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27 abril 2008

Introdução ao cinema (3)


Domingo é dia de introdução ao cinema, conforme estabelecido quando da sua primeira republicação.
Antes de entrarmos no outro elemento determinante da linguagem cinematográfica, os movimentos de câmera, necessário, para uma melhor compreensão do processo de criação, saber distinguir entre PLANO e TOMADA. Cada filmagem de um plano qualquer é uma tomada. Tem-se uma tomada a partir do momento me que a câmera é acionada até o momento me que ela é desligada - no tradicional corta do diretor. Assim, a tomada é este fragmento de tempo entre o acionamento do registro e o seu término. A tomada pode variar quanto a seu tempo. Já o PLANO se caracteriza pela distância entre a câmera e o objeto filmado. É a unidade básica da obra cinematográfica. Os planos se reúnem em cenas que, por sua vez, se reúnem em seqüências. Assim cenas se constituem de uma série de planos ligados a uma só ação ou situados num mesmo cenário É a forma cinematográfica mais próxima do teatro. Já as seqüências contêm uma série de cenas. Do ponto de vista mais geral, tem-se uma funcionalidade bastante específica de certos planos fundamentais. Cabe ao realizador saber dosa-los com força expressiva, pois é na articulação dos elementos determinantes da linguagem fílmica que se estabelece a artisticidade da obra cinematográfica. Assim, podemos dizer que, no que concerne unicamente aos planos, o geral valoriza a paisagem como espaço físico e sugere uma comunhão psicológica entre os personagens e a natureza. O PLANO MÉDIO inscreve os indivíduos no espaço físico em que vivem e instaura um equilíbrio dramático entre a ação e o cenário. Já o PLANO AMERICANO destaca os personagens em sua proximidade física e a intensidade de sua presença moral. E o CLOSE UP instala a pujança do valor dramático e psicológico determinante. A natureza dos planos é governada pela distância relativa entre o ator e a câmera. assim, quanto maior a distância, maiores parcelas do cenário são mostradas. diminuindo a distância, as formas do ator crescem de tamanho na tela e, neste caso, há a necessidade de uma mudança de posição da câmera tendo me vista a obtenção de planos mais distantes ou mais próximos. Outro método consiste me empregar lentes de distâncias focais diferentes, isto é, as diversas objetivas que fazem parte do equipamento da câmera. Nesse caso, o resultado almejado é conseguido com uma simples troca de objetiva.

Consegue-se a variação do ângulo visual das imagens por meio das sucessivas mudanças de plano. Em geral, a rigor, qualquer mudança de plano corresponde a uma mudança de posição da câmera ou a uma troca de objetiva, obrigando, com isso, a uma interrupção nos trabalhos de filmagem. Ao contrário do que pensa a maioria dos espectadores, o filme é construído a partir de muitos fragmentos e, apesar de dar a impressão de continuidade, tem, no seu processo de criação, uma total descontinuidade. Para cada tomada (take) de alguns minutos e, às vezes, alguns segundos, há, forçosamente, de se interromper as filmagens. Assim, o resultado na tela é uma sucessão de dois planos articulados por uma descontinuidade chamada CORTE. O corte (cut) é o que caracteriza visualmente uma mudança de plano, sendo também a palavra que o diretor usa para interromper a tomada. Não é só pelo corte, no entanto, que se efetua uma mudança de plano. Como a câmera pode executar movimentos, deslocando-se suavemente durante a tomada, ela, a câmera, pode passar sem interrupção de um plano geral a um plano médio e deste ao close, bem como seguir o caminho inverso, aproximando-se ou afastando-se gradualmente da realidade profílmica. Tem-se,então, aqui, uma mudança contínua de planos. O mais simples dos movimentos de câmera é a PANORÂMICA (Pannning), movimento no qual o aparelho, fixado em sua base, gira sobre si mesmo na direção horizontal (nos dois sentidos) ou na direção vertical. A câmera como que olha ao seu redor (panorâmica horizontal) ou à sua frente (panorâmica vertical). Se, por exemplo, um personagem está no alto de uma montanha e divisa a paisagem, a câmera confunde-se com sua vista, executando uma panorâmica horizontal. Se está na base de um edifício, e olha para uma janela elevada, correndo a vista pela altura do prédio, a câmera mostra o que o personagem enxerga por meio de uma panorâmica vertical. A forma mais simples de panorâmica - da direita para a esquerda - ou vice-versa - pode cumprir várias funções qualificantes. Pode, por exemplo, afastar gradualmente a nossa vista de uma cena resolutiva e reconduzi-la a ela, carregada de curiosidade, provavelmente após o seu desfecho.

Em Trágico Amanhecer(Le jour se lève, 1939), de Marcel Carné, na cena de amor entre o protagonista e a mulher dentro da cabana enquanto lá fora chove, mal os dois começam a reclinar-se sobre o leito abraçados, uma panorâmica conduz o espectador, lentamente, para o exterior diante de uma goteira pela qual se escoa um abundante caudal de água de chuva. A imagem, então, dissolve-se, até que, finalmente, reaparece a mesma goteira, desta vez, porém, apenas gotejante. O temporal findou. Uma outra panorâmica reconduz o espectador ao interior, mostrando o par que se prepara, agora, após uma noite de paixão, para abandonar o refúgio. É uma maneira indireta de apresentar as coisas, rica de sugestão, no entanto, e que não deixa de aludir ao destino adverso que paira sobre o acontecimento. Elevando-se sobre os personagens me movimento, a câmera também pode informar ao espectador de algo que o espera mais adiante, colocando-o me posição de vantagem me relação às personagens da trama. É o que acontece em No Tempo das Diligências (Stagecoach, 1939), de John Ford, onde a presença dos índios é revelada ao espectador antes de os ocupantes da diligência dela se aperceberem. A câmera pode, igualmente, ligar fatos pertencentes a diferentes dimensões temporais, prolongando-se numa outra panorâmica que evolui no mesmo sentido mas que se refere a um acontecimento ocorrido no passado e que se liga ao primeiro por meio de uma recordação neutra,, invocada, através de um objeto de dupla referência espaço-temporal. É o procedimento que, em Morangos Silvestres(Smultronstallet, 1958), de Ingmar Bergman, provoca uma constante confusão do presente com o passado sem que a linearidade narrativa e dramática do relato fique comprometida. Ainda temos mais exemplos de panorâmicas e de outros movimentos de câmera - como o travelling. Mas fica para o próximo capítulo.

3 comentários:

Jonga Olivieri disse...

O mais impressionante é como o cinema -- enquanto arte popular -- conseguiu transmitir tudo isto de forma prática a qualquer um que o assista.
Mesmo sem o conhecimento teórico, o público espectador sabe o que está sendo narrado de forma muito clara.
Seus exemplos de "No tempo das diligências" e de "Morangos silvestres" exemplificam bem o que a narrativa cinematográfica pode fazer. O seu poder de nos adiantar o que virá (antes mesmo que seus personagens o saibam), ou o que se passa nos corações e mentes, nas recordações dos que estão a compor uma história.
Exemplos felizes a partir de dois mestres que fizeram com que a arte saísse das salas fechadas dos museus e chegasse ao povo. Com muita emoção; pois este elemento fez dela o catalizador de choros e risos, de medos e alegrias.

Anônimo disse...

Setaro,
faltou falar do eixo. Nunca li nenhuma explicação teorica que me fizesse entender o eixo de câmera - como não quebrá-lo etc.

Aliás, nunca nenhuma explicação teorica me fez entender o que na verdade é preciso aprender na prática - no caso das técnicas de cinema.

Inclusive tenho um caso interessante de uma professora de faculdade mencionou que cada batida da claquete serviria para representar o número da tomada. Pois então imagine só que o chaplin devia gastar todo o negativo só para registrar a tomada 100 de algum de seus filmes... Corrigindo aqui, para quem não sabe, a claquete serve para sincronizar o audio com a imagem - que são filmados e gravados separadamente - por isso o famoso grito de guerra: luz, som, camera e ação.

Com tudo isso não quero dizer que sou contra a teoria - aliás acho-a fundamental. Mas a teoria deveria ser melhor aplicada na questão da simbologia de o quê aquela imagem vai passar para o espectador etc e todo aquele papo contra filmes como 'cidade de deus' e 'tropa de elite'. Com isso também quero lembrar da DUPLA EXISTÊNCIA da verdade (visto no topico sobre o glauber e marcelo casseta & planeta) - porque concordo com os dois pontos de vista - do que é contra esses filmes pq retratam fielmente uma realidade sem se preocupar com o resultado imagético que esses filmes trazem - e também a visão de que são filmes espetáculo nos moldes do cinema norte-americano - puramente escapistas - e aliás esse é o grande problema - o cinema norte-americano já virou pleonasmo.

E com isso quero até pedir desculpas se peguei pesado demais no outro comentário - pq vi que não foi publicado.

Foi mal - é porque no email, comentarios etc é muito dificil se retratar e como numa conversa dizer que não foi bem assim e corrigir o mal entendido. É muito fácil criar um mal entendido na internet...

Por isso me desculpe se peguei pesado - é que sou assim mesmo...

grande abraço,
Bruno

André Setaro disse...

Caro Bruno,

Desculpe. Quando fui moderar o seu comentário, tinha outro, que era 'spam', e, sem o querer, o seu também foi 'para o espaço'. Foi sem querer.