maiores ensaístas de cinema no Brasil, ajudou a programar o Clube de Cinema da Bahia e, um belo dia, indo a Recife, descobriu ninguém menos do que Ingmar Bergman, que passou a ser programado no clube soteropolitano. Aposentado, continua a ver filmes e filmes. É um grande amante do cinema como expressão da arte. Mas a novidade é que, aderindo ao espaço virtual, resolveu fundar um blog. Antes, porém, gostaria de ressaltar que Hamilton, hoje, é um colecionador de cartazes preciosos de filmes importantes da história do cinema.
Certos cartazes de cinema adquirem o status de objetos de arte. Hamilton Correia é, talvez, o maior colecionador de cartazes do Brasil. Possui cartazes de várias cinematografias, a exemplo de reproduções dos originais de O encouraçado Potemkin, de Sergei Eisenstein, A última gargalhada, de Murnau, Oito e meio, de Federico Fellini, entre muitos e muitos outros. Ter a oportunidade de visitar o seu acervo, como já o tive, é uma espécie assim de viagem pela história do cinema. A dedicação do veterano crítico baiano aos cartazes vem já de algumas décadas, quando foi aos Estados Unidos visitar um filho cardiologista que estava fazendo residência médica, e, na estadia estadunidense, veio a conhecer os cartazes. Segundo ele, na terra do Tio Sam, os cartazes de filmes são muito valorizados, havendo, inclusive, cartórios especializados para o reconhecimento da originalidade deles. Conta que um exibidor de cidade do interior tinha em seu poder, fechadas as portas de seu cinema, o cartaz original de No tempo das diligências (Stagecoach, 1939), do grande John Ford, arquétipo do western moderno que deu as coordenados do gênero com a introdução da psicologia na estruturação de seus personagens. O exibidor não sabia que o cartaz tinha valor, tendo-o guardado apenas por uma relação afetiva com a obra-prima fordiana. Um colecionador, de passagem pela cidadezinha desse exibidor, vendo o cartaz, poderia tê-lo comprado, mas, honesto, deu-lhe a dica que ele valia uma fortuna. O exibidor procurou saber e conseguiu vendê-lo pela fantástica quantia de 250.000 dólares.
A arte dos cartazes de cinema é fascinante. Por vezes é difícil imaginarmos que em tempo idos a divulgação de um filme dependia de um simples papelão pintado afixado no cinema uns dias antes da estreia. Por isso os artistas gráficos davam o seu melhor e alguns dos grandes aí mostraram o seu talento como Saul Bass, responsável por muitos excelentes genéricos da história do cinema, autor de alguns cartazes que se destacaram dos restantes pelo seu design inovador. Design inovador que foi além dos cartazes para surpreender na abertura dos créditos, a exemplo dos filmes Um corpo que cai (Vertigo), Psicose, Intriga internacional, Os pássaros, todos do mestre Alfred Hitchcock, O homem do braço de ouro, e Anatomia de um crime, ambos de Otto Preminger, e, ainda deste, Bom dia, tristeza, entre outros notáveis.
Hamilton Correia exerceu por várias décadas a crítica de cinema e, com a morte de seu amigo Walter da Silveira, é, hoje, o decano da crítica na Bahia. Participou da imprensa soteropolitana quando existia, aqui, um verdadeiro jornalismo cultural. Uma página inteira do Suplemento Cultural do Diário de Notícias era reservada para a publicação de textos críticos sobre cinema. E Hamilton era quem os editava. Nos outros dias da semana, possuía uma coluna diária para comentar os lançamentos e os filmes do Clube de Cinema da Bahia. Com o passar do tempo, o baiano, que não tem memória, costuma esquecer os seus valores pretéritos. É chega a hora de se instituir um prêmio nos eventos cinematográficos da cidade (ou Cine Futuro, ou Jornada, ou Panorama...) com o nome de Hamilton Correia.
Na página reservada às dedicatórias no livro Fronteiras do cinema, de Walter da Silveira, o ensaísta escreveu: “A Hamilton Correia, com muita amizade.” Agora, já aposentado, mas nunca desatento ao que se passa no mundo do cinema, dedica-se a colecionar cartazes raros e belíssimos. Não apenas colecionar, mas também vendê-los a quem estiver interessado. Integrante da geração de críticos que apareceram na imprensa nos anos 50, Hamilton Correia é do tempo em que Glauber Rocha escrevia no ‘Jornal da Bahia – depois substituído, neste, por José Gorender, que assinava Jerônimo de Almeida, Orlando Senna, Walter Webb, José Augusto Berbert de Castro (em A Tarde), José Olympio da Rocha, e, claro, Walter da Silveira, o maior ensaísta que a Bahia já teve.
Publicado originariamente no jornal soteropolitano Tribuna da Bahia em 10 de novembro de 2011
Hamilton tem mais de 7.000 cartazes procedentes de todas as partes do mundo e está vendendo cada peça ao módico preço de 10,00 – uma ninharia em se tratando de cartazes de filmes famosos elaborados com arte e inventividade. Ele me deu o seu endereço para publicação: Avenida Princesa Leopoldina, 17, Condomínio Villa Velha – Villa Palma – que fica próximo ao Largo da Graça, descendo a ladeira que vai para a Perini e o Hospital Português. Para telefonar, basta ligar: 32472501. Visitem seu blog na internet: http://www.hamiltoncorreia.blogspot.com