A Warner lançou, já há alguma tempo (e parece que está esgotado), no
mercado um DVD duplo contendo a versão restaurada de Nasce uma Estrela (A Star is Born, 1955), de George Cukor, com
interpretações inexcedíveis de Judy Garland e James Mason. Quando do lançamento
do filme nos anos 50, a
Warner, por achar excessivo um musical com três horas de duração, cortou 27
minutos, desfigurando, com isso, esta obra-prima. Há pouco mais de dez anos, um
abnegado pesquisador do American Film
Institut pediu ajuda à Academia de Artes e Ciências de Hollywood a fim de que
esta solicitasse à Warner uma permissão para que o pesquisador desse uma busca
nos depósitos da companhia. Atendido ao pedido, este começou a procurar e
acabou por encontrar os 27 minutos cortados. Estragados, precisou restaurá-los,
ficando três minutos apenas em fotos fixas pela impossibilidade de revivê-los
no celulóide. Esse DVD duplo, portanto. é uma preciosidade, pois o resgate de
um filme extraordinário, que assinala a maior interpretação de Judy Garland no
cinema. Ela, na época, estava profundamente depressiva - sempre dependendo de
álcool e barbitúricos e, para conseguir trabalhar no filme, fez um esforço
enorme para se livrar das drogas. Tem um desempenho maravilhoso como Vicky
Lester, a cantora que, descoberta por Norman Mailer (James Mason, soberbo),
ator famoso de Hollywwod, e que se apaixona por ela, ascende ao estrelato
enquanto Mailer, derrotado pelo alcoolismo, vê a sua decadência. Enquanto ela
sobe, ele cai. É a segunda versão - e a melhor - dessa história - a primeira,
dos anos 30, foi feita por William Wellman, com qualidades inegáveis já que
este diretor era um especialista, mas a terceira, de Frank Pierson, com Barbra
Streisand, de 1975, é um lixo.
O cinemascope, que a
Fox introduzira em 1953 em
O Manto Sagrado (The Robe), mas que já havia sido
inventado pelo francês Henri Chrétien há algumas décadas, não tinha ainda sido
utilizado com um propósito estético e linguístico determinado até que Cukor
fizesse Nasce uma Estrela. O cineasta
revolucionou o cinemascope e mostrou uma utilização extraordinária de sua
amplitude retangular em função do tecido dramatúrgico. O que pode ser
verificado no número no qual Garland conta a sua trajetória - um dos maiores e
melhores da história do cinema, que dura 18 minutos e foi, na versão anterior,
cortado pela Warner, mas que na cópia do DVD está completamente restaurado. É
preciso, porém, que a versão do DVD contemple toda a extensão da tela anamórfica,
ou, então, seja formatado. Tudo em
A Star is Born é uma promoção do encantamento,
da beleza, apesar do tom trágico do final. É um filme sobre a mise-en-scène e, também, sobre o drama
do alcoolismo, que se estende, aqui, para o drama da própria condição humana.
Por pensar em Nasce uma estrela, há filmes que podem ser vistos em DVD sem perder, por assim dizer, a sua 'aura'. E outros que, no disquinho, são maltratados, perdem a sua integridade, havendo interferência no espaço da totalidade de seus enquadramentos. A experiência de se estar numa sala escura, e de ver um filme na tela grande, é fundamental. Quando se assiste ao DVD, há, no processo de comunicação entre a emissão e a recepção, 'ruídos indesejáveis - a pequenez da tela, pessoas que passam, o telefone que toca, um familiar que pergunta, que fala etc. No 'texto' imagético propriamente dito, há os problemas da diminuição e da preparação psicológica daquele que vê o vídeo. Numa sala escura, o espectador prepara-se para ela. É verdade que existem os aficionados mais atentos - como este comentarista - que, por respeito à obra cinematográfica e porque acha que toda atenção é pouca, não assistem ao vídeo em sala de estar familiar, reservando-se para a calada da noite, quando todos estão nos braços de Morfeu. E podem ficar, sozinhos, a fruir o espetáculo. Mas como se ia dizendo, há filmes que satisfazem em vídeo e outros que são destruídos. Exemplos: filmes realizados em planos fechados e que se passam em interiores podem ser vistosem vídeo. Já obras que
exploram grandes espaços, têm muitos planos gerais e de conjunto são
prejudicadas na fita magnética. E existe o problema do filme originariamente
filmado em
cinemascope. Como sentir 2001, Uma Odisséia no Espaço, de Stanley Kubrick, na pequenez do
aparelho doméstico? É simplesmente impossível. Neste caso, tem-se, apenas, uma
idéia do filme.
Por pensar em Nasce uma estrela, há filmes que podem ser vistos em DVD sem perder, por assim dizer, a sua 'aura'. E outros que, no disquinho, são maltratados, perdem a sua integridade, havendo interferência no espaço da totalidade de seus enquadramentos. A experiência de se estar numa sala escura, e de ver um filme na tela grande, é fundamental. Quando se assiste ao DVD, há, no processo de comunicação entre a emissão e a recepção, 'ruídos indesejáveis - a pequenez da tela, pessoas que passam, o telefone que toca, um familiar que pergunta, que fala etc. No 'texto' imagético propriamente dito, há os problemas da diminuição e da preparação psicológica daquele que vê o vídeo. Numa sala escura, o espectador prepara-se para ela. É verdade que existem os aficionados mais atentos - como este comentarista - que, por respeito à obra cinematográfica e porque acha que toda atenção é pouca, não assistem ao vídeo em sala de estar familiar, reservando-se para a calada da noite, quando todos estão nos braços de Morfeu. E podem ficar, sozinhos, a fruir o espetáculo. Mas como se ia dizendo, há filmes que satisfazem em vídeo e outros que são destruídos. Exemplos: filmes realizados em planos fechados e que se passam em interiores podem ser vistos
Se não fosse pelo
aparelho de DVD, o cinema do pretérito somente poderia ser visto em cinematecas. E como
aqui na Bahia não existem estas, o baiano ficaria a ver navios. Se, por um
lado, a visão de um filme em digital não se pode comparar à sua contemplação na
sala escura de um cinema, por outro, o cinéfilo tem a oportunidade de ver
em DVD - em alguns casos - quase toda a
obra de um realizador importante, de estudá-la, de repetir as cenas, as
seqüências, etc. Há, no mercado, quase três dezenas de fitas de Alfred
Hitchcock. A nova geração, sem o advento do vídeo, estaria condenada a
desconhecer grandes e imprescindíveis clássicos do cinema. Além do DVD, uma
perspectiva se abre com as televisões a cabo e por assinatura que possuem
canais especializados em filmes bons e importantes, funcionando como
verdadeiras cinematecas. Já passou o tempo em que se faziam sacrifícios
memoráveis para se ver um filme por acaso perdido no circuito.
Um comentário:
Ótimo texto, André! Adorei, e observo que vi 2001-Uma Odisséia no Espaço no cinema uma vez aqui em São Paulo. Por volta dos 17 anos. Não entendi muita coisa, não estava preparado. Para algumas experiências é necessário um pouco de maturidade cinematográfica. Revi anos e anos depois numa cópia em DVD, daí sim fiquei estarrecido, entrei em choque e amo o filme, apesar de não compreendê-lo de todo. Portanto, e contrariando o senhor, não concordo que tela pequena reduz o impacto de um grande filme. Eu sou a prova viva disso. Um abraço e continue com estes textos maravilhosos que eu faço questão de compartilhar no meu facebook.
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