1) Nunca gostei de Danny Boyle. Vi, hoje pela manhã, na casa de um amigo, Quem quer ser milionário? (Slumdog millionaire) e achei simplesmente um lixo. Sem papas na língua, e meio deseducado, creio que o espetáculo cinematográfico está, realmente, em processo de regressão. Boyle, e pela cara dele se vê que é um nerd, porém um nerd esperto e oportunista, atento às circunstâncias, aos modismos, às oportunidades temáticas. Vê-se isso desde Trainspotting (1996), que causou, na época de seu lançamento, uma espécie de frenesi, quando, na verdade, não passa de um filme oportunista e datado. Há aquela cena na qual Ewen McGregor (revelado por Boyle) afunda numa latrina e viaja pelos excrementos fecais. Em Quem quer ser um milionário? também há um momento em que o menino sabichão pula em enorme quantidade de fezes (que causa ojeriza no espectador) para entrar em contato com um ídolo. Boyle gosta, desculpem a expressão, mas a expressão da verdade, Boyle gosta mesmo é de merda. Arrependi-me de ter saído de meu apartamento para ir ver este filme de Boyle, ainda que na casa de um amigo afável e simpático. É que prefiro esperar para ver o filme no cinema. Já tive oportunidade, por exemplo, de ser convidado para ver Gran Torino, de Clint Eastwood, baixado da internet, e me recusei. Há casos em que aceito, quando não há possibilidade de contemplação em DVD ou telão de cinema. De forma que fiquei decepcionado com a premiação dessa merda (estou realmente contrariado não com a Academia de Hollywood, mas com o filme de Boyle) com tantos Oscars. Sinal, realmente, dos tempos! Dificilmente, ainda que os critérios da Academia sejam altamente discutíveis, viu-se, na história do cinema, um filme tão ruim ser amplamente premiado. Chego, inclusive, a perder a compostura para falar de Slumdog millionaire. E a indignação inibe o comentarista.
2) Houve protestos da gandaia politicamente correta contra a entrega do Oscar para Jerry Lewis, porque este tinha declarado que quem anda de cadeira de rodas vive numa prisão. Jerry deu o troco na sua fala, quando disse que a sua contribuição para as pessoas que tinham a doença muscular paralisante não foi feita para ganhar prêmio. E realmente! Como um gênio de sua raça não ter já recebido vários Oscars em sua fulgurante carreira? Também a genialidade do cinema que era praticado em épocas passadas não mais se configura nos tempos contemporâneos. Para as pessoas que curtem cinema nos tempos modernos, Jerry Lewis é uma peça de museu. A bem dizer, a nova geração pensa que a história do cinema começou com Blade Runner, de Ridley Scott, em 1982. Lewis merecia uma retrospectiva em imagens de alguns momentos antológicos de sua carreira. Mas, de qualquer forma e de qualquer maneira, a sua entrada em cena fez com que todos presentes se levantassem e o aplaudissem de pé (Sophia Loren, Anthony Hopkins, entre eles). O cinema, que é mise-en-scène, recebeu um grande impacto quando Jerry Lewis passou a dirigir seus filmes a partir de 1959 em O mensageiro trapalhão(The bell boy), cuja culminância se dá na obra-prima que é O otário (The patsy, 1964), passando por outras, entre as quais, O professor aloprado e O terror das mulheres. O aloprado, na expressão da palavra, é Danny Boyle, este, sim, um nutty.
3) Nunca tinha visto, por incrível que pareça, Imitação da vida (Imitation of life, 1959), de Douglas Sirk, melodrama soberbo, com Lana Turner, John Gavin, entre outros, e o vi graças ao Telecine Cult, que o tem em sua grade programativa. É um filme de uma beleza indescritível. Conhecia quase todos os outros de Sirk, principalmente Palavras ao vento, Almas maculadas, Tudo que o céu permite, revistos várias vezes. Mas Imitation of life é a sua obra-prima. Uma mulher, Lana Turner, viúva, com uma filha pequena, encontra, por acaso, na praia de Coney Island, no Carnaval de lá (Mardigras), em 1949, uma outra mulher, negra, que tem uma filha branca. Esta vai trabalhar na casa de Lana e entre ambas se desenvolve uma grande amizade. O problema começa quando a filha da mulher negra, que passa por branca, se revolta com a sua condição de ser filha de uma pessoa de cor. Os conflitos começam, então, a surgir. Uma obra que reflete não apenas sobre o racismo na sociedade americana, mas também sobre a ambição, sobre o orgulho e a vaidade. E indescrítível a beleza da posta-em-cena, o uso da cor como sugestão dramática, etc. Depois de ver Imitação da vida é que vi Quem quer ser um milionário? Água e vinho, quantidades heterogêneas. Genialidade e incompetência. Beleza e fealdade. Dois filmes antípodas.
Na foto Lana Turner e Sandra Dee em Imitação da vida.
Na foto Lana Turner e Sandra Dee em Imitação da vida.
11 comentários:
Mas Imitation of life é a sua obra-prima.
Como poderia ler seu comentário e não comentar! Sem sombra alguma de duvidas, este filme é sublime, tanto o enredo, como a representação dos atores, fica-se na duvida quem é o melhor ao grande filme!
Hoje termino a noite lendo seu espaço, e gosto de sua colocações, são verdadeiras, como de uma pessoa que sabe e conhece o poder da palavra.
Com admiração,
Efigênia Coutinho
O Saymon aí de cima não sou eu, Setaro. O Saymon de verdade tem foto do lado. E eu detestei The Visitor.
Tirando isso, Imitação da Vida é uma maravilha mesmo. Aquele desfecho com a música de Mahalia Jackson é das coisas mais belas já feitas, um primor de excesso. Um excesso rigoroso e transcendental.
No entanto, meum preferido de Sirk continua no p&B de Almas Maculadas.
Aliás, aproveito o espaço para pedir ao demente, que perde tempo de sua vida comentando com o nome de outra pessoa, que tome tento! Veja que perfeccionista, ainda linka meu perfil para fazer o comentário parecer verdadeiro. Eu só comento com meu login.
Que falta do que fazer!
Saymon,
È verdade, quando você comenta vem do lado a foto com camisa amarela. Vou cancelar o comentário espúrio.
Slumdog e' fraco e nao merece atencao. Mas e' epoca de recessao e desesperanca, e a academia esta' interessada em reverter o quadro com os filmes premiados. Acontece vez por outra, vide decadas de 30', 80', etc. Hora dos musicais entrarem em cena.
Vi "Imitação da Vida" em Janeiro, também no Telecine Cult. Belo filme (me interessei muito em conferir as outras obras de Douglas Sirk).
Quanto ao Oscar... realmente é complicado e até deprimente. Não assisti a este novo longa de Boyle (e concordo com você professor, é realizador malandro e modista)mas já li um comentário de Marcelo Jano em que ele diz ter detestado o filme. Parafraseando o próprio Janot, quando filmes como "Wall-E" concorrerão a melhor filme? E "Batman - Cavaleiro das Trevas"?
Animações e filmes de super-heróis simplesmente não podem concorrer nesta categoria do tão cobiçado prêmio da Academia?
O jeito é termos que aguentar os velhos filmes de holocausto como O Leitor (que não é ruim mas , na minha opinião, inferior a Cavaleiro das Trevas) ou os modistas como "Quem quer ser um milionário?". A academia este ano mostrou a senilidade de quem tenta ser "modernoso".
Grande Abraço
Saymon, voce precisa ver o que ele escreveu na Ingresia, usando seu nome.
Setaro, assino embaixo no que se refere ao merda do Boyle. Recomendo ainda leitura do igualmente raivoso artigo de Inácio Araujo: www.cantodoinacio.blogspot.com
Errei no título. Não é "Fait Divers", mas "Faits Divers". A culpa foi do afogadilho da pressa. E a pressa, dizem todos, é inimiga da perfeição. De qualquer modo, fica a errata antes que algum leitor venha a querer corrigir.
"Faits divers" (pronuncia-se fé-divér; em francês, literalmente, "fatos diversos") é uma expressão de jargão jornalístico e, por extensão, um conceito de teoria do jornalismo que designa os assuntos não categorizáveis nas editorias tradicionais dos veículos (política, cidade, polícia, economia, internacional, esportes e outros).
São fatos desconectados de historicidade jornalística, ou seja, referem-se apenas ao seu caráter interno e seu interesse como fato inusitado, pitoresco. Em geral, remetem a temas considerados "leves", curiosos, não muito sérios e sem comprometer seriamente ninguém. Em inglês, matérias de faits-divers são chamadas de "features".
Grande Setaro, perfeitos os comentários sobre o filme do Boyle e o do Sirk. Me espantei com a quantidade de prêmios e elogios da crítica para um filme tão fraco como Slumdog Millionaire.
abraços
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