Roubei esta foto do blog Chip Hazard (http://chiphazard.zip.net/), do crítico Sérgio Alpendre. Mas aqui postada não ficou com a dimensão e a luminosidade como a publicada no blog citado. Em todo caso, para vê-la maior, mais nítida, e mais grandiosa, é bom dar um clique nela, que vai aparecer em outra janela. Trata-se do olhar de Ethan, o solitário personagem interpretado por John Wayne em Rastros de ódio (The seachers), do grande John Ford, western inexcedível, magnífico, um dos melhores filmes de todos os tempos. Os westerns de Ford são apaixonantes e fascinantes, e mais adjetivos seriam poucos para a expressão de seu valor. Em The seachers, Wayne é um sulista (perdedor da guerra de Secessão americana), que, de volta dela, ao reencontrar alguns de seus familiares, estes são vítimas de um ataque de índios, que levam, com eles, sua sobrinha (Natalie Wood). Com o fito de encontrá-la, parte para a perseguição ao lado de um outro parente (Jeffrey Hunter), que tem sangue de índio. A perseguição, no entanto, leva anos e anos até que a encontra já casada com o chefe indígena. O momento em que a vê nas dunas e, de cavalo, parte para pegá-la, é um momento sublime da história do cinema. Wayne, na verdade, pensa em matá-la, porque, segundo ele, contaminada pela cultura indígena, que detesta. Mas, no ato final, a piedade corroi-lhe a alma. A tomada, quando a entrega à família, e não entra na casa, e parte, andando, solitário, quando o filme se fecha, é outro momento dilacerante.
3 comentários:
Eu sempre achei que a personagem de Nathalie Wood fosse, na verdade, filha de Ethan. O motivo pelo qual ele se afastou da família era óbvio, uma relação mal resolvida com a cunhada (demonstrada quando ela pega o dólmã dele). A raiva da moça, a vontade de matá-la, mesmo com o racismo dele (que, curiosamente, é o personagem que mais entende a cultura indígena -- é só ver a cena em que ele atira nos olhos do índio morto), só se justifica se ela for, na verdade, sua filha.
Teoria é que nem nariz, cada um tem a sua, né? :)
John Ford é o Pelé do cinema:ao mesmo tempo simples e sublime.
Concordo inteiramente com o Rafael, e acredito que não é questão de teoria não, mas de olhar mais atento sobre a obra. John Ford deixa claro todo esse mistério em sua mise-en-scène acerca disso tudo que você afirma. A relação de Ethan com os índios é o ápice - que talvez só será atingido de novo por Tonacci em seu Serras da Desordem - do paradoxal confronto/comunhão entre colonizador e colonizado. Ethan volta de uma guerra estúpida que a sua raça criou, todas as suas grandes sabedorias são indígenas, mas ética e existencialmente ele pertence à estirpe branca. Simplesmente rotular que Ethan é racista é minimizar problema teórico-poético extremamente profundo. John Ford, como todo grande artista, é extremamente misterioso em suas contraditórias afirmações. Tido normalmente como transparente, e defendido por seus "enquadramentos belíssimos", perde-se muitas vezes os seus berros sutis.
Quando, nos braços, ele enfim encontra sua filha, sendo ela índia/branca, e ele tem que decidir a vida ou a morte desse novo ser miscigenado, ele decide a vida, mas ele é um fantasma daquilo que não pode mais existir, senão entre a terra e o céu, vagando nos ventos.
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