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19 junho 2007

Filme baiano na Itália



Samba Riachão, de Jorge Alfredo, filme baianíssimo, faz parte do I Festival do Cinema Brasileiro na Itália, como se pode ver no cartaz deste post (caso esteja pequeno dê um clique nele que se amplia em outra janela). Entre outros, além do já citado, O prisioneiro da grade de ferro, excelente documentário de Jorge Sacramento, e Árido Movie, de Lírio Ferreira, um dos mais destacados representantes do vigoroso cinema pernambucano ao lado de Cláudio Assis (O baixio das bestas, que está programado para passar no III Seminário Internacional de Cinema e Audiovisual, que vai ser realizado, aqui mesmo, neste terra, no Teatro Castro Alves, entre os dias 9 e 14 de julho - depois darei maiores informações, mas, desde já, quem as quiser logo, vá direto ao site do seminário: http://www.seminariodecinema.ufba.br/

O documentário de Jorge Alfredo é sobre a figura imensa do compositor Riachão ("Cada macaco em seu galho", entre tantas!) e, se não há engano na memória, recebeu, ex-aequeo com Lavoura arcaica, o prêmio de melhor filme do Festival de Brasília. Não sei se tem em DVD. Tem Jorge Alfredo?

18 junho 2007

Dr. Sobral Pinto – um documentário-depoimento



Tuna Espinheira, cineasta baiano, que realizou recentemente Cascalho, longa baseado no livro homônimo de Herberto Salles, enviou-me um texto sobre o seu premiado documentário sobre Dr. Sobral Pinto, avisando-me que o filme passa dia 4 de julho, na Sala Walter da Silveira, às 20 horas, dentro do projeto vitorioso das Quartas Baianas. O documentário de Tuna é uma raridade e um depoimento precioso acerca do inesquecível advogado. Abaixo o seu texto:
"Lembro-me ainda na verde infância, de ouvir citado o nome de Sobral Pinto, vezes sem conta, quando meu pai relatava suas façanhas desassombradas, principalmente nas defesas antológicas e exemplares de Luis Carlos Prestes e Harry Berger.
Na metade dos anos setenta, morando no Rio, surgiu-me, com a maior naturalidade, a idéia de documentar, em imagem em movimento, o mito pretérito. Com a parceria e cumplicidade de Nelson Pereira dos Santos, foi armada uma produção. Ato contínuo, convocamos o ensaísta-crítico, Alceu Amoroso Lima, os advogados, Heleno Fragoso, Raimundo Faoro e o historiador Hélio Silva, para, através dos seus depoimentos, adquirir a ajuda necessária para traçar o perfil do nosso personagem.
O filme ia de vento em popa, a meio caminho, de repente,empacou. Faltava o motivo motor. O personagem central, o verdadeiro leit-motiv, astuciava pretextos para fugir à câmera. Momentos de suspense e desespero. Mais tarde ficaríamos sabendo que falou mais alto a sedimentada formação de homem sóbrio, simples, do Dr. Sobral. Para ele, parecia uma espécie de exagero, um exercício das vaidades, ser retratado no cinema. Passado o susto, de volta à terra firme, até o final dos trabalhos, a convivência foi rica, prazerosa, enriquecedora. Revelara-se um colaborador surpreendente, afável, solicito.
Dr. Sobral era um conservador ferrenho, vestia-se de preto, calça, paletó, chapéu idem, com sol ou chuva, sempre um guarda –chuva à mão. Católico praticante, torcia o nariz para Teologia da Libertação. O movimento feminista era um modismo que desvirtuava a função natural das mulheres. Por aí afora...
As pinceladas acima qualificariam o nosso personagem como um chato de galocha, apenasmente antiquado. Mas, naquele mesmo corpo raquítico, sempre habitou um outro Sobral, o advogado de atitudes legendárias durante os famigerados anos da ditadura do Estado Novo, quando defendeu Luis Carlos Prestes e Harry Berger, para este último num momento em que as leis estavam cerceadas ao seu alcance, não hesitou em reclamar, para o seu cliente, massacrado pelas mais hediondas torturas, os benefícios do artigo 14 da Lei de Proteção dos Animais. Décadas mais tarde, durante a igualmente famigerada e infame ditadura iniciada em primeiro de abril de 64, Dr. Sobral seria novamente o destemido defensor dos presos políticos, sem jamais cobrar nem aceitar qualquer pagamento por suas defesas.

A figura do Dr. Sobral haveria de incomodar também em sua versão para o cinema. Eis que, a TV Educativa do Rio de Janeiro, seguindo a intolerância vigente, naqueles anos de chumbo, por decisão do seu Diretor, Gilson Amado, achou por bem proibir a veiculação do filme no programa “Coisas Nossas”, de responsabilidade da Embrafilme, com a infeliz alegação de que o documentário trazia mensagens comunistas, isto porque discorria sobre o caso Prestes. Os jornais da época polemizaram a questão. O Cineasta e critico David Neves publicou, na ocasião, um contundente artigo contra o obscurantismo de Gilson Amado. Naqueles tempos, o dito ficava pelo dito. O filme permaneceu censurado. Noticia alvissareira, só mais tarde, em 1979, quando o nosso trabalho ganhou o Grande Prêmio no VI Festival Brasileiro de Custa-metragem – Jornal do Brasil/Shell."

17 junho 2007

Justiça se faça a Anselmo Duarte



Anselmo Duarte, realizador de O pagador de promessas, único filme brasileiro a ganhar a Palma de Ouro no Festival de Cannes, em 1962, por não pertencer ao grupo do Cinema Novo, e, também, pela sua ficha profissional na Vera Cruz, foi um grande injustiçado e vítima de ataques que somente poderiam ser justificados pela inveja. Esta é terrível e destruidora nos meios artísticos – e também em outros setores por fazer parte da condição humana – e, tal qual um instrumento perfurador, atinge sobremaneira o invejado. No cinema, em particular, existem os grupos, que, aparentemente diplomáticos, são fechados e rancorosos. Quem não faz parte de um deles, e não reza pela mesma cartilha, vive o descaso, a marginalidade, caso não tenha forças para se amparar numa guarda que o proteja. A injustiça que alcançou Anselmo Duarte chegou a ser perversa, pois o desanimou a continuar uma carreira que tinha tudo para se tornar um sucesso – mas, malgré tout, continuou a fazer filmes. Muitos dos cineastas, no entanto, que hoje pontificam nas sinecuras governamentais, cujos nomes não vale a pena da citação, nunca lhe perdoaram por ter feito O pagador de promessas.

Os cineastas se digladiam por questões diversas, filiando-se, uns, a correntes ideológicas, outros a posturas estéticas, entre outras razões. Anselmo Duarte, por sempre ter uma postura individual, avesso a grupinhos, sofreu na pele a sua independência. Ator de sucesso nos anos 50, quando galã, das chanchadas da Atlântida, fechava o trânsito, com sua passagem, em Copacabana, tendo, inclusive, sua camisa toda rasgada por fãs eletrizados. Desde que se iniciou no cinema, seu projeto era o da realização. Ficou intérprete por causa de seu porte e da sobrevivência no meio cinematográfico, mas logo que arranjou uma oportunidade realizou um dos mais bem sucedidos filmes brasileiros de todos os tempos em pleno apogeu da chanchada: Absolutamente certo, comédia de costumes narrada com engenho e arte, com o próprio Anselmo no papel principal, acompanhado de Dercy Gonçalves, Odete Lara, entre outros. O dínamo narrativo de Absolutamente certo
é surpreendente, Duarte soube sentir os dramas da classe média paulistana e seu filme, sobre ser uma comédia bastante agradável de ver, é, também, um retrato dessa classe numa São Paulo cuja vivência em certos bairros ainda era muito provinciana (e o registro traz saudade daquela paz, daquela tranquilidade).

Os rabugentos de plantão criticaram
Absolutamente Certo, que foi um êxito fabuloso de público, chegando a ser lançado em nada menos de 20 salas em SP. Disseram que o filme era uma chanchada disfarçada. Mas o tempo, implacável, juiz supremo, é, realmente, o melhor crítico, pois Absolutamente certo, visto nos dias de hoje, se revela um filme dinâmico e nada envelhecido, além da saborosa visão de uma época, de uma São Paulo romântica e tranqüila. Aliás, já em 1963, Glauber Rocha, no seu polêmico Revisão crítica do cinema brasileiro
, elogia o filme de Anselmo Duarte, considerando-o uma obra à parte na avalanche chanchadística do período.

Veredas da salvação, obra pretensiosa, que realizou após o sucesso mundial de O pagador de promessas
, este comentarista viu há décadas e tem dele, apenas, imagens fugidias. Mas foi atacadíssimo pela crítica invejosa e rancorosa e, ao que parece, ainda que certa pretensão, é uma película com um rigor artesanal acima da média e, isso deve ser dito, muita elogiada no exterior.

Não se quer fazer aqui a trajetória de Anselmo como diretor, mas destacar a sua lamentável marginalização. Duarte, sem medo de errar, está incluso entre os dez maiores diretores do cinema brasileiro de todos os tempos. Recebeu em 2002 um prêmio especial numa festa do cinema brasileiro, entregue, por ironia do destino, por um cinemanovista que o criticava: Walter Lima Junior. Hoje, envelhecido, mas forte, recolheu-se à sua cidade natal, Salto, no interior paulista.