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28 outubro 2009

O brilhantismo da simplicidade

Marcelo Miranda, um dos melhores críticos de cinema de sua geração, publicou um artigo bem interessante sobre a recusa em se conferir valor a filmes simples e destituídos de firulas de linguagem. Vou transcrevê-lo uma parte e a outra deve ser lida no próprio blog do Polvo.
"Numa aula recente sobre crítica de cinema, fui interpelado por um aluno após a exibição de O Inventor da Mocidade (1952), de Howard Hawks. Ele queria que eu explicasse o porquê daquele cineasta ser tão reverenciado e considerado genial e brilhante (a base da aula era também o ensaio de Jacques Rivette sobre Hawks). Na visão do aluno, o filme ao qual ele assistira era “muito simples: atores num cenário conversando e câmera filmando”. Ele não achara o filme ruim. Apenas não conseguia entender (ou mesmo aceitar) que um negócio tão “comum” e “fácil” pudesse ser chamado de genial e brilhante.

A discussão me fez pensar. É fato que exista uma geração de cinéfilos e espectadores eventuais viciados num certo tipo de cinema maneirista e cheio de firulas visuais e narrativas (cito de imediato Darren Aronofsky pré-
O Lutador, David Fincher pré-Zodíaco, as espertezas de Charlie Kaufman e as estripulias de Danny Boyle) ou de efeitos visuais dos mais sofisticados e delirantes (Transformers 2 é a bola da vez) – basta ver quais filmes enchem mais as salas de exibição. Ser simples e direto parece algo fora de moda sob esse viés. Mas quando a percepção de que tal vício também pode estar contaminando o universo de quem estuda cinema (além: de quem estuda para ser cineasta), algo tão ou mais preocupante começa a brotar.

Porque é de salas de aulas que tem saído boa parte dos realizadores brasileiros nos últimos anos – ao menos desde que as escolas de cinema se tornaram, de fato, um nicho à formação de profissionais capacitados. O aluno aqui citado, inclusive, tem pretensões de ser diretor, algo muito legítimo e salutar. Porém, é visível que essa mesma geração talvez esteja deixando de lado um certo senso crítico e buscado se inspirar em elementos facilitadores do que seja fazer um filme. O fetiche pelo plano-sequência, a vontade de uma câmera presente a todo custo (closes, panorâmicas, tremeliques, ou seu inverso: o equipamento no tripé a filmar qualquer objeto, parado ou em movimento) e a obsessão em parecer um diretor de cinema são indícios facilmente perceptíveis em determinados trabalhos recentes de curta-metragem (e mesmo de alguns longas) e que mostram o quanto a simplicidade, por vezes, tornou-se um pecado.

Um filme jamais vai ser bom por ser apenas simples, e nem um filme simples é, por consequência, bom. Um elemento não legitima o outro. Mas, se a simplicidade não garante um filme brilhante, é absolutamente possível – e, em certas ocasiões e níveis, louvável – que um filme simples consiga ser brilhante. Que o digam Hawks, Otto Preminger, Nicholas Ray, Don Siegel, John Ford. São todos cineastas que, em determinadas fases de suas carreiras, realizaram obras de feitura quase artesanal, de narrativa marcada pela limpidez e coesão e de profunda crença na soma entre a encenação (mise en scène) e a história que move essa encenação."
Na imagem (que deve ser clicada para se vê-la aumentada), o grande diretor Howard Hawks dirige Angie Dickinson em um momento de Onde começa o inferno (Rio Bravo, 1959), um western magnífico.

27 outubro 2009

Oficina adia seu início para 4 de novembro

A nova Oficina Elementos de Apreciação Cinematográfica, por circunstâncias alheias à vontade de seu organizador (o autor deste blog), tem seu início adiado para 4 de novembro. Com isso, o seu término fica marcado para 16 de dezembro, mas, para não entrar nas festas de fim de ano, a última aula, a oitava, fica para o dia seguinte, 17. Excetuando-se esta, todas as aulas devem ser realizadas às quartas, das 20 às 22 horas, na EngenhArt, molduraria que fica localizada na rua da Paciência, perto do Largo de Santana, bairro do Rio Vermelho. Para a efetivação das inscrições, os interessados devem fazer um depósito de 250,00 (duzentos e cinquenta reais) na conta 648.427-1, agência 3457-6, Banco do Brasil, em nome de ANDRÉ OLIVIERI SETARO.

25 outubro 2009

"Imitação da vida", de Douglas Sirk, já está em DVD


Douglas Sirk (1900/1987) foi um diretor alemão que trabalhou como realizador cinematográfico em diversos países (França, Holanda) mas que veio a se revelar em Hollywood nos anos 50 com uma série de extraordinários melodramas, que retratam, com primorosa mise-en-scène, a sociedade americana. Rainer Werner Fassbinder, o rebelde diretor de Querelle, um dia declarou: "Os filmes de Douglas Sirk me causam estesia".

Reabilitou o melodrama com uma classe extraordinária. Há, inclusive, entre os bem pensantes, um certo preconceito em relação ao melodrama, como se fosse um gênero menor. Ledo e ivo engano. O melodrama, quando bem executado, estilizado, pode se revelar um objeto de arte, de fascinação, de estesia mesmo. Muita gente confunde melodrama com dramalhão (este, sim, um sub-melodrama, sempre apelativo e sensacionalista. E o que é Luzes da ribalta (Limelight, 1953), de Charles Chaplin, do que um belíssimo melodrama? O que é Marnie, confissões de uma ladra (1964), de Alfred Hitchcock, do que um senhor melodrama? E Assim estava escrito (The bad and the beautiful, 1953), de Vincente Minnelli, entre tantos outros? Particularmente, adoro melodramas quando realizados com classe centrado na tônica do estudo exaustivo das relações passionais.

Mas o que queria dizer nesta mensagem é que Imitação da vida (Imitation of life, 1959), último filme de Douglas Sirk, que largou o cinema quase 30 anos antes de sua morte e se retirou do cenário artístico, indo morar na sua Europa de origem, saiu recentemente em DVD. Filme difícil de ver (passou no Telecine Cult), aclamadíssimo pela crítica, é uma obra indispensável.

Entre os grandes filmes de Sirk, destaco, além de Imitation of life, que é o meu preferido, e sem ordem de importância: Desejo atroz (All I desire, 1953), com Barbara Stanwick, Tudo que o céu permite (All that heaven allows, 1956), com Rock Hudson como o jardineiro pelo qual Jane Wyman, mulher de classe alta, apaixona-se, Chamas que não se apagam (There's always tomorrow, 1956), também com Barbara Stanwick, Palavras ao vento (Written on the wind, 1956), com Rock Hudson, Dorothy Malone, Robert Stack, Lauren Bacall, Almas maculadas (The tornished angels, 1958), também com Rock Hudson e Dorothy Malone, Amar e morrer (A time for love and a time for dead, 1958), com John Gavin.

Em Imitation of life, duas mães, uma atriz famosa ( (Lana Turner) e sua empregada doméstica negra (Juliana Moore), com o crescimento de suas filhas (uma delas branca, apesar da mãe negra), começam a ter problemas com elas. Em questão, o racismo na sociedade americana da época. A sequência final é digna de um mestre de cinema. E a interpretação de Juliana Moore é magistral.