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15 julho 2008

Entre outras, Cimino e Truffaut


O franco atirador (Ther deer hunter, 1979), de Michael Cimino, com Robert DeNiro, John Savage, Chrispopher Walker, Meryl Streep, realizado quase ao mesmo tempo que Apocalypse now, de Francis Ford Coppola, considero-o um dos mais impactantes filmes sobre a guerra. Três amigos de uma comunidade ucraniana-americana são enviados para o Vietnã e se envolvem, lá, no fatídico jogo da roleta russa em contato com os inimigos. Um deles volta íntegro (DeNiro), ainda que abalado com o que viu, mas o outro (Savage), traumatizado e em cadeiras de rodas, enquanto o terceiro (Walker), brutalizado, perde a noção das coisas e fica em Saigon, envolvido, e no fundo do poço, na roleta russa. Poucas os cineastas que conseguiram, na exposição das chagas da Guerra do Vietnã, mostrar com tanta ênfase o terror do conflito. Cimino, neste particular, supera Stanley Kubrick (Nascido para matar), Oliver Stone (Platoon), ficando apenas atrás de Francis Ford Coppola em Apocalypse now. The deer hunter, que foi visto em seu lançamento, revisto agora em disquinho vendido em saldão das Lojas Americanas, permanece em sua poesia, em sua crueldade, em seu impacto. De longa duração, 3 horas, a primeira é toda reservada para mostrar a vida dos rapazes na comunidade e a festa de casamento típica é um ponto alto.Michael Cimino, no entanto, é um realizador sem sorte e a vida, como se diz, foi-lhe madrasta.
Quem lhe deu a primeira oportunidade para dirigir um filme foi Clint Eastwood em O último golpe (Thunderbolt and lightfoot, 1984), quando Cimino já contava 40 anos, pois nasceu em 1944. Eastwood faz, nesta sua fita de estréia, parceria com Jeff Bridges. Há, inegável, certa agilidade narrativa em O último golpe, mas, depois deste, Cimino precisou esperar 4 anos para fazer o seu segundo longa, que é O franco atirador. A seguir o desastre e, talvez, o motivo de sua marginalização e declínio: O portal do paraíso (Heaven's gate, 1980), filme monumental sobre a conquista da América por imigrantes, belo e poético, mas não compreendido pelos produtores, que o cortaram e teve seu lançamento em cópia espúria. Também eles ficaram zangados com Cimino porque o filme custou 50 milhões de dólares e rendeu pouco mais de 1 milhão, ocasionando a falência completa da companhia produtora, a tradicional United Artists, que foi comprada pela Metro. Cimino entrou em aguda depressão. Ninguém em Hollywood queria mais falar com ele, apesar dos aplausos conquistados por Heaven's gate, principalmente entre a crítica européia.
Dino de Laurentiis, vendo os filmes de Michael Cimino, achou que poderia ainda aproveitá-lo como realizador e o contratou, sob rígido orçamento e controle absoluto do cronograma, para O ano do dragão (Year of the dragon, 1983), com Mickey Rourke e John Lone. Cimino conseguiu realizar um belo filme, mas seus dias estavam contatos. Os filmes que fez a seguir não mais puderam mostrar as faíscas de um grande cineasta, a exemplo de O siciliano, com Chrispopher Lambert, Horas de desespero (refilmagem do clássico de William Wyler), e mais um incógnito. Desprestigiado e, também, com problemas pessoais, esteve, em 1992, no Rio de Janeiro para visitar locações de um projeto sobre os 500 anos do descobrimento do Brasil, que não foi adiante. Seu rosto estava desfigurado por um sem número de cirurgias plásticas. A visão de Michael Cimino, na época, foi a visão da decadência. Mas O franco atirador e Portal do paraíso vão ficar, forever, na mente dos amantes do bom cinema.
Na enquete, encerrada há dias, sobre os melhores filmes de François Truffaut, entre 24 votantes, 11 (45%) votaram em Jules et Jim, que tomou o título no Brasil de Uma mulher para dois. É, realmente, o filme mais prestigiado do rebelde crítico do Cahiers du Cinema que, uma vez realizador, se tornou doce e romântico. O segundo melhor, Os incompreendidos (Les quatre-cents coups, 1959) é a sua estréia na direção, primeiro filme, com o personagem quase autobiográfico Antoine Doinel, sempre interpretado por Jean-Pierre Léaud. Os incompreendidos detonou - ao lado de Acossado, de Godard - a Nouvelle Vague francesa. O grande mestre de Truffaut, o ensaísta André Bazin, morrera um ano antes aos 40 anos de idade, e não vira, portanto, a glória de seu pupilo.O terceiro lugar ficou para Um só pecado (Le peau douce, 1964), com Jean Dessaily (que morreu recentemente) e Françoise Dorleac. Talvez o mais equilibrado filme de Truffaut no que concerne ao rigor da mise-en-scène. Hitchcock aparece em espírito, principalmente na cena em que Dessaily vai procurar, pelo corredor do hotel, o quarto de Dorleac, em hotel lisboeta, com aqueles pares de sapatos expostos às entradas das portas dos apartamentos. Um só pecado teve 3 votos (12%). Neste filme, quando Dessaily, um intelectual, sai de Paris para Lisboa, viaja na saudosa Panair do Brasil.
Assinante da Net, vejo sempre o Canal Brasil, que completa, neste 2008, dez anos, mas que considero em franca e total decadência, principalmente pela introdução na maior parte de seu tempo de clipes musicais (a maioria é bem ruim). A excessiva inclusão dos clipes na sua grade programativa, para atender a um público menos exigente e mais embalado pelas porcarias de ocasião, determinou a impossibilidade do canal apresentar velhos filmes brasileiros. Antes, a possibilidade de revisitar certas obras raras era muito mais fácil. Mas, por outro lado, ainda restam bons programas, a exemplo de Mudando de conversa, dirigido por Daniel Filho, Espelho, de Lázaro Ramos, entre outros. O Tarja Preta, de Selton Mello, que era engraçado, parece que terminou. Em relação ao Sem Frescura, com Paulo César Pereio, devo dizer que este ator, como entrevistador, é péssimo, pois fala demais, fala mais do que quem é convidado a falar no programa, atropelando, muitas vezes, o entrevistado. E Pereio fala de um modo meio incompreensível, com a voz embolada como se estivesse bêbado. Acho que num programa de entrevistas não se deve fazer pirotecnia, como colocar a imagem em preto e branca ou, então, em ângulos bizarros para querer parecer moderninho e, com isso, dar um atestado flagrante de babaquice. O último Sem frescura foi com Luís Carlos Barreto, que tocou em pontos interessantes sobre o momento atual do cinema brasileiro.