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16 dezembro 2007

O mistério de Yasujiro Ozu




Nunca tinha visto Tokyo ga, de Wim Wenders, mesmo porque inédito nos cinemas brasileiros e, pelo que saiba, não tem cópia em DVD nem em VHS. O Telecine Cult, hoje, domingo, deu-me um grande presente com a sua exibição. Assinante desde o ano 2.000, andava aborrecido com os atentatos promovidos pelo Cult, que substituiu o Classic, há exatos dois anos, porque está a passar, em tela cheia (full screen), os filmes originariamente realizados em lente anamórfica (cinemascope) - hoje mesmo Beija-me idiota (Kiss me stupid), que na era do Classic passou na sua integridade anamórfica, foi exibido totalmente espichado e desfigurado a ponto de não poder tê-lo revisto.
Mas se o filme não é originariamente em cinemascope, verdade seja dita, o Cult está com uma programação excelente - mas, repita-se, somente se aplica aos filmes não anamórficos. As retrospectivas de Kieslowski, há algum tempo, a de Chaplin, entre outras preciosidades, com obras inexistentes em DVD, como a da mostra dedicada a Wim Wenders, são exemplos da excelente grade programativa do Cult. E a maioria dos filmes importantes apresentados tem comentários pertinentes e esclarecedores de Marcelo Janot, crítico cujo poder de síntese é brilhante.
Mas ia a falar de Tokyo Ga. Em primeiro lugar, tenho especial fascínio pelo Japão e, particularmente, pelo cinema nipônico, que vejo desde adolescente, a admirar não somente Akira Kurosawa, mas, também, Yasujiro Ozu, Masaki Kobayashi, Kaneto Shindo, Kenzi Mizoguchi, Shohei Imamura, entre tantos. Tokyo Ga é um documentário que faz uma homenagem a Ozu. Wenders, a narrar em primeira pessoa, diz que existe um tesouro muito precioso na história do cinema que se encontra nos filmes de Ozu, porque, antes de tudo, um cineasta capaz de apreender a vida em seus momentos cotidianos com uma habilidade e um humanismo impressionantes.
É bem verdade que Histórias de Tóquio é um dos maiores filmes que já vi na minha trajetória existencial. Wenders vai ao Japão em 1983, vinte anos depois da morte de Ozu, que faleceu em 1963, para ver se encontra algum vestígio na grande cidade da humanidade registrada nos filmes do realizador japonês. Segundo Wenders, é o que de mais precioso viu no cinema. Em Tóquio, no alto de um edifício, Wenders documenta um gigantesco campo de golfe no qual as bolas não são destinadas a nenhum buraco. O que importa é o ato de jogar. Também registra em imagens a confecção de pratos com comida de cêra para a vitrine de um restaurante. E assim por diante. Encontra com seu colega Werner Herzog no alto de um prédio. Herzog diz que é difícil se captar, hoje, no mundo, qualquer imagem humana e que é preciso se sair da Terra para encontrá-la. Mas o ponto alto de Tokyo Ga é o encontro de Wenders com o ator principal de Ozu, e, principalmente, com o operador de câmera do grande realizador, um homem que passou a vida inteira dedicada a registrar as imagens em movimento para o seu mestre Yasujiro Ozu. A câmera de Ozu ficava sempre quase ao chão, montada em tripé diminuto, a fim de enquadrar os personagens conforme a visão de uma pessoa sentada no chão, como é hábito e costume das casas nipônicas tradicionais, da cultura japonêsa antes de se transfigurar e se descaracterizar com a ocidentalização de Tóquio - neste particular há um momento em que Wenders visita a Dysnelândia do Japão com os jovens a macaquear o ritmo americano de vestir e de dançar.
Yuuharu Atsuta é o diretor de fotografia que dá um depoimento comovente sobre Ozu. Trabalhou com o mestre japonês primeiro como assistente de câmera e depois veio a ser o principal operador, o diretor de fotografia do realizador de Histórias de Tóquio, o seu principal iluminador. Uma vez, conta, ao filmar em ambiente hospitalar um personagem doente que morre, Atsuta, sem consultar Ozu, encheu o enquadramento da cama do enfermo de luz, como se o sol estivesse dentro do hospital a iluminar o homem terminal. Ozu ouviu de Atsuta a idéia e não disse nada. Deixou-o filmar assim mesmo. Segundo Atsuta, melhor homenagem a ele não poderia haver. O ator e o operador de câmera, entrevistados por Wim Wenders, mostram uma veneração, uma idolatria, por Yasujiro Ozu, como se fosse um rei (Atsuta), um Deus. Há uma nítida mistificação do diretor em relação a seus colaboradores.
Por falar em Ozu, um presente está reservado aos amantes do bom cinema na Sala Walter da Silveira com a mostra desse realizador nipônico que começou ontem. Transcrevo aqui as notas que me foram enviadas:
"Ciclo reúne obras-primas de Yasujiro Ozu
Com o apoio do Consulado Geral do Japão (Recife), mostra exibe os principais filmes do grande cineasta japonês, de 16 a 20 de dezembro, na Sala Walter da Silveira.

O cinema do japonês Yasujiro Ozu é o presente de fim de ano da Sala Walter da Silveira para os cinéfilos baianos. Com o apoio do Consulado Geral do Japão- Recife e da representação consular honorária em Salvador, o ciclo O Encanto de Ozu reúne na Sala Walter da Silveira, de 16 a 20 de dezembro, as principais obras do cineasta nipônico, sempre com entrada franca. O evento se antecipa às comemorações pelos 100 anos da imigração japonesa no Brasil, a ser festejado em 2008, com várias mostras de filmes e homenagens a realizadores como Akira Kurosawa e Eizo Sugawa.
Sobre o cineasta - Yasujiro Ozu, nasceu em Tóquio, no dia 12 de Dezembro de 1903. Filho de um comerciante de adubo, foi educado num colégio interno em Matsusaka, não tendo sido um aluno particularmente bem sucedido. Desde cedo se interessou pelo cinema, aproveitando o tempo para ver o máximo de filmes que podia. Trabalhou por um breve período como professor, antes de voltar para Tóquio em 1923, onde se juntou à Companhia cinematográfica Shochiku. Trabalhou, inicialmente, como assistente de fotografia e de realização. Três anos depois, dirigiu o seu primeiro filme, Zange no yaiba (A espada da penitência), um filme histórico, em 1927. Os cinéfilos em geral indicam como primeiro filme importante Rakudai wa shita keredo (Reprovei, mas... - tradução do título em inglês), de 1930. Realizou mais 53 filmes - 26 dos quais nos seus primeiros cinco anos como realizador e todos, menos 3, para os estúdios Shochiku.Em Julho de 1937, numa altura em que os estúdios demonstravam algum descontentamento com o insucesso comercial dos filmes de Ozu, apesar dos louvores e prêmios com que a crítica o celebrava, é recrutado como cabo de infantaria, aos 34 anos, para o exército japonês, na China, durante dois anos. A sua experiência militar leva-o a escrever um extenso diário onde se inspirará mais tarde para escrever roteiros cinematográficos. O primeiro filme realizado por Ozu ao regressar, Toda-ke no Kyodai (Os irmãos da família Toda, 1941), foi um sucesso de bilheteira e de crítica. Em 1943 foi, de novo, alistado no exército para realizar um filme de propaganda em Burma. Em vez disso, porém, foi enviado para Singapura onde passou grande parte do seu tempo a ver filmes norte-americanos confiscados pelo exército.Ozu começou por realizar comédias, originais no seu estilo, antes de se dedicar a obras com maiores preocupações sociais na década de 1930, principalmente ao focar dramas familiares (gênero próprio do cinema japonês, chamado "Gendai-Geki"). Outros temas caros ao mestre japonês são a velhice, o conflito entre gerações, a nostalgia, a solidão e inevitabilidade da decadência, como se verifica, de imediato, nos títulos dos seus filmes que evocam o passar do tempo: é comum que os seus filmes terminem num local ou numa situação diretamente ligada com o início, acentuando o carácter temporal "circular" (como as estações do ano ou a alternância das marés) destas obras.Trabalhou freqüentemente com o roteirista Kogo Noda; entre outros colaboradores regulares contam-se o director de fotografia Yuharu Atsuta e os atores Chishu Ryu e Setsuko Hara. Os seus filmes começaram a ter uma recepção mais favorável a partir do final da década de 1940, com filmes como Banshun (Pai e filha, 1949), Tokyo monogatari (Era uma vez em Tóquio, 1953), considerado a sua obra prima, e Ukigusa (Ervas flutuantes, 1959) e Akibiyori (Dia de Outono, 1960). O seu último filme foi Sanma no aji (A rotina tem seu encanto, 1962). Ouz morreu de câncer no seu 60º aniversário e foi sepultado no templo de Engaku-ji em Kamakura.
A entrada é franca pessoal!
Programação
Dia 16/12Às 15h e 17h30
Filho único (Hitori Musuko, Japão, 1936, P&B, 87min) – Legendas em português
Direção: Yasujiro Ozu
Elenco: Chishu Ryu, Kazuo Kojima, Tomoko Naniwa, Masao HayamaSinopse - Primeiro filme falado de Ozu. Mãe solteira, operária de uma fábrica, sofre para conseguir criar o filho. Anos depois, ele muda para Tóquio para cursar medicina. Após se formar, sua mãe resolve visitá-lo e espera testemunhar seu sucesso.
Às 20h
Coral de Tóquio (Tokyo Chorus, Japão, 1931, P&B, 90 min) Legendas em espanhol
Direção:
Yasujiro Ozu
Elenco: Tokihiko Okada, Emiko Yagumo, Hideo Sugawara, Hideko TakamineSinopse - Comédia sobre o desemprego que mostra o cotidiano de um casal e seus filhos. Okajima desafia o patrão, um homem autoritário e impulsivo, por discordar da demissão de um colega. Ele é despedido sumariamente e engrossa o enorme contingente de desempregados da época. Para comprar comida, vende os quimonos da mulher. Depois de vários percalços, tem uma nova oportunidade com um antigo professor, agora proprietário de um restaurante, que lhe oferece um emprego temporário para carregar placas de anúncios pela rua. Oakajima doma seu orgulho, aceita a proposta e a vida da família se normaliza.
Dia 17/12Às 15h
As Irmãs Munekata (Munakata Shimai , Japão, 1950, P&B, 112 minutos) Legendas em espanhol.Direção: Yasujiro Ozu.
Elenco: Chishu Ryu, Tatsuo Saito, Hideko Takamine.Legendas em espanhol.
Sinopse – Setsuko é casada com Mimura, um homem doente e que sofre de alcoolismo. Ganha vida, com muita dificuldade, gerindo um bar. Hiroshi, um antiquário, há muito enamorado de Setsuko, propõe-se a ajudá-la. O que Hiroshi não sabe é que Mariko, irmã de Setsuko, também é apaixonada por ele. E este não será o único obstáculo ao amor dos dois...
Às 17h30 e 20h
Pai e filha (Banshun, Japão, 1949, cor, 108 min) - Legendas em português
Direção: Yasujiro Ozu
Elenco: Chishu Ryu, Setsuko Hara, Yumeji Tsukioka, Haruko SugimuraSinopse - Jovem vive com seu pai e a família se preocupa com a possibilidade de que ela perca a chance de se casar por causa dele. Preocupado com isso, o viúvo Somiya finge estar se casando novamente para evitar que a filha fique solteira.
Dia 18/12
Às 15h e 20h
Ervas Flutuantes (Ukigusa , Japão ,1959, cor, 119 min) -Legendas em espanhol
Direção: Yasujiro Ozu.
Elenco: Ganjiro Nakamura, Machiko Kyô, Ayako Wakao.
Sinopse – Um trupe de atores ambulantes chega a uma pequena cidade do litoral. O intuito secreto do líder da companhia é encontrar-se com seu filho, nascido de uma relação que tivera no passado com a dona de um restaurante local.
Às 17h30
Fim de verão (Kohayagawa-ke no Aki, Japão, 1961, cor e P&B, 103min) - Legendas em português
Direção: Yasujiro Ozu
Elenco: Ganjiro Nakamura, Michiyo Aratama, Reiko Dan, Setsuko HaraPenúltimo filme de Ozu, escrito em parceria com Kogo Noda. Retrato da família Kohayagawa, proprietária de uma pequena fábrica de saquê no Japão do pós-guerra. Boa parte das antigas empresas familiares foram absorvidas por grandes firmas. Ao mesmo tempo em que descreve um fenômeno moderno e urbano, o filme remete a uma estrutura social do passado.
Dia 19/12Às 15h
Fim de verão (Kohayagawa-ke no Aki, Japão, 1961, cor e P&B, 103min) - Legendas em português
Direção: Yasujiro Ozu
Elenco: Ganjiro Nakamura, Michiyo Aratama, Reiko Dan, Setsuko HaraPenúltimo filme de Ozu, escrito em parceria com Kogo Noda. Retrato da família Kohayagawa, proprietária de uma pequena fábrica de saquê no Japão do pós-guerra. Boa parte das antigas empresas familiares foram absorvidas por grandes firmas. Ao mesmo tempo em que descreve um fenômeno moderno e urbano, o filme remete a uma estrutura social do passado.
17h30
Era uma vez em Tóquio (Tokyo Monogatari, Japão, 1953, P&B, 136min) - Legendas em português
Direção: Yasujiro Ozu
Elenco: Chishu Ryu, Setsuko Hara, Chieko Higashiyama, Kyôko KagawaSinopse - Um velho casal vai a Tóquio para visitar seus filhos, mas somente a nora viúva se mostra disposta a acolhê-los.
Dia 20/12Às 15h e 17h30
A rotina tem seu encanto (Sanma no aji, Japão, 1962, cor, 112min) – Legendas em português
Direção: Yasujiro Ozu
Elenco: Chishu Ryu, Kyôko Kishida, Kuniko Miyake, Shinichirô MikamiSinopse - Um viúvo leva uma vida tranqüila com seus filhos. Ao deparar-se com o fato de que a filha não se casou para cuidar dele e dos negócios, resolve apoiar o casamento dela resignando-se a conviver com a sua falta.
Às 20h
Coral de Tóquio (Tokyo Chorus, Japão, 1931, P&B, 90 min) Legendas em espanhol
Direção:
Yasujiro Ozu
Elenco: Tokihiko Okada, Emiko Yagumo, Hideo Sugawara, Hideko TakamineSinopse - Comédia sobre o desemprego que mostra o cotidiano de um casal e seus filhos. Okajima desafia o patrão, um homem autoritário e impulsivo, por discordar da demissão de um colega. Ele é despedido sumariamente e engrossa o enorme contingente de desempregados da época. Para comprar comida, vende os quimonos da mulher. Depois de vários percalços, tem uma nova oportunidade com um antigo professor, agora proprietário de um restaurante, que lhe oferece um emprego temporário para carregar placas de anúncios pela rua. Oakajima doma seu orgulho, aceita a proposta e a vida da família se normaliza.

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