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Um filme brilhante como Hatari! (1962), por exemplo, segue, na sua estrutura narrativa, um mesmo tipo de itinerário. Se em Rio Bravo os personagens esperam e, durante a maior parte do filme nada acontece de significativo, em Hatari!, eles também estão sempre a esperar pela próxima caçada, e é na espera que o cineasta aproveita para estudar a índole comportamental humana. Hatari!, que foi visto como mera fita de aventuras, é, na verdade, uma obra grandiosa, inteligente, e que propicia, ainda, o prazer do cinema, o que tem se tornado uma fato raro na mediocridade contemporânea que confunde obscuridade com profundidade – ver, por exemplo, Filme de amor, de Júlio Bressane. Uma vez, Jean-Luc Godard, desconstrutor do cinema nos anos 60, realizador admirado e considerado de vanguarda, respondendo a um repórter acerca do que era o cinema respondeu-lhe: "O cinema é Howard Hawks".
Não se viaja na maionese quando se está diante de um filme de Howard Hawks. O Telecine Classic (Net/Sky), quando existia e se respeitava e não tinha, ainda, se transformado no híbrido ‘Cult’, exibiu várias vezes Bola de fogo (Ballfire), desse realizador, que tem Gary Cooper e Barbara Stanwick nos principais papéis. Um grupo de eruditos se encontra há anos numa casa com o objetivo de elaborar a mais perfeita das enciclopédias, quando, de repente, uma mulher, fugindo de uma confusão que envolve gangsteres, encontra nela um refúgio. Esfuziante, bela, termina por se fazer apaixonar por Gary Cooper. A mulher, aqui, é elemento deflagrador de uma reviravolta na vida dos sábios.
Ver Hawks é essencial! Infelizmente existem poucos hawks disponíveis em locadoras, mas nas televisões por assinatura, de vez em quando, um deles se apresenta para o prazer do cinéfilo. Já Rio Bravo, cujo título em português deve ser desprezado – Onde começa o inferno, tem em DVD e a cópia é das mais luminosas, conservando, como é justo e correto sem atentar contra a integridade da obra cinematográfico, o formato original pelo qual foi visto nos cinemas. Esse filme, uma obra-primíssima, é considerado como um dos maiores filmes de todos os tempos, chegando mesmo, numa lista definitiva solicitada pela ‘Folha de S.Paulo’ a críticos do mundo inteiro, Inácio Araújo encimá-lo como seu filme preferido. O western em Hawks segue um itinerário, uma trajetória, um percurso: Rio Vermelho (1948), com John Wayne e Montgomery Clift, Rio Bravo, com Wayne e Dean Martin, Eldorado (1965), com Wayne e Robert Mitchum e, como canto de cisne, obra crepuscular, Rio Lobo (1970). Eldorado é uma refilmagem disfarçada de Rio Bravo, mas, mesmo, assim, filme de brilhantismo assegurado, ainda mais quando se tem presente a figura emblemática do sonolento Mitchum, que a crítica tanto desprezou quando atuava, chamando-o de canastrão e não sabendo vê-lo como um tipo, uma personalidade, um emblema.
2 comentários:
Bravo !
O western representou para a minha geração (estou com 63) o gênero mais popular do cinema. Tínhamos grandes produções, mas, cresci assitindo as produções "B" da Republic que enchiam nossas tardes dominicais com seriados de Gene Autry, Roy Rogers e outros. Para além dos filmes de Hopalong Cassidy (Castle Films) e tantos congêneres.
Mas é claro que o "creme do creme" e seus diretores magistriais nos fizeram elevar esta categoria de cinema à importância que teve, e, infelizmente, o tempo diluiu em algumas produções sazonais.
O western deixou saudades. Sem dúvida deixou muitas.
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