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19 fevereiro 2010

Klaus Kinski: gênio ou louco?

Nikolaus Günther Nakszynski, alemão nascido em Gdanski (Polônia), é o nome completo do ator Klaus Kinski (1926/1991), que morreu aos 65 anos de um ataque cardíaco. Temperamental, de natureza maníaca e depressiva, infernizou, em vários filmes (Aguirre, Fitzcaraldo...), o diretor Werner Herzog, que tinha, com ele, uma relação de amor/ódio. A trajetória de vida de Kinski, porém, é tumultuada, tendo sofrido o diabo para a conquista de um lugar ao sol. Abandonado pelo pai, um cantor de ópera fracassado, passou a infância na mais profunda miséria. Klaus se alistou no exército nazista ("o único ambiente em que me senti bem", disse numa rara entrevista), mas, em 1944, no ocaso da Segunda Guerra Mundial, ele foi aprisionado pelos britânicos. Trancafiado, para driblar o tempo, divertia os companheiros de cela com shows de mímica e pantomima.
Terminada a guerra, dá início à sua carreira artística com excursões solitárias por várias cidades da Alemanha Ocidental a recitar, solo, poesias. Vagando por vários lugares, mesmo depois dos espetáculos recitativos, continuava a declamar pela noite e acaba por ser internado num hospital psiquiátrico para tratamento. Na minha opinião de leigo no assunto, creio que Nikolaus Nakszynski padecia de bipolaridade, da PMD (Psicose Maníaca Depressiva). Recuperado, Kinski resolve entrar para o cinema e, em 1948, participa de seu primeiro filme como ator: Morituri, de Eugen York - há um filme da década de 60 com este mesmo nome com Marlon Brando e Yul Brynner.
Espera três anos, desempregado, até que consegue outra chanche em Decisão antes do amanhecer (Decision Before Dawn, 1951), de Anatole Litvak e, mesmo assim, sem ter o seu nome nos créditos. Kinski trabalha, até perto de sua morte, ocorrida na California, em mais de 135 filmes. Aceita qualquer trabalho e é figura conhecida como coadjuvante de muitos filmes alemães até que surge a sua grande oportunidade: Dr. Jivago (Dr. Zhivago, 1965), de David Lean, no papel de Kostoyed. É descoberto pelos diretores dos westerns-spaghettis e trabalha em dezenas de títulos desse filão. A revelação, no entanto, vem em 1972, quando Werner Herzog o convida para Aguirre, a cólera de Deus (Aguirre, der Zorn Gottes). Durante as filmagens deste filme, Klaus tenta matar Herzog, mas, fascinado pela figura e pela personalidade do ator, convida-o para mais filmes de sua autoria: Woyzeck (1978), Nosferatu (1979), e Fitzcaraldo (1992), este último rodado na Amazônia com a participação de atores brasileiros como José Lewgoy e Grande Otelo. E ainda com Herzog, em 1988, Cobra verde e, em 1999, Herzog realiza um documentário sobre sua relação com Klaus Kinski: Mein liebster Feind - Klaus Kinski.
Kinski abandonou a mulher, deixando-a com as duas filhas, Pola e Nastassia (a deslubrante atriz Nastassia Kinski), com quem, fala-se, praticou incesto, bebedor excessivo e com péssimo gênio, atrasava-se durantes as filmagens e brigava com todo mundo. Em Cobra verde, deu um soco em Herzog e se envolveu com várias figurantes africanas.

Outra beleza: Jane Fonda


Jane Fonda, se a memória não me engana, conhecia-a nas telas em Cat Ballou, paródia do western dirigida, em meados da década de 60, por Elliot Silverstein. O nome em português se me escapou (Dívida de sangue?). Depois veio Jaula amorosa (Les félins), que tem Alain Delon no elenco. Produção francesa, dirigida pelo veterno diretor de Brinquedo proibido (Jeux interdits), Les félins proporcionou à filha do grande Henry Fonda a oportunidade de uma temporada europeia, e sua presença em Paris não escapou aos olhos felinos de Roger Vadim, que acabou por se casar com ela e a fazer dela Barbarella. Vi, já em reprise, A vida íntima de quatro mulheres (The Chapman's report), de George Cukor, princípio de carreira de Jane, contracendo com Shelley Winters. Vieram A noite dos desesperados (They shoot horses, don't they?), o melhor filme de Sidney Pollack, Klute, de Alan J. Pakula, entre muitos outros. Há também os filmes que fez com Vadim (Histórias extraordinárias, outros). Não quero aqui fazer a filmografia de Jane Fonda, mas, apenas, registrar a sua beleza.

17 fevereiro 2010

Beleza e explicação da beleza

Para ver esta bela com mais amplitude e nitidez é de bom alvitre um click na própria imagem. Marilyn Monroe, mito sexual do século XX, abalou o imaginário dos homens e mulheres. Um de seus melhores filmes, na minha opinião, é Adorável pecadora (Let's make love, 1960), do mestre George Cukor, uma deliciosa comédia na qual contracena com Yves Montand, um charmant. Monroe, ainda que casada com o dramaturgo Arthur Miller não resistiu aos encantos do chanssonier francês e foi a seus braços e abraços. Montand, por seu lado, casado há muito tempo com Simone Signoret, traiu-a. E quem, de sã consciência, não trairia sua esposa (por mais bem casado) se tivesse a sorte de ter Monroe a seus pés? Parece que Signoret o perdoou e compreendeu a situação. Este, o post de hoje. Mais para ver do que para ler.

16 fevereiro 2010

Da ação e da reflexão


Carlos Heitor Cony, em artigo publicado há dois anos na Folha de S.Paulo, escreveu sobre a literatura de ação e a literatura de reflexão, e citou Glauber Rocha, que disse certa ocasião que a obra de José de Alencar é um rio caudaloso enquanto a de Machado de Assis uma torneira que pinga. Queria o realizador de Deus e o diabo na terra do sol dizer que nos livros de Alencar a ação prepondera em detrimento da reflexão enquanto nos de Machado é esta que determina a sua fruição. O mesmo poderia ser aplicado ao cinema.

O que se convencionou chamar erroneamente de cinema de arte não passa, na verdade, de uma falácia. O cinema de arte não existe e, inclusive, a expressão foi dada pelos exibidores (que são comerciantes) para designar, na década de 50, os filmes de tomadas demoradas, sem ação, quando da explosão no mercado das obras de Ingmar Bergman, Michelangelo Antonioni, Robert Bresson, Roberto Rossellini, entre tantos outros. Os exibidores é que denominaram estes de filmes de arte porque filmes que não tinham ainda muito público e o mercado era restrito. Queriam eles dizer, na verdade, se tivessem mais noção da arte do filme, que os filmes de arte se caracterizavam pela reflexão em detrimento da ação.

O fato é que não existe, a rigor, cinema de arte. O filme pode ser excelente seja ele de ação ou de reflexão. Sobre produzir um monte de lixo, a indústria cultural de Hollywood também realiza grandes filmes, como, por exemplo, e filmes do ano em curso, Sangue negro, de Paul Thomas Anderson, Onde os fracos não têm vez, dos Irmãos Coen. E os primorosos filmes de Clint Eastwood, Martin Scorsese, Sidney Lumet, entre outros tantos, não são oriundos da indústria? Se vingar a expressão cinema de arte como a significação do verdadeiro e bom cinema, filmes que são obras-primas como Rastros de ódio (The seachers), de John Ford, por serem de ação, estariam fora dela. O que seria um absurdo e uma patologia mental.

O que determina o valor de uma obra cinematográfica é a maneira pela qual o realizador articula os elementos da sua linguagem. Não importa se a articula em função da ação ou da reflexão. O que importa, na verdade, é o talento, o engenho e a arte. Também na literatura o que determina o valor literário de um livro é a maneira pela qual o escritor articula a sintaxe da língua. A ação pela ação (e também a reflexão pela reflexão), se não estiver apoiada numa escrita bem articulada, nada vale.

A confusão, porém, ainda é muito grande. A maioria dos pseudo-cinéfilos que toma conta das salas alternativas da cidade somente considera filmes válidos aqueles voltados para a reflexão. Mas se a reflexão não tiver aporte numa expressão estilística elevada não tem valor e, muitas vezes, é veículo para a aporrinhação do espectador. Neste caso, muito mais vale um filme de ação bem articulado do que um de reflexão de pouca polivalência no estilo.

Um belo dia, deparei-me com um impertinente pseudo-cinéfilo, desses que gostam mais de ficar na sala de espera para ser visto do que no interior da sala exibidora, e ele ficou admirado quando manifestei minha admiração pelos filmes de Clint Eastwood. "Mas não é aquele cowboy italiano que depois virou o perseguidor implacável?"

Existem, por outro lado, cineastas que a priori pensam fazer cinema de arte e, na verdade, seus filmes são estímulos fortíssimos à sonolência. O verdadeiro cineasta faz seu filme de acordo com a sua necessidade de expressão. Se vai conseguir um bom mercado exibidor ou ficar restrito às salas alternativas, isto, outra história.

Howard Hawks, brilhante realizador americano, fez um filme que mistura ação e reflexão numa solução de gênio em Onde começa o inferno (Rio Bravo, 1959), com John Wayne, Dean Martin, Angie Dickison. Western clássico, a ação de Rio Bravo, tirante poucos momentos de ação, transcorre quase toda dentro de uma pequena sala da delegacia ou no interior de um hotel das circunvizinhanças. A reflexão, a análise do comportamento dos personagens, e os diálogos são mais importantes do que a ação. Em outro filme desse genial diretor, Hatari!, a sua maior parte está concentrada na espera da caça e não nesta, quando se tem a ação. Hatari!, filmado in loco, na África, é sobre um grupo de caçadores de nacionalidades diferentes que está à procura de animais selvagens para os levar para os zoológicos de seus países. Mas Hawks concentra todo o filme nos momentos fracos, nos momentos de pausa, nos momentos em que os personagens estão à espera da caçada. Uma característica de Hawks, um realizador que se dividiu entre os westerns e as comédias com admirável talento (inexistente no cinema contemporâneo).

O cinema de arte, portanto, é uma falácia e uma grande mentira.

A foto é de Natalie Wood no clímax de The seachers, quando John Wayne a encontra, mas aqui ela pede clemência a Jeffrey Hunter. Clique para ver a imagem mais ampliada.

15 fevereiro 2010

Alhos & Bugalhos


1) A foto aí em cima é de O desprezo (Le mépris, 1963), de Jean-Luc Godard, em CinemaScope, com a bela Brigitte Bardot secando ao sol e, no outro extremo, Michel Piccoli. Neste filme, Godard aproveita ao máximo as possibilidades estéticas do formato, que tem, no elenco, Fritz Lang como ele mesmo. Considero um dos melhores trabalhos do polêmico diretor francês, o qual, queiram ou não seus poucos detratores, é responsável por um filme-farol: Acossado (A bout de souffle, 1959), que determinou novas regras para a gramática cinematográfica. Gosto muito do Godard dos anos 60 e menos, muito menos, da fase posterior. Filmes como Pierrot, le fou (me recuso a dar, aqui, o título que tomou em português: O demonio das onze horas), mUma mulher é uma mulher (Une femme est une femme), Tempo de guerra (Les carabiniers), Viver a vida (Vivre sa vie), Alphaville, entre outros, são, no mínimo, encantadores.

2) Na segunda metade da década de 60, o Jornal do Brasil tinha o seu Conselho de Cinema que atribuia, toda sexta-feira, estrelas (no máximo 5) e uma rotunda bola preta. Anos antes, o Correio da Manhã também o tinha. Vamos ver se me lembro dos participantes do conselho do JB: Alberto Shatovsky, Alex Viany, Maurício Gomes Leite, Valério Andrade, Sérgio Augusto, José Wolf, Ely Azeredo, José Carlos Avellar, entre outros que não me chegam à memória neste momento. Os do Correio: Ironildes Rodrigues, Antonio Moniz Vianna, Van Jafa, Ronald F. Monteiro, Paulo Perdigão, Salvyanno Cavalcantti de Paiva, e, quem mais?
3) A primeira vez que vi um Conselho de Cinema foi na revista francesa Cahiers du Cinema lá pelos idos dos anos 60. Conselho respeitável, que incluia, além dos seus redatores, que viraram cineastas famosos (Godard, Truffaut, Rivette...), nomes do prestígio do historiador Georges Sadoul. As cotações variavam de bola preta a quatro estrelas - no Correio e JB iam até cinco. Admirador de Jerry Lewis desde cedo, ficava impressionado como o comediante, tido como um mero clown em países como o Brasil, era consideradíssimo pela turma do Cahiers. O Otário (The patsy, 1964), recebeu, de quase todos os conselheiros, quatro estrelas, enquanto filmes, não tão ruins assim, recebiam uma enxurrada de bolas pretas (Dr. Jivago, de David Lean, me vem, agora, à mente). A revista eletrônica Contracampo (http://www.contracampo.com.br ) também tem seus conselheiros.

4) Era uma época na qual Godard estava no auge e era um referencial para os bate-papos cinematográficas das pessoas que frequentavam o cinema Paissandú (de saudosa memória). Na saída, o pessoal se reunia nos bares e pizzarias que existiam na calçada da sala de exibição e o papo varava a madrugada regado, geralmente, a chope carioca e da Brahma (quando a Brahma era a Brahma e não o arremedo que se transformou). A Geração Paissandú surgiu daí.

5) Havia os críticos que não gostavam de Godard e davam bola preta para quase todos os seus filmes. Moniz Vianna não gostava, assim como o seu discípulo Valério Andrade. Quem adorava Godard, entre outros, era Maurício Gomes Leite, crítico oriundo de Minas que morreu há alguns anos atrás em Paris. E realizou um dos melhores filmes dos anos 60: A vida provisória, com Paulo José, Dina Sfat, Mário Lago, e, no final, fazendo uma ponta, Carlos Heitor Cony.

6) Não era de bom-tom se convidar, para a mesma mesa, um godardista e um anti-godardista. Naquela época, as discussões eram acirradas, levava-se o cinema muito a sério, e o cinema tinha um status político que perdeu completamente nos dias de hoje. Lembro-me que, no lançamento de Terra em transe em Salvador, houve um debate no auditório do Jornal da Bahia, reunindo os intelectuais e universitários baianos, que se prolongou até a madrugada. Diferente dos tempos contemporâneos que se caracterizam pela apatia, pela indiferença. E a indiferença, já disse William Shakespeare em Hamlet, a indiferença também é crime.

7) Revi, há poucos dias, no Canal Brasil, Eu te amo, de Arnaldo Jabor, com Paulo César Pereio, Sonia Braga, Tarcísio Meira, Vera Fischer. Obra pretensiosa e vazia. E, além do mais, apelativa, a fim de concorrer com as pornochanchadas da época. E os diálogos soam pseudo-intelectuais, pedantes e ridículos. A única coisa boa que o filme tem é a música de Tom Jobim, feita para Vera Fischer, Luiza, uma beleza. Aliás, desde que vi Eu sei que eu vou te amar, que deu uma Palma de Ouro prematura para Fernanda Torres, achei-o um vácuo, com os diálogos insuportávelmente moderninhos. Ainda bem que Arnaldo Jabor saiu do cinema para não cometer mais disparates, ainda que, e não se pode negar, Toda nudez será castigada, uma das melhores versões de Nelson Rodrigues para o cinema, seja um filme a respeitar. E O casamento, não tão bom o outro, não é de se jogar na lixeira. O Canal Brasil, por sinal, não respeita o formato original dos filmes mesmo os standars, espichando a tela para que ela fique, abominavelmente, cheia.

8) Por falar em Canal Brasil, a sua programação desceu muito de nível nos últimos anos, predominando, durante a tarde, os insuportáveis clips musicais (um ou outro se salva). O canal da Net/Sky, mas de propriedade de um grupo liderado por Barretão, Roberto Farias, entre outros, atende aos assinantes mais superficiais e menos exigentes ao programar tantos clips e por tanto tempo. Antes, os filmes eram mais numerosos e a programação mais cinematográfica. Há programas que não dá para se ver, a exemplo de Larica Total. De qualquer forma e de qualquer maneira, o fato é que, malgré tout, é um canal importante que ajuda a mostrar o cinema brasileiro de várias épocas. E que cobre os festivais, mostras e eventos espalhados em todo o território nacional. Assisto sempre ao Canal Brasil, exceção se faça ao turno vespertino.

14 fevereiro 2010

O primeiro filme de Rogério Sganzerla

Documentário é o primeiro filme de Rogério Sganzerla, um curta em torno de 10 minutos, realizado em 1966, já revelador de um estilo que colocou em prática principalmente no explosivo O bandido da luz vermelha, dois anos depois, em 1968 (que é um dos mais fascinantes filmes da história do cinema brasileiro em todos os tempos). Dois rapazes (um deles, Andrea Tonnacci, que se tornaria um dos nomes mais importantes do chamado cinema marginal - Bang Bang e, há alguns anos, realizou o premiado Serras da desordem), na capital paulista, andam pelas suas ruas à procura de algo para fazer. Durante o trajeto, conversam bastante sobre os mais variados asuntos, principalmente de cinema. Enquanto isso, cartazes de filmes vão sendo mostrados como as fachadas das mais sensacionalistas salas de exibição de SP. Nunca tinha visto este filme que inicia o autor de O bandido da luz vermelha nas imagens em movimento. A oportunidade surgiu agora via You Tube.

Contrariando as normas tácitas deste blog, que não costumar postar vídeos, os quais são mostrados em outro blog de minha autoria (Momentos da arte do filme/ http://setaroandreolivieri.blogspot.com/), faço aqui, com Documentário, uma exceção pela raridade do filme.